Marçal tem ao menos R$ 135 mi em empresas, aeronaves e imóveis fora de declaração ao TSE
O autodenominado ex-coach Pablo Marçal (PRTB) costuma usar a própria riqueza como chamariz para atrair alunos para seus cursos, em que chega a cobrar até R$ 250 mil.
O candidato do PRTB, que está empatado tecnicamente na liderança da corrida municipal ao lado de Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), é de longe o candidato o dono do maior patrimônio declarado à Justiça Eleitoral na disputa paulistana, com R$ 168 milhões.
O número, porém, não contempla o tamanho real da riqueza do candidato que, em vídeo, chega a dar a entender que pode ser um bilionário.
A reportagem localizou empresas, imóveis e aeronaves em nome de Marçal e de suas pessoas jurídicas que não constam da declaração dele à Justiça Eleitoral. Há companhias que foram omitidas, e outras, subvalorizadas.
No total, elas representam um patrimônio de R$ 135 milhões a R$ 168 milhões, a depender do valor de mercado das aeronaves.
A reportagem procurou a assessoria de candidato para obter explicações sobre as inconsistências localizadas na declaração, mas não obteve retorno.
O modelo da declaração eleitoral de bens tem formato vago. Uma das brechas permite, por exemplo, que um candidato declare uma empresa com valor pequeno, mas não declare os bens que essa empresa possua e que eventualmente valham mais.
Ao analisar a declaração de Marçal, a reportagem constatou que ele omitiu ao menos duas empresas de que é sócio, além de ter informado valores inferiores estimados de outras companhias.
Boa parte do patrimônio do candidato está concentrada na Marçal Participações, que só em imóveis tem R$ 79 milhões, entre os quais está um terreno em Santana de Parnaíba, na Grande São Paulo, que foi comprado por R$ 24 milhões neste ano.
Além disso, ela ainda possui um avião e dois helicópteros, um dos quais —o AW109 Grandnew – Agusta— tem valores de mercado que variam entre R$ 10 milhões e R$ 35 milhões, segundo sites especializados.
Marçal declarou ter 90% da companhia, com um valor estimado de R$ 450 mil. No entanto, no site da Receita Federal, ela tem um valor maior, de R$ 2,9 milhões.
Essa pessoa jurídica faz parte de uma intrincada engenharia empresarial, sendo sócia de diversas empresas, algumas delas com capital social bem maior que o dela.
Um exemplo é a Marçal Incorporadora, com capital social de R$ 30 milhões e que tem o próprio Marçal como administrador —em casos assim, o candidato não é obrigado a incluir a empresa em sua declaração.
As empresas do grupo do candidato do PRTB se distribuem por diversas áreas, do ensino ao transporte aéreo. Algumas delas, além da Marçal Participações, também possuem grande patrimônio em imóveis.
Ao todo, a reportagem localizou por volta de R$ 100 milhões em imóveis em nome de empresas do influenciador. Parte deles está registrado como propriedade da Flat Participações, que também não consta da declaração eleitoral do autodenominado ex-coach.
Outra empresa omitida na declaração de bens é a Mcar, uma holding sediada em Barueri (SP), que Marçal tem em sociedade com a esposa, Ana Carolina Marçal.
Uma outra holding do casal é objeto de inconsistência milionária na declaração do candidato. A Marçal Holding, que teve 50% das suas cotas declaradas por R$ 250 mil, na verdade tem capital social de R$ 39 milhões, segundo o site da Receita Federal. Com isso, a declaração à Justiça Eleitoral deveria aumentar em quase R$ 20 milhões.
O advogado especializado em direito eleitoral Renato Ribeiro de Almeida destaca a importância de os candidatos declararem corretamente os dados para que a população e as autoridades possam acompanhar a evolução patrimonial dos que forem eleitos.
Ele afirma, no entanto, que esse tipo de informação não costuma ser fiscalizado pela Justiça Eleitoral. Eventualmente, omissões podem ser investigadas pelo Ministério Público quando houver suspeitas de que não são meros erros, mas sim fraude ou falsidade ideológica.
Nas eleições de 2022, Marçal entrou na mira da Polícia Federal em investigação que mirou empresas incluídas em sua declaração.
Ele foi pré-candidato à Presidência da República pelo Pros, mas teve seu nome barrado pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em meio a disputas pelo comando do partido. Após a decisão, ele se lançou a deputado federal, mas também teve o registro indeferido.
Segundo as apurações feitas pela PF, Marçal e um sócio dele fizeram doações à campanha do influenciador à Presidência e à Câmara, e parte desses valores foi remetida às próprias empresas de que são sócios.
Uma dessas empresas é a Aviation Participações, que teve R$ 80 milhões em cotas declaradas por Marçal na atual eleição. A empresa é dona de um avião Cessna 510, que, em sites de vendas de aeronaves, pode ser encontrado por preços entre R$ 10 milhões e R$ 35 milhões —valor que pode estar incluído no capital social da empresa.
Marçal é hoje uma das maiores referências no ramo de produtos digitais. Ele afirma ter enriquecido a partir de seus cursos e mentorias, com pitadas de autoajuda e messianismo, pelos quais diz cobrar até R$ 250 mil.
O influenciador promete ajudar os alunos a melhorar de vida de forma rápida, desafiando-os a adotar mudanças na mentalidade e em seus hábitos.
No Método IP, um dos cursos mais famosos, os alunos pagam R$ 20 mil pela promessa de aprender, segundo o site de Marçal, a “governar a sua mente, vontade e emoções”; “destravar a prosperidade, que é completamente natural”; “criar hábitos desencadeadores de sucesso”; “ressignificar crenças e reprogramar trilhas neurais” e “instalar drives mentais de alto impacto emocional”.
O próprio Marçal costuma usar seu sucesso empresarial como modelo para os alunos. Em um vídeo em que se compara ao piloto Ayrton Senna, ele afirma que o piloto de Fórmula 1 morto em 1994 não era bilionário, dando a entender que ele mesmo seria.
Sem conseguir avanços prometidos nos cursos, alguns alunos se sentem enganados. O influenciador e suas empresas foram alvo de ao menos 18 ações judiciais por consumidores insatisfeitos. Em 6 delas, a empresa de Marçal foi condenada ou houve acordo para ressarcir os consumidores. Outras duas foram julgadas improcedentes, e as demais estão em curso ou foram arquivadas por abandono da parte autora.
Artur Rodrigues/Folhapress
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