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segunda-feira, maio 02, 2022

Bolsonaro faz aceno à sua base fiel e resgata pauta ideológica




A chamada pauta ideológica do governo Jair Bolsonaro virou desafio para a campanha de 2022. O presidente busca uma vitrine para expor à base mais fiel os temas de costumes, explorados em 2018. Aliados tentam resgatar propostas que foram travadas no Congresso ou no Supremo Tribunal Federal (STF).

O governo tem na lista de prioridades projetos também de segurança. Bolsonaristas querem impedir, por exemplo, a saída temporária de presos, além de ampliar o porte de armas para servidores públicos e afrouxar regras para aquisição de armamento por colecionadores, atiradores e caçadores (CACs).

Nas investidas mais recentes, o Planalto tenta legalizar a educação domiciliar e instituir um dia nacional de conscientização sobre os riscos do aborto. A proposta do homeschooling, que permite o ensino em casa, foi encampada pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos e, agora, foi assumida pelo Ministério da Educação.

Em setembro de 2020, o STF não autorizou essa modalidade de ensino no Brasil, mas definiu que o tema deveria ser tratado no Congresso. Hoje, o governo trabalha com a bancada evangélica para arregimentar apoios na Câmara.

O acordo para a construção do texto foi costurado nas últimas semanas e entrou nas prioridades do novo ministro da Educação, Victor Godoy. Ele participou de reunião organizada pelo líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), com a presença do presidente da Frente Parlamentar Evangélica, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ). "O segmento conservador brasileiro entende que a opção dada aos pais de ensino domiciliar é importante aos que tiverem intenção e interesse. Sempre defendemos essa pauta", disse Cavalcante.

Como mostrou a Coluna do Estadão, a relatora do projeto, deputada Luisa Canziani (PSD-PR), protocolou o parecer final na quinta-feira passada. Pela proposta, que já contraria aspirações iniciais do Planalto, os tutores devem ter ensino superior. Sugeriu que a reprovação por dois anos consecutivos vede a modalidade.

O tema não é novo no governo. A secretária nacional da Família, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Angela Gandra Martins, afirmou que o homeschooling não é ação isolada e que está na agenda desde o início da gestão. "Nós defendemos essa pauta não como o sistema educativo ideal, mas como liberdade dos pais de serem protagonistas na educação. O que mais importa para nós é oferecer essa segurança jurídica aos pais", disse Martins.

O deputado Professor Israel (PSB-DF), presidente da Frente Parlamentar Mista da Educação, disse que atua desde 2019 para "evitar que a pauta de costumes sequestre o debate da educação". "Há uma intenção de usar o MEC como um palanque político para alimentar a base eleitoral mais aguerrida do presidente que se afeta por essas pautas", afirmou. Segundo ele, o governo deveria enfrentar a evasão escolar e a crise de aprendizagem pós-pandemia da covid.

AGENDA PÚBLICA. Cientistas políticos apontam que o resgate de temas como homeschooling está relacionado à tentativa de controle da pauta em ano eleitoral, mais uma vez. Os temas são levantados, com a articulação de líderes do Centrão, ainda que frustrada a expectativa de aprovação.

"Mesmo que o governo não consiga a aprovação desses pontos, eles ajudam a ter um maior controle dos temas que serão do debate público em ano eleitoral", disse o cientista político Rafael Cortez. "É uma maneira de deslocar a atenção das questões econômicas."

De acordo com a cientista política e professora da FGV Graziella Testa, a agenda da Câmara está cada vez mais concentrada nas mãos do presidente Arthur Lira (Progressistas-AL), o que fará o governo depender do aliado para obter êxito. No entanto, ela corroborou a visão de Cortez: "Não é necessariamente tomar a decisão, mas definir o que vai estar na agenda pública".

ABORTO. Entram nessa agenda pautas como o aborto. Apesar de parados no Congresso, houve aumento no número de projetos contrários, até mesmo, à interrupção legal da gravidez. Levantamento feito pelo Estadão mostra que nesta legislatura 26 propostas tentam elevar a pena prevista, barrar a venda de remédios ou até facilitar a prisão da mulher que pratica o aborto hoje no Brasil. De 2015 a 2018, foram 16. O mais recente requer urgência para votar o "Dia Nacional do Nascituro e de Conscientização sobre os Riscos do Aborto".

A oposição tem atuado para travar o debate desses temas e diz que há busca por votos. "Não me surpreende que queiram fazer mais projetos às vésperas da eleição. Primeiro, para retroalimentar essa base de extrema direita, e, segundo, para não debater o que a população de fato quer debater neste momento: fome, emprego, preços dos combustíveis", afirmou a deputada Fernanda Melchionna (PSOL-RS), vice-líder do partido na Câmara.

ARMAS. Apesar de ter ganhado fôlego na campanha de Bolsonaro em 2018, a pauta armamentista pouco avançou no Congresso ao longo da gestão. Uma queda de braço entre oposição e governo resultou em ao menos 37 propostas sobre o tema protocoladas desde 2019.

Sem sucesso na via legislativa, o presidente tentou contornar o Congresso e apresentar decretos para afrouxar a regra e ampliar o acesso a armas e munições no País. O Supremo, porém, barrou em caráter liminar (decisão provisória) a maioria dos dispositivos. O julgamento aguarda pedido de vista de Kassio Nunes Marques, primeiro indicado por Bolsonaro à Corte.

Enquanto o STF não toma uma decisão, o governo tenta retomar o tema no Congresso. No Senado, Marcos do Val (Podemos-ES), aliado do Planalto, é relator de uma proposta que altera o Estatuto do Desarmamento e incha a categoria de CACs, a fim de permitir o acesso a armamento a mais pessoas. O tema voltou ao debate, mas a oposição tenta obstruir o encaminhamento do projeto. A assessoria de Marcos do Val informou que ele não poderia se manifestar.

Apoiadores da pauta, como a senadora Soraya Thronicke (União Brasil-MS), pedem parcimônia na condução das discussões. "Eu sou a favor da legítima defesa de forma responsável. Não dá para abrir a porteira", afirmou. "Eu voto 99% com o governo, mas tenho mantido minha independência. Sou fiel às minhas pautas."

Estadão / Dinheiro Rural

Pastores usam a Bíblia para defender posse de armas de fogo no Brasil

 




Líderes evangélicos postam conteúdo pró-armas. O pastor Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação, atirou por acidente em aeroporto e feriu uma pessoa, semana passada

'Arma de Milton Ribeiro disparou acidentalmente no aeroporto de Brasília na semana passada'

Bárbara Poerner, Bruno Fonseca, Mariama Correia - “Se for para defender minha família, meus filhos, minha mulher, ou minha própria integridade, havendo risco, eu atiro pra matar mesmo”. A fala de Augustus Nicodemus, vice-presidente da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) — entidade que representa a denominação —, foi feita durante uma conferência para jovens evangélicos em 2018, que debateu o direito de cristãos usarem armas. Presbiteriano, assim como o pastor e ex-ministro da Educação Milton Ribeiro, que entrou armado no aeroporto de Brasília, no dia 25 de abril, e feriu uma funcionária da companhia aérea Gol depois de disparar acidentalmente, Augustus é um dos pastores evangélicos que defendem o uso de armas de fogo usando argumentos bíblicos.

Trechos do Antigo e do Novo Testamento da Bíblia fundamentam discursos de pastores que defendem o porte de armas e o uso delas para a autodefesa. “A Bíblia não é contra o filho de Deus portar armas, porém tem limites. O texto está em um contexto de proteção da propriedade”, diz, citando versículos do livro de Êxodo, o pastor Leandro Quadros. Ele é apresentador de programas na Rede Novo Tempo, conglomerado de mídia pertencente à Igreja Adventista do Sétimo Dia. No mesmo vídeo postado no YouTube, Leandro afirma que, um princípio norteador da sua religião é que “o cristão é pacifista”.

Leandro também tem vídeos onde fala contra partidos de esquerda, Marxismo e a favor do presidente Jair Bolsonaro, defensor do armamento de civis. Em 2019, Bolsonaro defendeu a pauta durante participação na Marcha Para Jesus, ao lado dos idealizadores do evento, o pastor Estevam Hernandes e a bispa Sônia Hernandes, da Igreja Renascer. Enquanto Sônia discursava a favor do chefe de estado, o atual presidente encenou o símbolo de uma arma com as mãos.

Ainda na Marcha, Bolsonaro posou em fotos ao lado de Valdemiro Santiago, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus, criada após a ruptura do pastor com a Igreja Universal do Reino de Deus. Valdemiro foi preso por porte ilegal de armas em 2003.

Armas ungidas para proteção de cristãos

Em março deste ano, as armas de fogo do delegado Tito Barichello foram ungidas na Igreja Agnus, na cidade de Curitiba. Na ocasião, o pastor Renê Arian fez uma oração: “Senhor Deus, em nome de Jesus, nós ungimos essas armas para a segurança da população de nossa cidade”. O vídeo viralizou no Instagram do delegado Tito.

Autodefesa e proteção da família são argumentos usados pelos pró-armas (Foto: reprodução)

Viviane Costa, pesquisadora de religião e segurança, explica que o discurso pró-armas entre as lideranças evangélicas nasce de uma “urgência de autodefesa que se estabelece pela falta de segurança pública”. “O pensamento religioso que defende essa estrutura armamentista está ligada a essa percepção da ausência de segurança da vida e da família e também passa por uma questão da manutenção do domínio religioso, uma violência que sempre esteve no discurso e que agora tem seu sentido ressignificado”

O casal formado por Clarissa Tércio, deputada estadual pelo PSC em Pernambuco, e Júnior Tércio, vereador no Recife, já postou foto com armas na mão em um clube de tiros. Bolsonaristas, eles defendem o porte de armas para a população. Sobre a repercussão da foto no clube de tiro, Clarissa afirmou que “o homem tem que ter todos os instrumentos para proteger a sua família.”

Clubes de tiro também são frequentados por comitivas das igrejas. Em outubro de 2021, o Clube Defender anunciou uma campanha de apoio à igreja Batista Nova Esperança, na Penha, no Rio de Janeiro. O SK Clube de Tiro, no Paraná, registrou no Facebook a visita de membros da Igreja do Evangelho Quadrangular numa espécie de atividade recreativa, na qual os alvos foram substituídos por imagens de “zumbis e criaturas estranhas”.

O discurso pró-armamento também está na fala de influenciadores cristãos que produzem conteúdo para públicos jovens nas mídias sociais. Luiz Senna, de 16 anos, faz parte do grupo “O Retiro”, criado pelo pastor Guilherme Batista e que reúne 40 influenciadores cristãos. Eles foram recebidos pelo presidente Bolsonaro no Planalto, no dia 21 de março. Luiz publicou uma foto no seu perfil do Instagram, onde tem mais de 200 mil seguidores, ao lado de Ingred da Silveira. Ambos somam mais de um milhão de seguidores no TikTok. Na imagem, eles seguram armas de fogo. “Cristão é um pacificador, mas não é um pacifista que acredita que se defender com uma arma é errado. Um filho de Deus tem o dever de amar e o direito de proteger sua vida e a sua família”, diz a legenda.

Frente Evangélica bancou aprovação do PL das armas na Câmara

A agenda pró-armamento está longe de ser uma unanimidade entre os evangélicos brasileiros, explica o pesquisador visitante de religião e direito do ISER (Instituto de Estudos da Religião), João Luiz Moura. “O campo evangélico é constituído de múltiplas formas e interpretações. Há igrejas, coletivos e atores que reconhecem que a espiral de violência deve ser interrompida não com uma declaração de objetivos, mas com um esforço coletivo de empreender alternativas e demandas sociais que confrontam as políticas pensadas a partir da violência.”

Nos discursos dos membros da bancada evangélica do Congresso Nacional há políticos que se posicionam claramente favoráveis à flexibilização do porte de armas, outros, não. Contudo, segundo a Agência Pública apurou, os deputados da Frente Parlamentar Evangélica apoiaram em sua maioria um dos principais projetos que buscam flexibilizar o acesso a armas e alterar o estatuto do desarmamento: o PL 3.723/2019, que foi aprovado na Câmara e agora tramita no Senado.

Segundo levantamento da reportagem, 112 deputados da Frente Parlamentar Evangélica (FPE) votaram sim no Plenário da Câmara, no início de novembro de 2019 — os votos desse grupo foram quase metade de todos os votos pela aprovação do projeto. Houve apenas 28 votos contrários dentre os membros da Frente, e uma abstenção. Se aprovado, o PL 3.723/2019 pode dar porte de arma municiada e pronta para uso (isto é, com cartuchos com as “balas”) a mais de meio milhão de colecionadores, atiradores esportivos e caçadores (CACs) registrados no Brasil, de acordo com dados de janeiro deste ano.

Dentre os declaradamente favoráveis, está o caso de Abílio Santana (PSC-BA), que votou pela aprovação do PL na Câmara. Membro da mesa diretora da FPE e pastor da Assembleia de Deus Madureira, ele é filiado ao Clube de Tiro Sisaleiro, na Bahia, desde 2020. Um ano antes, em 2019, o parlamentar falou sobre o PL 3.723/2019 em vídeo publicado no YouTube: “Como você vai se defender de armas, se você não vai estar provido de uma arma? […] Quem conhece a história sabe que foi uma jogada da esquerda desarmar o cidadão.”

Outro apoiador da agenda armamentista, também membro da mesa diretora da FPE, é o deputado e pastor da Assembleia de Deus no Rio de Janeiro, Otoni de Paula (MDB-RJ) — que também votou pela aprovação do PL 3.723/2019. Em discurso no plenário em 2019, ele afirmou que “Se o cidadão quiser estar armado dentro da sua casa, ter a posse de arma, eu também sou favorável a isso, porque cada um tem direito à legítima defesa. Contudo, isso não vai resolver os nossos problemas. Ou cuidamos da geração que vai assumir o nosso lugar, ou repetiremos amanhã os mesmos problemas de hoje.”. Na última sexta-feira, 22/04, Otoni foi indicado a vice-líder do governo na Câmara, por JairBolsonaro.

Já o atual presidente da FPE, Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), afirmou que é “preciso chegar em um meio termo”, embora tenha votado a favor do PL 3.723/2019. Em entrevista ao jornal O Globo, o membro da Assembleia de Deus Vitória em Cristo disse que avalia ”que não temos uma cultura que permita armar a população como nos EUA, onde o acesso é muito fácil. Temos regiões do país com índice muito alto de brigas de trânsito, de violência doméstica. Imagina essas pessoas com armas? Por outro lado, não sou um desarmamentista”. Em outra ocasião, ele se mostrou favorável à posse, não ao porte. Entre seus projetos de lei propostos nesta legislatura, está o PL 2014/2021, que propõe a garantia de porte de armas aos fiscais ambientais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Também membro da diretoria da FPE, o Pastor Eurico (PL-PE), foi relator do PL 1.256/2021, que cria um documento único de porte de arma, com validade de cinco anos, que poderá atestar a capacidade de qualquer cidadão para porte de arma de sua posse, desde que ela tenha sido cadastrada e adquirida legalmente. O deputado afirmou que a diretriz atual, que não permite o porte de armas diversas, “é absolutamente ilógica”. “O cidadão que detém o porte de arma de fogo comprovou as qualificações técnica e psicológica e atendeu aos demais requisitos legais”, disse. Ele também já participou de uma visita à empresa de armas Taurus, em 2012. O deputado, contudo, votou contra a aprovação do PL 3.723/2019.

Liderança evangélica destacada no país, o fundador da igreja Sara Nossa Terra e ex-deputado federal, bispo Robson Rodovalho, já se posicionou a favor do armamento em entrevista ao jornal O Globo. Segundo ele, “no campo das armas, muitos evangélicos são a favor da posse. Há uma sensação generalizada da impotência do Estado no campo da segurança pública“, mas em outra ocasião, afirmou que “o porte [de armas] é desnecessário.”

Já Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, que nunca teve mandato, mas tem atuação política marcante, já comentou em seu canal no YouTube, em 2015, que a revisão do Estatuto do Armamento era um “lobby da indústria de armas”. “Nós somos a favor que a polícia esteja muito bem preparada de armamento, agora, há uma diferença entre a polícia estar bem armada e armar o cidadão. Isso é loucura!”, disse o pastor.

A reportagem tentou contato com a Igreja Presbiteriana no Brasil, mas não obteve resposta até a publicação da reportagem. Também tentamos entrevista com o Clarissa e Junior Tércio, porém não tivemos retorno da Assessoria de Imprensa. Os deputados da Frente Parlamentar Evangélica no Congresso também foram procurados, mas não responderam nossos questionamentos.

Jornal do Brasil

Da Internacional ao 1º de Maio, os sinais estão trocados

 




Por Luiz Carlos Azedo (foto)

O estrago que o velho hino está fazendo às imagens de Lula e Alckmin não foi aferido, mas o meme faz a festa bolsonarista. Nada mais simbólico para a falsa tese de que Lula e Alckmin são comunistas 

Quando o Partido Comunista Brasileiro (PCB) foi fundado, em 25 de março de 1922, Astrojildo Pereira e seus oito companheiros de origem anarquista não sabiam cantar A Internacional, como registrou em seu poema Ferreira Gullar. Desde então, apenas os mais empedernidos comunistas sabem a letra do hino composto em 18 de junho de 1888 por Pierre Degeyter — um operário anarquista de origem belga, residente na cidade francesa de Lille —, com base no poema do também anarquista Eugéne Pottier, operário francês membro da Comuna de Paris.

O hino se tornou conhecido na França e se espalhou pela Europa após o congresso do Partido Operário Francês, em 1896. A ideia original de Pottier era fazer uma paródia da Marselhesa, o hino da Revolução Francesa, mas Degeyter deu-lhe vida própria. C’est la lutte finale./Groupons-nous et demain/L’Internationale/Sera le genre humain, o refrão original, na tradução portuguesa ficou assim: “Bem unidos façamos, / Nesta luta final, / Uma terra sem amos /A Internacional”.

A versão em russo serviu como hino da antiga União Soviética de 1917 a 1941, quando foi criado o hino soviético por Stalin, mas A Internacional continuou sendo o hino da maioria dos partidos comunistas. Entretanto, alguns partidos socialistas e social-democratas também haviam adotado o hino, antes do racha da II Internacional, por ocasião da Primeira Guerra Mundial. Hoje, são raros os que o mantêm.

O Partido Socialista Brasileiro (PSB) não tem absolutamente nada a ver com essa história. A legenda foi refundada em 2 de julho de 1985, por Antônio Houaiss (presidente), Marcelo Cerqueira, Roberto Amaral, Evandro Lins e Silva, Jamil Haddad, Joel Silveira, Rubem Braga e Evaristo de Moraes Filho, à frente de um grupo de estudantes e intelectuais. Reivindicaram o legado da antiga Esquerda Democrática, que deu origem ao antigo PSB, em 1947, sob liderança de João Mangabeira, Hermes Lima, Antônio Cândido, Bruno de Mendonça Lima, Paulo Emílio Sales Gomes e José da Costa Pimenta.

Não se sabe de quem foi a ideia, mas em todos os congressos recentes do PSB — que ganhou musculatura após a entrada de Miguel Arraes, então governador de Pernambuco, em 1990 —, A Internacional é executada com pompa e circunstância. Quase ninguém sabe cantar o hino. No último congresso, não foi diferente, mas o contexto era inadequado, porque as estrelas da abertura do evento, na quinta-feira passada, eram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin. O constrangimento de ambos era visível, sobretudo do segundo, que trocou o PSDB pelo PSB. Alguns, como Carlos Siqueira, presidente do PSB, cantaram o refrão com o punho direito erguido, quando a tradição é usar o punho esquerdo.

Narrativas

O estrago que A Internacional está fazendo nas redes sociais às imagens de Lula e Alckmin ainda não foi aferido, mas o meme faz a festa de ativistas bolsonaristas, com ajuda de robôs, é claro. Nada mais simbólico para corroborar a falsa tese de que Lula e Alckmin são comunistas enrustidos. A grande massa de eleitores não sabe nem do ocorrido, mas a extrema-direita tem o discurso na ponta da língua, ou do dedo, pois estamos falando de redes sociais. O PSB deu farta munição para Lula e Alckmin serem atacados pelos adversários, o que de resto já vinha acontecendo, em razão da aliança com o PT. Fatos como esse, numa campanha eleitoral radicalizada, alimentam a narrativa do bem contra o mal e da liberdade contra o comunismo, adotada pelo presidente Bolsonaro.

E o 1º de Maio? Não é comemorado apenas no Brasil. As manifestações ocorrem nas Américas, na Europa Ocidental, na Rússia, na Índia, na China e em muitos países da África. A data foi escolhida em homenagem aos trabalhadores dos Estados Unidos. Num sábado, 1º de maio de 1886, cerca de 300 mil manifestantes foram às ruas em Nova York, Chicago, Detroit e Milwaukee, entre outras cidades, para pedir a redução da carga horária máxima de trabalho para oito horas por dia. Àquela época, se trabalhava até 16 horas, seis dias na semana.

Em Chicago, os protestos duraram vários dias e foram muito reprimidos, o que resultou na morte de quatro trabalhadores e sete policiais, além de 130 pessoas feridas, em 4 de maio. Dos 2.500 manifestantes, 100 foram presos, sendo oito condenados à morte. Dois tiveram a pena convertida em prisão perpétua, um apareceu morto na cela e os sindicalistas Adolph Fischer, George Engel, Albert Parsons e August Spies foram enforcados. Em 1893, o governador John Altgeld concedeu perdão aos sobreviventes.

As manifestações convocadas por Bolsonaro para este domingo, portanto, não têm nada a ver com o 1º de Maio, data em que as centrais sindicais fazem grandes festas e manifestações nas principais cidades do país. São contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e têm jeito de provocação golpista. Mais um sinal trocado na política brasileira.

Correio Braziliense

Por que tantos alemães estão migrando para o Paraguai




Uma saudação em alemão e espanhol recebe quem chega a Obligado, no sul do Paraguai

Por Mar Pichel, enviada especial para o Paraguai

Ao caminhar pelas chamadas Colônias Unidas, no sul do Paraguai, percebe-se rapidamente que algo está mudando.

Em alguns terrenos vazios, é possível ver contêineres com os pertences dos recém-chegados. Em outros, as novas casas já estão sendo construídas.

É a evidência mais clara da nova onda de imigrantes europeus que esta região está recebendo. A área localizada às margens do rio Paraná abriga cerca de 45 mil pessoas divididas em três municípios: Honenau, Obligado e Bella Vista.

Os moradores dizem que a onda migratória começou há cerca de três anos. No entanto, foi nos últimos meses que houve um salto perceptível no movimento.

A maioria dos que chegam vem da Alemanha, mas também há austríacos e russos.

Segundo dados fornecidos à BBC Mundo pela Direção Geral de Migração do Paraguai, entre junho de 2021 e fevereiro de 2022, foram emitidas 1.324 permissões de residência para cidadãos alemães.

Eles representam a segunda nacionalidade com maior número de permissões de residência emitida nesse período, atrás apenas dos brasileiros.

Mas outras fontes nos disseram que de junho a fevereiro deste ano, milhares de alemães desembarcaram no Paraguai para se estabelecer no país. E nem todos eles passaram pelos registros de imigração.

A BBC Mundo viajou ao Paraguai em fevereiro para entender as razões e consequências do fenômeno.

'Willkommen'

Embora também tenham se estabelecido em outras partes do país, boa parte dos novos imigrantes opta por se estabelecer nas Colônias Unidas. E não é difícil entender o porquê.

As Colônias Unidas foram fundadas por colonos de origem alemã quando Wilhem (Guillermo) Closs, um descendente de alemães nascido no Brasil, e um punhado de outras famílias alemãs estabeleceram a primeira delas, Hohenau, em 1900.

Desde então, tanto a cultura quanto a língua alemã permaneceram presentes: existem escolas alemãs, igrejas alemãs luteranas e evangélicas, e muitos dos moradores falam alemão.

Na entrada da cidade de Obligado há uma placa que diz "Fuhl dich wie zu Hause" (Sinta-se em casa). Em Bella Vista, a tradicional mensagem de boas-vindas em espanhol é acompanhada por um "Willkommen" (Bem-vindo).

"Temos um grande número de descendentes de europeus e acho que essa nova onda de imigrantes é porque eles se sentem à vontade aqui, as pessoas os tratam bem, de maneira amigável, e eles podem falar alemão confortavelmente, eles se sentem em casa", diz Enrique Hahn, prefeito de Hohenau e também descendente de alemães.

Antes das Colônias Unidas, já existiam outras colônias alemãs no Paraguai como San Bernardino e Nueva Germania, fundadas pela irmã do filósofo Friedrich Nietzsche, Elisabeth Nietzsche, e seu marido, Bernhard Förster, na tentativa de criar uma comunidade de raça ariana fora da Alemanha.

Os primeiros a chegar buscavam novas terras para trabalhar e oportunidades em um país que tentava se recuperar da devastadora Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870) com uma política de imigração aberta.

Desde a sua fundação, as três "colônias" receberam um fluxo regular de imigrantes da Europa, principalmente durante e após a Segunda Guerra Mundial.

Primeiro chegaram aqueles que fugiam da instabilidade e da violência. Após a derrota da Alemanha Nazista, alguns membros ou simpatizantes do partido nazista também começaram a chegar.

Entre eles destaca-se o nome de Josef Mengele.

Conhecido como o "Anjo da Morte", o ex-médico de Auschwitz viveu um tempo escondido em Hohenau, quando era um dos criminosos de guerra mais procurados do mundo.

A história não é discutida abertamente na região. O mesmo não acontece, porém, quando o assunto é a chegada de novos imigrantes.

"Temos muito interesse que eles venham porque trazem tecnologia, progresso e desenvolvimento e as pessoas aqui estão muito agradecidas pelo avanço que tivemos com a chegada dos imigrantes europeus", destaca o prefeito.

Esta é uma das áreas mais férteis do país, onde prosperaram fazendas agroindustriais dedicadas à soja e à erva-mate.

No entanto, muitos dos imigrantes do século 21 não parecem chegar motivados por razões econômicas.

'A gota que encheu o copo'

A família Hausen, composta por Stephan, Theresa e Ella, de 2 anos, deixou sua casa em Nuremberg em novembro e nos recebeu em sua nova casa nas Colônias Unidas.

"Durante anos, a política na Alemanha foi em uma direção, e só nos foi permitido pensar na direção que o governo nos diz", disse Theresa, que é fisioterapeuta, à BBC Mundo.

"Acho que há muito a dizer... desde a educação nas escolas, o que nossos filhos aprendem, até o que acontece com a nossa saúde, esses são os dois principais problemas. Nos dizem explicitamente o que fazer!" .

Mas para eles, o verdadeiro ponto de virada foi a pandemia de coronavírus e o que eles veem como uma má gestão da crise pelo governo alemão.

"Inicialmente apoiamos as medidas contra a covid", diz Stephan, que espera continuar trabalhando como carpinteiro no Paraguai.

"Mas as restrições contínuas nos deixaram sem ideias. Esse foi o momento em que nos perguntamos para onde esses bloqueios estavam nos levando", acrescenta.

"Decidimos sair muito antes, mas esta foi a gota d'água que encheu o copo".

Contra a vacinação

Assim como os Hausens, muitos dos alemães que chegaram ao Paraguai nos últimos meses acreditam que em seu país não há liberdade para tomar as próprias decisões e referem-se, em particular, à campanha de vacinação.

Theresa e Stephan afirmam estar vacinados, mas o professor e editor de cinema Florentin Stemmer, que chegou a Hohenau em dezembro, não está.

Stemmer acredita que a decisão de se vacinar deve ser pessoal e não governamental, e afirma que a covid dividiu a Alemanha.

"Perdemos tudo por causa da decisão de não nos vacinarmos", diz.

"Imagine alguém tentando forçá-lo a fazer algo que você não quer fazer. Obrigá-lo com as redes sociais e até ameaçar fazê-lo à força", diz ele.

No momento, a vacinação não é obrigatória na Alemanha — embora o tema esteja sendo debatido —, mas os não vacinados têm acesso restrito a restaurantes, lojas e estabelecimentos de lazer e arte.

Desde o início da pandemia, inúmeros protestos contra as restrições e contra a vacinação têm sido realizados nas ruas alemãs, nos quais a palavra "Freiheit" (liberdade) e as teorias da conspiração têm sido uma constante.

Movimento e desafios econômicos

No Paraguai, a chegada de novos imigrantes causou reações mistas.

Por um lado, nas Colônias Unidas destacam-se os benefícios econômicos que os recém-chegados trouxeram.

"No meio da pandemia tivemos um movimento econômico bastante interessante, considerando que os moradores de Hohenau conseguiram vender suas terras e isso lhes deu segurança e chance de sobreviver a essa pandemia que tivemos que viver", conta Noemi Jara, que no momento da entrevista trabalhava no Centro Histórico Cultural Edwing Krug como Secretária de Cultura.

O setor da construção é um dos grandes beneficiados, como pode ser observado nas lojas de materiais de construção escolhidas pelas famílias alemãs.

Edifícios pontilham os campos verdes nos arredores de cada uma das cidades. São, em geral, casas grandes e cercadas por extensos terrenos.

Mas tudo isso também traz desafios para o município.

"Somos uma cidade de aproximadamente 16.000 habitantes e o fato de 1.000, ou 2.000, ou 3.000 habitantes chegarem em 4 ou 5 meses, sobrecarrega um pouco e isso implica muito planejamento, muita logística para serviços básicos", explica o prefeito Hahn.

Há também outras preocupações.

Para Hahn, um dos maiores problemas é que a maioria dos recém-chegados "não está vacinada" e "é contra a vacinação".

"Gostaríamos de conviver, trabalhar com eles. Sabemos que são pessoas que têm uma visão mais avançada do que aqui, que podem contribuir muito... mas eles também têm que saber que estão em um lugar onde há legislação e onde há restrições".

"É uma grande preocupação para os cidadãos ficarem expostos a imigrantes que não estão vacinados. A maioria acredita que as medidas precisam ser cumpridas", destaca Noemi Jara.

"Por que há esse privilégio enquanto para os paraguaios há uma exigência? É uma desigualdade. E esse é um sentimento muito profundo que os paraguaios têm em geral, sejam descendentes de estrangeiros ou nativos", explica.

A vacinação não é obrigatória no Paraguai, mas há uma forte campanha institucional a favor dela, e desde janeiro deste ano é obrigatória a apresentação do certificado de vacinação para entrar no país.

Mas isso não impediu a chegada de imigrantes europeus não vacinados.

"Há notícias de pessoas que vão para a Bolívia, onde não é necessário o cartão de vacinação, entram no Paraguai por via terrestre e vêm se estabelecer em Hohenau", conta o próprio prefeito.

Juan (alteramos seu nome por motivos de segurança) é um funcionário do governo paraguaio. Ele confirma que milhares de alemães entraram clandestinamente no Paraguai desde que os regulamentos mudaram.

"Com as novas exigências do Ministério da Saúde do Paraguai introduzidas em janeiro, alguns contêineres ficaram nos portos, pois sem a carteira de vacinação não poderiam circular", diz.

"Esse é o momento em que eles procuram lugares clandestinos por onde possam entrar, mesmo perdendo tudo o que trouxeram", diz.

Na sequência deste depoimento, solicitamos comentários à Direção-Geral das Migrações, que via e-mail nos informa que não receberam "até ao momento, reclamações relativas à migração irregular massiva de cidadãos de nacionalidade alemã".

"Embora nosso país tenha vários quilômetros de fronteira seca, a imigração irregular de cidadãos alemães, ainda que não seja impossível, é improvável", acrescentam no comunicado escrito.

Imigrantes fugindo da imigração

No entanto, não é apenas a pandemia que impulsionou essa nova onda de imigração alemã para o Paraguai.

Praticamente todos os alemães com quem conversamos citaram a chegada de imigrantes muçulmanos na Alemanha como outra razão pela qual deixaram seu país.

Desde 2015, mais de um milhão de imigrantes e refugiados — a maioria fugindo de conflitos no Afeganistão, Iraque e Síria — chegaram à Alemanha graças à política de portas abertas da ex-chanceler Angela Merkel.

"Acho que deveríamos ter uma imigração mais regulamentada. Você tem que ter um planejamento de quantos você deixa entrar. O Estado tem capacidade de cuidar de todas essas pessoas? Precisamos ter uma discussão sobre isso", diz Theresa Hausen.

"Claro que grupos estão se formando. De um lado, os alemães e, do outro, os muçulmanos. Não deveria ser assim, queremos viver em paz, mas isso não é possível se tantos entrarem no país", disse.

Os Hausens dizem que se sentem muito bem-vindos no Paraguai, mas acreditam que as coisas não podem funcionar da mesma forma na Alemanha em relação aos imigrantes muçulmanos. O problema, eles apontam, é a diferença cultural.

"Em nossa experiência, o Paraguai é um país muito cristão e viemos de uma cultura cristã. Conhecemos muitas pessoas aqui e estamos na mesma página", diz Stephan.

No entanto, para outro imigrante alemão, o problema não é a diferença cultural.

"Na Alemanha, sempre tivemos outras culturas, mas quando esses imigrantes chegaram, ficou muito perigoso para nós ficar", Hana (nome fictício) nos conta.

Hana está aposentada. Ela chegou ao Paraguai com o marido há quatro anos, porque diz que, apesar de ter trabalhado muito durante toda a vida, sua aposentadoria estava ficando cada vez menor. Agora ela ajuda alguns dos recém-chegados a se estabelecerem no país sul-americano.

"A Alemanha não era mais nosso país", disse ela à BBC Mundo.

Assim como ela, outros alemães com quem conversamos associaram a chegada de refugiados e imigrantes muçulmanos ao aumento da criminalidade, argumento também usado pelo partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD).

"Eles não se sentem seguros, temem por suas mulheres e meninas", diz Hana, referindo-se aos motivos apresentados pelos recém-chegados.

Alguns ataques de imigrantes alimentaram a retórica anti-imigrante e xenófoba na Alemanha, como a série de agressões sexuais na véspera de Ano Novo de 2016 na cidade de Colônia, atribuídas principalmente a imigrantes de origem árabe ou norte-africana.

Mas o que dizem os números?

O Escritório Federal de Investigação Criminal da Alemanha registrou entre 2014 e 2016 um aumento geral no número de crimes, assassinatos e estupros.

Segundo dados da mesma agência, a porcentagem de imigrantes considerados culpados de crimes violentos também aumentou em 2015 e 2016. No entanto, a maioria desses crimes ocorreu dentro de abrigos de refugiados.

Desde 2017, o número total de crimes registrados tem diminuído constantemente, assim como a porcentagem de crimes cometidos por imigrantes.

Hana diz que na Alemanha há uma campanha da mídia para difamar os alemães que se instalam no Paraguai, que são descritos como antivacinas e racistas.

"Não importa se você é preto, branco, vermelho, rico ou pobre, é a mesma coisa... A única coisa que importa é que o coração respeite qualquer cultura", responde à pergunta sobre o que diria a pessoas que pensam que seus argumentos são racistas.

No entanto, quando questionada sobre os imigrantes alemães que atravessaram por terra para o Paraguai para evitar os controles que exigem a entrada no país com certificado de vacinação, ela responde que isso não é correto e que não existe tal imigração ilegal.

"Os alemães não têm medo de vacinas, eles nos vacinam quando crianças, nos vacinam contra tudo. Alguns têm poucas dúvidas sobre a nova vacina."

Ela então reconhece que alguns estão burlando os controles de fronteira: "Está acontecendo, sim, está acontecendo. Mas não são todos eles!"

A realidade é que esse fato incomoda alguns setores da sociedade paraguaia.

"Aqui estamos tentando cuidar uns dos outros, nos vacinar, vacinar até as crianças, e eles chegam sem querer ser vacinados, e entram no nosso país e o vírus está em todo lugar. E isso tem um grande impacto para nós paraguaio", diz João.

"Espero que o controle seja rígido para todos. Sabemos que eles vêm para investir em nosso país, mas têm que cumprir as obrigações que temos aqui também."

BBC Brasil

O Congresso tem prerrogativas – e deveres - Editorial




Cabe ao Congresso dar a palavra final sobre a cassação de parlamentar em caso de condenação criminal. Mas essa competência não é autorização para a omissão

Na terça-feira passada, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), defenderam que cabe ao Poder Legislativo dar a palavra final sobre a cassação de parlamentares. Eles têm razão. A Constituição de 1988 é cristalina a esse respeito.

Entre as hipóteses de perda de mandato, o art. 55 da Constituição elenca a “condenação criminal em sentença transitada em julgado” (inciso VI). E, dois parágrafos adiante, dispõe: “Nos casos dos incisos I, II e VI, a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa”.

Não há dúvidas. Em caso de condenação criminal, a palavra final é da respectiva Casa legislativa, exigindo, para a cassação, concordância da maioria absoluta de deputados ou senadores. Na redação original, o texto estabelecia ainda que a votação devia ser secreta. A Emenda Constitucional (EC) 76/2013 retirou essa exigência.

A proteção constitucional do mandato parlamentar, que a alguns pode soar excessiva, tem um sentido genuinamente democrático. Uma das primeiras medidas impostas por ditaduras é a cassação de parlamentares: às vezes, diretamente, sem nenhum pudor; outras, por meio de processos judiciais enviesados e parciais, cuja função é dar aparência de legalidade aos desmandos do regime ditatorial. Por isso, Constituições democráticas são muito cuidadosas na definição das prerrogativas do Legislativo.

O sentido dessas garantias não tem nada de imoral ou antirrepublicano, como se fosse uma concessão à impunidade ou uma legislação em causa própria. É proteção da vontade da população, que escolheu aquelas pessoas para representá-la no Congresso. Mudar a composição da Câmara ou do Senado é algo muito sério.

Dessa forma – e tendo diante de si o histórico de cassações de parlamentares durante o regime militar –, a Assembleia Constituinte previu, no art. 55, de forma taxativa, seis hipóteses de perda de mandato. Também fixou procedimento específico para (i) descumprimento das proibições referentes ao cargo de parlamentar, (ii) quebra de decoro e (iii) condenação criminal transitada em julgado. Nos três casos, a cassação deve ser decidida pela Câmara ou pelo Senado. Não é o Judiciário que decide.

Os presidentes do Senado e da Câmara exercem, portanto, seu estrito papel institucional de defesa das prerrogativas do Congresso quando afirmam que compete ao Legislativo dar a palavra final sobre cassação de parlamentar em caso de condenação criminal ou de quebra de decoro. Mas há um ponto importante que eles não disseram: essa competência privativa do Congresso não é autorização para a omissão.

Quando a Constituição define que condenação criminal transitada em julgado é hipótese de perda de mandato significa que tal situação penal é incompatível com a função pública de parlamentar. Não cabe, assim, ao Congresso postergar a análise desses casos, como se dispusesse de uma atribuição institucional absolutamente desprovida de responsabilidade. Agir dessa forma seria desfigurar o próprio sentido da prerrogativa constitucional, que não é facilitar a impunidade, mas preservar a inviolabilidade do mandato parlamentar segundo os parâmetros definidos pela própria Constituição.

No sistema de freios e contrapesos entre os Poderes, se o Legislativo habitualmente não cumpre seus deveres constitucionais – por exemplo, o de cassar o mandato de parlamentares que ostensiva e repetidamente quebram o decoro parlamentar –, os outros Poderes, em particular, o Judiciário, serão instados a agir. Logicamente, isso não autoriza que a Justiça ignore os limites de suas competências. Mas é preciso admitir também a ocorrência, especialmente num sistema cujos limites muitas vezes não são linhas precisas, da atuação supletiva de um Poder perante a omissão de outro.

A melhor defesa que o Congresso pode fazer de suas prerrogativas é cumprir seus deveres. O efeito é imediato.

O Estado de São Paulo

Sem choro nem vela

 




Terceira via agoniza, União Brasil, PSD e Podemos vão liberar geral, cada um por si

Por Eliane Cantanhêde 

A terceira via agoniza, com o União Brasil fora, o PSDB se autodestruindo, o MDB revirando suas velhas agonias e o Cidadania impotente, enquanto a "opção única” vai deslizando do improvável para o patético e nem se sabe mais se haverá anúncio de qualquer coisa em 18 de maio, à espera de um milagre. Desfecho melancólico.

Com fundo eleitoral gigante, tempo de TV para dar e vender e ramificação pelo País, o União Brasil conseguiu engabelar os parceiros de terceira via, matou a candidatura Sérgio Moro e inventou a de Luciano Bivar. A turma esquece rápido. Quem é Bivar? É o que deu a sigla PSL para Jair Bolsonaro em 2018.

A jogada do União Brasil, fusão artificial de PSL e DEM, que abortou lamentavelmente um belo voo, é liberar geral – especialmente pró-Bolsonaro. Esse movimento se repete com o Podemos, de onde Bivar arrancou Moro para jogar no vazio, e com o PSD, que foi parar em Irajá. Seu líder Gilberto Kassab tende para Lula, mas ele e o resto vão com quem for ganhar.

Com União Brasil, PSD e Podemos prontos para lavar as mãos, a polarização entre Bolsonaro e Lula entra numa nova fase: a pescaria feroz dos peixes graúdos, jogando a rede para o eleitorado órfão. Inclusive de PSDB, MDB e Cidadania.

A desenxabida terceira via afunila para João Doria e Simone Tebet. Na última reunião, o União Brasil já nem mandou representante e os três tucanos eram todos contra Doria. A favor do que? Sabe-se lá. E o MDB finge estar com Simone, enquanto negocia no Nordeste com Lula e está doido para pular no barco de Bolsonaro no Sul.

Ciro Gomes, do PDT, mantém firme e forte a terceira posição das pesquisas, mas sem chegar a dois dígitos, e voltou a ser o de sempre, trocando palavrões e ameaçando com tapas e socos quem grita contra, algo tão natural em campanhas.

Enquanto isso, Bolsonaro faz duas horas de homenagens no Planalto para um ex-policial que sofreu dezenas de sanções disciplinares, ironizou máscaras na pandemia, é casado com uma beneficiária do auxílio emergencial, ameaça STF, ministros e a democracia. O presidente tenta, assim, disfarçar inflação, desemprego e queda de renda. Se não colar, resta o Plano B: desacreditar o sistema eleitoral.

Do outro lado, Lula tem problemas no PT, mas faz política. Consolidou o apoio do PSB e da Rede, amplia o de setores de MDB, PSD e União Brasil e ganhou um troféu e tanto para a campanha: o relatório do Comitê de Direitos Humanos da ONU contra Moro e Lava Jato e a favor dele, que tira munição de Bolsonaro e ataca com a comparação entre os dois governos. Viúvas da falecida terceira via, o que sobra é isso.

O Estado de São Paulo

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