Publicado em 1 de maio de 2022 por Tribuna da Internet
Luiz Carlos Azedo
Correio Braziliense
Quando o Partido Comunista Brasileiro (PCB) foi fundado, em 25 de março de 1922, Astrojildo Pereira e seus oito companheiros de origem anarquista não sabiam cantar “A Internacional”, como registrou em seu poema Ferreira Gullar. Desde então, apenas os mais empedernidos comunistas sabem a letra do hino composto em 18 de junho de 1888 por Pierre Degeyter — um operário anarquista de origem belga, residente na cidade francesa de Lille —, com base no poema do também anarquista Eugéne Pottier, operário francês membro da Comuna de Paris.
O hino se tornou conhecido na França e se espalhou pela Europa após o congresso do Partido Operário Francês, em 1896. A ideia original de Pottier era fazer uma paródia da Marselhesa, o hino da Revolução Francesa, mas Degeyter deu-lhe vida própria. “C’est la lutte finale./ Groupons-nous et demain/ L’Internationale/ Sera le genre humain”, o refrão original, na tradução portuguesa ficou assim: “Bem unidos façamos, / Nesta luta final, / Uma terra sem amos /A Internacional”.
HINO SOVIÉTICO – A versão em russo serviu como hino da antiga União Soviética de 1917 a 1941, quando foi criado o hino soviético por Stalin, mas “A Internacional” continuou sendo o hino da maioria dos partidos comunistas. Entretanto, alguns partidos socialistas e social-democratas também haviam adotado o hino, antes do racha da II Internacional, por ocasião da Primeira Guerra Mundial. Hoje, são raros os que o mantêm.
O Partido Socialista Brasileiro (PSB) não tem absolutamente nada a ver com essa história. A legenda foi refundada em 2 de julho de 1985, por Antônio Houaiss (presidente), Marcelo Cerqueira, Roberto Amaral, Evandro Lins e Silva, Jamil Haddad, Joel Silveira, Rubem Braga e Evaristo de Moraes Filho, à frente de um grupo de estudantes e intelectuais.
Reivindicaram o legado da antiga Esquerda Democrática, que deu origem ao antigo PSB, em 1947, sob liderança de João Mangabeira, Hermes Lima, Antônio Cândido, Bruno de Mendonça Lima, Paulo Emílio Sales Gomes e José da Costa Pimenta.
CONTEXTO INADEQUADO – Não se sabe de quem foi a ideia, mas em todos os congressos recentes do PSB — que ganhou musculatura após a entrada de Miguel Arraes, então governador de Pernambuco, em 1990 —, “A Internacional” é executada com pompa e circunstância. Quase ninguém sabe cantar o hino.
No último congresso, não foi diferente, mas o contexto era inadequado, porque as estrelas da abertura do evento, na quinta-feira passada, eram o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin.
O constrangimento de ambos era visível, sobretudo de Alckmin, que trocou o PSDB pelo PSB. Alguns, como Carlos Siqueira, presidente do PSB, cantaram o refrão com o punho direito erguido, quando a tradição é usar o punho esquerdo.
VIROU PIADA – O estrago que “A Internacional” está fazendo nas redes sociais às imagens de Lula e Alckmin ainda não foi aferido, mas o meme faz a festa de ativistas bolsonaristas, com ajuda de robôs, é claro. Nada mais simbólico para corroborar a tese de que Lula e Alckmin são comunistas enrustidos.
A grande massa de eleitores não sabe nem do ocorrido, mas a extrema-direita tem o discurso na ponta da língua, ou do dedo, pois estamos falando de redes sociais. O PSB deu farta munição para Lula e Alckmin serem atacados pelos adversários, o que de resto já vinha acontecendo, em razão da aliança com o PT.
Fatos como esse, numa campanha eleitoral radicalizada, alimentam a narrativa do bem contra o mal e da liberdade contra o comunismo, adotada pelo presidente Bolsonaro.
E O 1º DE MAIO? – Não é comemorado apenas no Brasil. As manifestações ocorrem nas Américas, na Europa Ocidental, na Rússia, na Índia, na China e em muitos países da África. A data foi escolhida em homenagem aos trabalhadores dos Estados Unidos.
Num sábado, 1º de maio de 1886, cerca de 300 mil manifestantes foram às ruas em Nova York, Chicago, Detroit e Milwaukee, entre outras cidades, para pedir a redução da carga horária máxima de trabalho para oito horas por dia. Àquela época, se trabalhava até 16 horas, seis dias na semana.
Em Chicago, os protestos duraram vários dias e foram muito reprimidos, o que resultou na morte de quatro trabalhadores e sete policiais, além de 130 pessoas feridas, em 4 de maio.
PENA DE MORTE – Dos 2.500 manifestantes, 100 foram presos, sendo oito condenados à morte. Dois tiveram a pena convertida em prisão perpétua, um apareceu morto na cela e os sindicalistas Adolph Fischer, George Engel, Albert Parsons e August Spies foram enforcados. Em 1893, o governador John Altgeld concedeu perdão aos sobreviventes.
As manifestações convocadas por Bolsonaro para este domingo, portanto, não têm nada a ver com o 1º de Maio, data em que as centrais sindicais fazem grandes festas e manifestações nas principais cidades do país.
São contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e têm jeito de provocação golpista. Mais um sinal trocado na política brasileira.