José Dirceu
Qualquer proposta de restringir o crédito ou aumentar juros neste momento é uma usurpação da esperança e das oportunidades que se abriram para o Brasil depois de anos de sacrifícios e desencontros na política econômica do país.
Não há nenhuma razão para isso. O crédito no Brasil não chega a 35% do PIB, a metade da média internacional; o crédito consignado está totalmente garantido; a inflação está dentro da meta de 4,5%, fora a banda de 2% (para cima e para baixo), que nossos conservadores fazem de conta que não existe. Nossa economia está crescendo 5% ao ano, um bom índice, embora não seja tão espetacular para os padrões chinês, russo, indiano e mesmo argentino.
Está claro que esse crescimento tem, como conseqüência imediata, o aumento do emprego – foram 1,65 milhão no ano passado, que podem chegar a 1,8 milhão este ano – e está baseado na distribuição de renda e no aumento da demanda interna e dos investimentos. Estes, sim, começam a crescer no ritmo chinês, particularmente a demanda doméstica, de 9%. A formação bruta de capital fixo está crescendo três vezes mais que o PIB e os investimentos em infra-estrutura duas vezes.
Nosso crescimento não depende exclusivamente das exportações ou do comércio internacional e nada indica que a China e outros países citados deixarão de crescer. É verdade que os Estados Unidos estão entrando numa desaceleração, que pode durar anos, mas, ao contrário da União Européia e do Canadá e México, ligados aos americanos pelo Nafta, o Brasil só exporta 20% de suas vendas externas àquele país e não tem os mesmos laços de dependência e a mesma relação financeira.
Por outro lado, mesmo com o surgimento de um déficit nas transações externas, vamos exportar US$ 182 bilhões e importar US$ 155 bilhões, e vamos receber investimentos suficientes para evitar um déficit externo grave.
Não há nada, portanto, que justifique um aumento de juros ou qualquer tipo de restrição ao crédito. Ainda bem que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, recuou da proposta que havia colocado de restringir as operações de crédito como alternativa para conter a demanda e, com isso, evitar uma provável elevação da taxa de juros pelo Banco Central.
Se efetivada, a proposta do ministro Mantega seria como jogar água fria no ânimo do empresariado de assumir riscos e investir. E certamente faria o país sair da rota do crescimento, dificultando a solução de seus graves problemas de infra-estrutura, educação e inovação. O país precisa é resolver os gargalos, como os das contas públicas, déficit da Previdência e dívida interna, e não esfriar o crescimento.
A saída é continuar na mesma direção e adotar medidas de política industrial e inovação que apresentem alternativas à provável escassez de matérias primas, insumos e bens de capital. E, de outro lado, permitam retomar os investimentos nos setores estratégicos como biotecnologia, fármacos, software e semicondutores, para que nossa economia seja exportadora não só de commodities e manufaturas, mas cada vez mais de capitais, tecnologia e serviços.
É preciso viabilizar a reforma tributária, a desoneração dos investimentos e a redução dos juros. Reafirmo: redução dos juros, sim, pois todas as taxas de juros subiram nos últimos dois meses. A taxa média dos financiamentos para pessoas físicas, por exemplo, subiu de 48,8% ao ano para 49,0%, a taxa média dos empréstimos passou de 33,8% ao ano para 37,4%. E continuamos com uma Selic de 11,25%, para uma inflação de 4,3%.
Portanto, a idéia de reduzir a demanda via aumento dos juros ou redução do crédito é um erro grosseiro. A única saída é a associação entre o Estado, o empresariado e a sociedade para organizar os investimentos, como faz o PAC, e superar os pontos de estrangulamento. Só assim vamos manter o ciclo virtuoso de crescimento, fora do qual não há saída para o Brasil.
Fonte: JB Onine
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