BRASÍLIA - O bem sucedido processo de inclusão social gerou "um bom problema" para o governo de Luiz Inácio Lula da Silva: o aquecimento da demanda provocado pelos programas de inclusão social, que jogou no mercado consumidor milhares de brasileiros das classes C, D e E. Os elevados níveis de consumo desses emergentes entrou de vez no radar econômico e suscitou análises diferentes no Banco Central e no Ministério da Fazenda.
O BC identifica problemas à frente no controle da inflação. A Fazenda saltou de uma preocupação exacerbada, para uma postura mais equilibrada e alinhada com o BC, de identificação da capacidade da indústria doméstica atender à demanda.
O Banco Central teme que a procura por bens se mantenha em ritmo insustentável para a atual capacidade de produção. Esta percepção não é nova. Há alguns meses, a diretoria do Banco alertava para o risco inflacionário do consumo desenfreado e da expansão dos gastos públicos, que dão fôlego às análises sobre a possibilidade de elevação da taxa básica de juros. O relatório de inflação, divulgado na quinta-feira foi um marco para essas pretensões do colegiado do Comitê de Política Monetária (Copom). No mercado financeiro, as opiniões são divergentes mas a tendência também é de elevação da Selic.
Com projeções apontando para inflação ligeiramente acima da meta de 4,5% neste e no próximo ano, o diretor de Política Econômica, Mário Mesquita, foi enfático: "O BC que espera a inflação divergir muito em relação à meta para agir tem que atuar de forma mais intensa e por mais tempo, o que tende a ser danoso para a atividade econômica".
Essa afirmação foi interpretada como a abertura do voto pela alta dos juros. Fontes do mercado financeiro consideraram que a manifestação pública da posição do diretor só pode ter acontecido com o respaldo do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
A economista-chefe do Banco Real, Zeina Latif, se alinha com a visão do BC. "Há crescimento da renda, o mercado de trabalho vai bem, a demanda robusta, mas há limites na oferta, na infra-estrutura e nas empresas. Por isso, a economia precisa desacelerar", disse, explicando que, por conta da dificuldade de se obter dados de curto prazo sobre a inclusão social, o foco tem que ser na demanda geral.
No Ministério da Fazenda a visão é diferente. No intuito de retirar o argumento do BC para elevar os juros, o ministro Guido Mantega se precipitou e insuflou a proposta de limitar o crediário. Enquadrado no Palácio do Planalto e desagradando até assessores próximos, voltou ao discurso tradicional, de que alguns setores estão com demanda mais aquecida, mas não há risco de inflação e o caminho é estimular os investimentos.
A alta nos financiamentos é resultado direto de políticas do governo - como o empréstimo consignado e a aprovação de medidas que reduzem o risco dessas operações. Uma política que, no ano passado, possibilitou o aumento de 6,5% no consumo das famílias, permitindo que a população de baixa renda passasse a ter acesso a bens de consumo durável.
A equipe econômica, na Fazenda, considera que o processo de inclusão social não está e não será limitado pela macroeconomia. Os gargalos que começam a aparecer serão superados com a maturação dos investimentos. "Pode haver uma desaceleração na inclusão, mas não acaba", disse uma fonte, destacando que o efeito desse processo na demanda tem fases distintas: "Primeiro foram elevadas as compras de alimentos, depois de bens duráveis e agora é a vez da casa própria."
A economista-chefe da Tendências Consultoria, Ana Carla Abrão Costa, também não vê o processo de inclusão limitado pela macroeconomia. "O crédito aumentou o bem estar da população e sustenta o aumento da renda", disse ao criticar a idéia de Mantega de limitar empréstimos. "Se a idéia dele tivesse vingado, aí sim, poderíamos ter risco de inflação, pois haveria um colapso da oferta."
Fonte: Tribuna da Imprensa
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