Controle de preços exigido por Bolsonaro pode dificultar importação de um produto cada dia mais caro e escasso
A extraordinária volatilidade do mercado mundial de diesel provocada pela guerra na Ucrânia, que tem forçado muitos países a substituir boa parte do gás que importavam da Rússia, se expressa na explosão dos preços e nos riscos crescentes de escassez. O Brasil importa cerca de um quarto do diesel que consome. Por precaução, por isso, a diretoria da Petrobras alertou a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para o “elevado risco de desabastecimento de diesel no mercado brasileiro no segundo semestre” e para as incertezas a respeito da cotação do produto.
Em abril, as importações brasileiras de diesel somaram US$ 1,4 bilhão, o maior valor mensal desde novembro de 2012, quando a economia ainda crescia em ritmo intenso. Neste ano, as importações já somam US$ 3,4 bilhões e é possível que a conta suba no segundo semestre, quando o consumo aumenta sazonalmente (por causa do maior uso de máquinas agrícolas para a colheita da safra). Medidas como sanções impostas por diversos países à Rússia por causa da invasão da Ucrânia poderão ter efeitos mais fortes também na segunda metade do ano, com impacto sobre o mercado do diesel. Adicionalmente, esse mercado poderá ser afetado por uma eventual retomada da economia chinesa com o relaxamento das restrições para conter o novo surto da covid.
Desse quadro complicado, no entanto, o presidente Jair Bolsonaro só consegue ver aspectos que podem afetar suas pretensões eleitorais. Sua reação se resume à fúria com que tenta conter os preços internos dos combustíveis, ignorando a complexidade de fatores que os determinam.
Como faz sistematicamente, atribui a terceiros a responsabilidade por qualquer problema que prejudique a campanha eleitoral a que tem se dedicado desde que assumiu o cargo. Ora são os governadores, que não reduzem por sua iniciativa a tributação estadual sobre os combustíveis, ora é a Petrobras, insensível às preocupações do Palácio do Planalto com os preços pagos pelo consumidor.
Já demitiu três presidentes da Petrobras, para mostrar seu inconformismo com a gestão da empresa, baseada em critérios adequados a seus objetivos sociais e que não admitem ingerências políticas, sobretudo no que se refere a controle de preços. Mas, nessa questão, Bolsonaro é incansável. Em uma de suas manifestações recentes, disse que a Petrobras pode quebrar o Brasil se houver novos aumentos do diesel. É sua maneira de tentar mostrar à população que está preocupado com a inflação, que vem corroendo seu prestígio ante o eleitorado e se tornando um dos maiores obstáculos à sua reeleição.
Mas, para quem examine com alguma isenção o quadro do mercado mundial de derivados de petróleo, está mais do que claro que a contenção artificial do preço do diesel inviabilizaria as importações essenciais para o abastecimento interno. Em algum momento, o próprio mercado, como reação ao desabastecimento, imporia a adequação dos preços internos aos externos. Haveria uma alta explosiva, quando a eleição presidencial estará mais próxima. Bolsonaro sabe disso?
O Estado de São Paulo