Como disse a ex-presidente Dilma, se faz o diabo para vencer. E quem paga a conta é quem mora no inferno.
Por Alexandre Borges (foto)
Começam a aparecer as primeiras pesquisas eleitorais realizadas após as sabatinas do Jornal Nacional. Nesta segunda-feira (29), saiu o resultado das pesquisas Ipec (antigo Ibope) e BTG/FSB, mostrando uma impressionante estabilidade dos números. Não mudar nada é a grande notícia dos últimos dias.
A pesquisa Ipec trouxe um resultado surpreendente: os dois candidatos que lideram a corrida presidencial não variaram seus índices nem na margem de erro. Seus índices simplesmente não mudaram em nada. Tanto no levantamento de 15 de agosto quanto no que foi divulgado mais recentemente, Lula obteve 44% das intenções de voto (estimulada) para o primeiro turno. Bolsonaro ficou nos 32%. Com esse resultado, Lula tem 51% dos votos válidos e vence sem a necessidade de um segundo turno.
O Ipec é um instituto criado por executivos egressos do finado Ibope, com a estatística e cientista política Márcia Cavallari à frente. Ele entrevistou 2.000 pessoas entre os dias 26 e 28 de agosto em 128 municípios, com margem de erro de 2 pontos. Quando colocamos uma lupa nos "clusters", ou agrupamentos de eleitores por cortes específicos, identificamos algumas variações leves e ainda longe de apontarem novas tendências.
Para o eleitor de baixa renda, alvo de sucessivas canetadas presidenciais que estouraram o teto e acabaram com qualquer resquício de âncora fiscal, na mais cara tentativa de reeleição da história do país, as mudanças são irrisórias. No levantamento anterior, 60% dos eleitores com renda até 1 salário mínimo diziam votar em Lula. Na pesquisa divulgada nesta segunda, o petista caiu para 54%. Considerando a estonteante montanha de dinheiro público gasta para seduzir o eleitor, faltando um mês para a eleição, é muito pouco para animar o campo bolsonarista.
Quando se considera apenas os eleitores com alguém em casa recebendo benefício do governo federal, Lula mantém rigorosamente o mesmo índice da pesquisa da quinzena anterior, 52%. Vale lembrar que os governistas previam uma disparada de Bolsonaro já nessa altura da campanha, o que ainda não se refletiu nos números. Um sinal amarelo está aceso e não é por acaso.
Quando as tropas de Napoleão invadiram a Península Ibérica, tinham na liderança seu homem de confiança, o general Jean-Andoche Junot. Em 1807, uma das primeiras cidades lusitanas a cair sob o controle francês foi Abrantes, na região do Médio-Tejo. Ali nasceu a expressão irônica que zombava da aparente tranquilidade gerada pelo novo governo: "tudo como dantes no quartel d’Abrantes". A frase também era uma autocrítica, já que os lusitanos não ofereceram muita resistência às tropas napoleônicas. O próprio rei D. João VI havia fugido, com toda corte, para o Brasil.
A estabilidade nos números das pesquisas, mesmo com tantos cartuchos queimados pelo bolsonarismo, começa a diminuir o leque de opções dos seus estrategistas neste momento. O movimento atual é apostar todas as fichas no antipetismo, concentrando fogo nos casos de corrupção dos tempos lulistas, na tentativa de crescer seu índice de rejeição e viabilizar o segundo turno, visto como uma nova eleição.
Todo presidente brasileiro que tentou se reeleger foi bem sucedido, considerando os pleitos a partir de 1989. Ao mesmo tempo, nas oito eleições presidenciais após a redemocratização, todos os candidatos que terminaram na liderança no primeiro turno conseguiram vencer. É o copo meio cheio e meio vazio.
Bolsonaro parece com poucas ferramentas à disposição, o que não é nada bom para alguém com seu temperamento e com o controle que exerce sobre muitas mentes do país, muitos investidos na ideia estapafúrdia de que há uma "batalha espiritual do bem contra o mal". Nessas horas que, como disse a ex-presidente Dilma, se faz o diabo para vencer. E quem paga a conta é quem mora no inferno.
Gazeta do Povo (PR)