Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Em sã consciência, não haverá um só brasileiro que concorde com os excessos praticados durante o regime militar, com ênfase para a tortura e a censura. E se houver, deve ser imediatamente recolhido a um hospital psiquiátrico. O problema é que, em pleno 7 de Setembro, desde que o presidente Lula assumiu o poder, jamais estiveram tão tensas as relações entre o poder civil e os militares. Importa menos saber quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha.
Sequer verificar que os generais, almirantes e brigadeiros no serviço ativo de hoje eram aspirantes ou, no máximo, tenentes quando da eclosão do movimento de 1964. Mas seria absurdo pretender que eles renegassem o passado e condenassem os antigos chefes por conta de muita coisa ruim acontecida. Até porque, muitas coisas boas também aconteceram.
Para contornar esse impasse é que veio a anistia, fazendo-se justiça ao injustiçado presidente João Figueiredo, responsável por ela. Anistia significa superação do passado, de um lado e de outro. Ou vamos esquecer que terroristas também praticaram horrores, em nome da substituição de uma ditadura por outra?
Fazer História é obrigação de toda civilização. Registrar os excessos de um lado e de outro, e até suas justificativas, fazem bem à memória nacional. Montes de livros têm sido escritos dos dois lados, enriquecendo até com amargura as lembranças do passado, quando nada para deixarem de se repetir no futuro.
Agora, Lula não tinha nada que realizar no Palácio do Planalto o lançamento do livro preparado por um dos lados. Menos ainda o ministro da Defesa, Nelson Jobim, deveria ter desafiado quantos não concordaram com a versão impressa, prometendo o que foi depois incapaz de realizar, ou seja, a resposta a quem reagisse. O alto comando do Exército reagiu, ainda que em nota mais ou menos amena, que ele precisou engolir.
Os comandantes das três forças também reagiram, não indo à solenidade de lançamento do livro, mesmo convidados. Um ato inamistoso, no mínimo, de subordinados para com o chefe. Em suma, senão uma crise, ao menos um mal-estar profundo que não precisaria estar acontecendo. Claro que não acontecerá mais nada, torcemos todos.
O day after
Menos importantes terão sido e serão a condenação, hoje, do senador Renan Calheiros pelo Conselho de Ética, e a absolvição, semana que vem, pelo plenário do Senado. Mais grave será atentar para o fato de estar manchada a imagem da casa. Afinal, mesmo não provadas, as acusações contra Renan levaram a opinião pública, tanto quanto a opinião publicada, a posicionarem-se contra a instituição legislativa.
Esse o grande mal do episódio: transformar uma questão individual num caso coletivo. Quanto mais se engalfinham os partidários e os adversários do presidente do Senado, mais difícil fica a recuperação do Poder Legislativo no imaginário popular. O day after suplantará o que vem acontecendo antes dele. Ainda bem que as próximas eleições para o Congresso só acontecerão em 2010.
Não formalizaram
Ainda bem que o PT não formalizou a proposta de José Dirceu no sentido de ser votado um regulamento para a imprensa, eufemismo para controle dos meios de comunicação. Novas investidas virão, mas por enquanto a sombra da volta da censura parece afastada. Já tentaram, desde que Lula assumiu. As tentativas não colaram, mas os companheiros não desistem. São partidários da verdade única, que não admite contestações. Pelas informações que circulam no Congresso, foi o presidente que vetou a discussão. A compensação veio em elogios aos mensaleiros.
Chapa forte
Dois dias após especularmos a hipótese de chapa com Aécio Neves na cabeça e Ciro Gomes de vice, não é que o deputado referiu-se a ela, em encontro com o governador? Ciro disse que ficaria muito honrado com uma aliança assim. Premissas necessárias: que Aécio deixe o PSDB, volte para o PMDB, seja lançado candidato, que Ciro aceite ser candidato a vice e Lula apóie a chapa e convença o PT a fazer o mesmo.
Impossível? Quase, mas teoricamente factível. Mas não dá para fugir à tentação: bem mais fácil será esses personagens evitarem os percalços inerentes à especulação e pedirem tempo para decidirem o futuro - quatro ou cinco anos do terceiro mandato para Lula.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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