O presidente da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, Marco Maciel, foi obrigado a recorrer a uma manobra ardilosa para ceifar manhosa articulação governista. Na manhã de sexta-feira, quando os gabinetes da Casa ficam desertos de parlamentares, avisou a direção que prorrogou por mais 30 dias o prazo para a apresentação do relatório da senadora Kátia Abreu relativo à prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira até 2011.
Profundo conhecedor do regimento, Maciel recorreu ao parágrafo 2º do artigo 118, que prevê a extensão automática, por mais 30 dias, da leitura do parecer, desde que o mês inicial não tenha expirado. O tempo se encerraria na sexta-feira e a relatora anunciaria sua decisão - contrária à CPMF - amanhã.
Se tudo estava pronto, por que o adiamento? Na tentativa de assegurar os votos necessários à manutenção do imposto do cheque, e os R$ 40 bilhões que devem render aos cofres públicos no ano que vem, o Planalto e os governistas planejavam esvaziar a reunião da CCJ nesta segunda-feira. A contagem dos apoios na comissão estava apertada. Em alguns cálculos, a vantagem pró-contribuição não passava de dois votos. Levantamento do jornal Folha de S. Paulo somava 14 contrários entre os 23 integrantes do colegiado. Ou seja, derrota do governo.
Preocupados, os líderes dos partidos aliados do presidente Lula resolveram ameaçar com a falta de quorum na CCJ, o que levaria a emenda diretamente ao exame do plenário do Senado. Alertado, o senador Marco Maciel deu o passo que o regimento lhe permitia para evitar o descrédito da comissão que preside diante da opinião pública. Foi um aviso. Ele se dispunha a voltar atrás, desde que a bancada governista garantisse presença nesta segunda-feira.
Enquanto os políticos recorrem à prestidigitação regimental para retardar ou acelerar a volta do relógio, os articuladores do Planalto e o ministro Guido Mantega vão colocando as cartas na mesa na esperança de chegar a uma conta de mais, em plenário, a favor da manutenção da CPMF. Nomeações para cá, indicações para lá, emendas com recursos liberados, o troca-troca corre solto atrás dos 49 votos essenciais à aprovação da emenda no Senado. É de 53 o número de parlamentares aliados, mas nem todos fecham com a proposta.
O presidente Lula ainda não desistiu da atração de votos tucanos e, amanhã, tem novo encontro com o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati. Paralelamente, o Ministério da Fazenda monta sua peça. Entregou aos parlamentares um mapa da perda dos Estados sem a CPMF.
O estudo revela que São Paulo recebeu, entre janeiro e setembro deste ano, R$ 3,7 bilhões em investimentos bancados pela contribuição. Minas ficou com R$ 1,6 bilhão. Fica implícito que deixariam de receber os recursos caso o imposto seja extinto. "É um certo terrorismo", reagiu o governador mineiro Aécio Neves. O corte de verbas é "inaceitável", bradou o paulista José Serra. Ambos, contudo, não deixam de investir na cooptação de votos para manter o status quo financeiro federal e, de quebra, estadual.
O jogo político é pesado. A sociedade já se manifestou contra a prorrogação de uma contribuição que, entra governo, sai governo, tende a se tornar permanente. Planalto e Senado deveriam ouvir melhor a voz das ruas.
Fonte: JB Online
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