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domingo, agosto 28, 2022

Para uma candidatura de esquerda, Lula fala pouco de desigualdade




De certa maneira, a campanha de Lula tem apelado mais à memória da prosperidade passada do que apresentado planos concretos de como retomá-la

Por Pablo Ortellado (foto)

Vinte anos depois de vencer a primeira eleição, Lula concorre outra vez à Presidência. É o líder nas pesquisas de intenção de voto e tenta derrotar o presidente Jair Bolsonaro, que está cerca de dez pontos percentuais atrás.

Lula tem repetido o bordão de que é preciso “colocar o pobre no orçamento” e tem ligado isso à ideia de revogar o teto de gastos, mecanismo que limita o crescimento das despesas do governo ao patamar do ano anterior, corrigido pela inflação. Argumenta que o teto está drenando recursos da área social. O teto, tal como existe hoje, efetivamente impede a expansão do gasto social mesmo se houver expansão da arrecadação. As diretrizes de governo de Lula não são muito específicas, mas ele promete substituir o teto por uma nova política fiscal que tenha mais flexibilidade e reconheça a importância dos investimentos.

Na área tributária, Lula promete fazer uma reforma em fatias. Sugere que aproveitará a ampla negociação já feita pelo Congresso para unificar os impostos sobre o consumo, criando um imposto sobre o valor agregado. Também propõe taxar lucros e dividendos, outro consenso consolidado entre os especialistas que encontra razoável apoio entre as forças políticas. Mas, para além desses dois consensos, Lula diz pouco. Tanto nas diretrizes como nas entrevistas e declarações, as indicações são vagas, e ele sempre lembra sua malsucedida tentativa de fazer uma reforma tributária em 2007. Para uma candidatura de esquerda, Lula fala pouco de desigualdade. Parece que, num eventual novo mandato, repetirá o descaso com a política tributária, sem a qual não há combate efetivo à desigualdade.

Na política social, Lula tem prometido retomar os fundamentos do Bolsa Família reintroduzindo as condicionantes (exigência de vacina e matrícula na escola) e modulando o valor do benefício de acordo com o número de pessoas na família. Também se comprometeu a tornar permanente o valor de R$ 600 hoje pago pelo Auxílio Brasil. Suas declarações, porém, não apontam para a institucionalização da política. Especialistas têm recomendado um arcabouço legal duradouro que estabeleça fontes de recursos, um mecanismo para corrigir o valor do benefício e um critério para estabelecer a linha de pobreza e de extrema pobreza.

Lula também tem prometido revogar pontos da reforma trabalhista de Michel Temer (em particular, quer reintroduzir a gratuidade do acesso à Justiça do Trabalho) e criar uma nova legislação trabalhista que seja mais moderna e abarque o trabalho autônomo, o teletrabalho e o trabalho por aplicativo. Mais uma vez, as diretrizes de governo são bastante vagas sobre os contornos de tal proposta.

De certa maneira, a campanha de Lula tem apelado mais à memória da prosperidade passada do que apresentado planos concretos de como retomá-la. Isso se deve, em parte, ao atraso na apresentação de um programa de governo definitivo, mas também à estratégia de criar ambiguidades deliberadas, que permitam abrigar na candidatura uma grande diversidade de apoiadores. A escolha de seu antigo adversário político Geraldo Alckmin como vice é uma grande sinalização nesse sentido, ainda mais levando em conta a idade avançada de Lula (76 anos).

Do ponto de vista da campanha, Lula tem batido nos temas de política econômica e social, fazendo contraponto a Bolsonaro, que tem enfatizado temas das guerras culturais. É como se os dois principais candidatos estivessem competindo em modalidades diferentes. Apesar disso, nas entrevistas, Lula não tem conseguido escapar de responder a algumas questões que causam hesitação nos eleitores não petistas.

A mais importante é a corrupção. Lula tem calibrado sua posição a respeito do tema, reconhecendo os desvios na Petrobras, mas, ao mesmo tempo, enfatizando a parcialidade da Lava-Jato. É um movimento na direção certa, mas ainda insuficiente, por não reconhecer a responsabilidade política de ter permitido que um escândalo desse tamanho tivesse acontecido durante seu governo.

Por um lado, Lula é a pessoa certa para se contrapor a Bolsonaro, já que é, indiscutivelmente, o mais habilidoso político brasileiro. Ele, mais que ninguém, é capaz de costurar um amplo arco de alianças para reparar os fundamentos da República abalados pela aventura bolsonarista. Por outro lado, paradoxalmente, Lula é também a pessoa errada para se opor a Bolsonaro, já que encarna, mais que ninguém, os medos que fazem o bolsonarismo prosperar.

O Globo

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