O aeroporto militar de Chuhuyev, perto de Kharkiv, está entre os primeiros alvos atingidos pela Rússia
As forças armadas russas superam as da Ucrânia— e têm muito mais equipamento e poder aéreo
Por Jonathan Beale
Quão difícil será para a Ucrânia se defender agora que o ataque da Rússia começou?
A Ucrânia está em desvantagem — com menos armas e em menor número em todas as frentes — após significativos investimentos do presidente russo, Vladimir Putin, na modernização das forças armadas da Rússia.
"Acho que os ucranianos estão em uma posição muito difícil", avalia o pesquisador Jack Watling, do Royal United Services Institute (RUSI).
Ele acabou de voltar da Ucrânia e afirma que os líderes militares do país enfrentam agora algumas "escolhas muito difíceis".
Autoridades internacionais estimam que a Rússia tenha até 190 mil soldados na fronteira com a Ucrânia — muito mais do que os 125,6 mil de todo exército regular ucraniano.
As forças russas já estão cruzando a fronteira, chegando de várias direções.
A Ucrânia terá dificuldade em defender milhares de quilômetros de sua fronteira — de Belarus, no norte, até a Crimeia, no sul.
Se você pensar na Ucrânia como um relógio, os russos podem preparar ataques das 10h às 7h.
Ben Barry, do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS, na sigla em inglês) e ex-brigadeiro do exército britânico, diz que é uma "posição muito difícil para quem está na defesa".
Além disso, a Ucrânia está sendo ameaçada em várias direções e suas forças estão "distribuídas de maneira muito escassa", afirma Jack Watling, do RUSI.
O domínio da Rússia no ar
Mas a verdadeira disparidade entre as forças russas e ucranianas está no céu.
A Ucrânia tem 105 aviões de combate na fronteira, contra 300 da Rússia, diz Watling. Os russos, ele prevê, "vão obter muito rapidamente superioridade aérea".
Os sistemas avançados de defesa aérea da Rússia, como os mísseis S-400, também oferecem vantagem às suas forças. Em contrapartida, a Ucrânia tem defesas aéreas mais antigas e mais limitadas.
Watling cita o exemplo de Israel, capaz de se defender de várias direções. Mas ele acrescenta que o país só foi capaz disso por causa de sua superioridade no ar — algo que a Ucrânia simplesmente não tem.
Moscou desenvolveu sua própria versão da tática de "choque e terror", com uma artilharia aérea integrada de mísseis e foguetes de longo alcance, explica Ben Barry. Isso permite que os russos ataquem de longe os centros de comando e controle da Ucrânia, depósitos de munição, força aérea e defesas aéreas.
Isso já parece ter começado, com ataques de mísseis de cruzeiro a alvos perto da capital Kiev.
Watling afirma que os russos têm um arsenal bastante significativo de armas modernas e recursos para os quais a Ucrânia não tem uma resposta — como o sistema Iskander de mísseis balísticos e de cruzeiro.
A Ucrânia recebeu recentemente suprimentos de "ajuda letal" dos EUA e do Reino Unido, mas são principalmente mísseis ar-ar (disparados de uma aeronave com o propósito de destruir outra aeronave) de curto alcance e armas antitanque.
Em suma, a Rússia tem mais armas e supera a Ucrânia.
Com a superioridade aérea e as armas de longo alcance da Rússia, o risco para as forças ucranianas é que em breve serão imobilizadas.
As forças da Ucrânia podem ser impedidas de manobrar e se reposicionar para enfrentar o avanço russo de qualquer outra direção, acredita Watling.
Muitas das unidades mais bem treinadas e equipadas da Ucrânia estão no leste do país — perto da linha de controle em Luhansk e Donetsk —, onde há combates desde 2014.
Autoridades de inteligência de outros países disseram à BBC que há uma preocupação real de que a Rússia possa tentar cercá-las.
No entanto, as forças armadas da Ucrânia estão mais bem treinadas e equipadas do que quando a Rússia invadiu a Crimeia.
Barry diz que as unidades e soldados ganharam uma experiência de combate útil na luta com separatistas apoiados pela Rússia no leste do país.
Mas ele acrescenta que eles estiveram envolvidos sobretudo numa guerra de trincheiras linear, e as demandas da "guerra de manobra" serão muito mais difíceis.
As forças da Rússia são capazes de se mover rapidamente com lançadores móveis de foguetes e mísseis e defesas aéreas. As tropas russas também foram reforçadas por combates desde a invasão da Crimeia e da Síria.
Luta urbana
Se os combates entrarem nas cidades e vilas da Ucrânia, isso pode dar uma chance às forças ucranianas.
Um defensor bem preparado pode tornar a luta urbana difícil e sangrenta para qualquer atacante — como foi mostrado em Stalingrado, na Segunda Guerra Mundial, e mais recentemente em Mossul, no Iraque.
Ben Barry acredita que as forças russas podem inicialmente tentar evitar vilas e cidades.
Mas ele diz que é muito improvável que os russos consigam evitar o combate urbano, principalmente em Kiev, devido ao seu significado político.
Jack Watling afirma que se a Ucrânia conseguir defender suas cidades adequadamente, elas podem ser capazes de resistir por muito tempo.
Armas antitanque leves fornecidas pelos britânicos (também conhecidas como NLAWs) podem ajudar em combates corpo a corpo, em que as forças ucranianas podem se movimentar usando a cobertura de edifícios. Um número indeterminado de civis também pode pegar em armas.
A Rússia não pode confiar apenas em ataques aéreos e artilharia para controlar vilas e cidades.
Mas Watling diz que a Rússia já tem agentes e operadores em solo. E, segundo ele, "haverá subversão e operações não convencionais em Kiev para tentar desestabilizar o governo".
A Rússia, acrescenta ele, também vai tentar cercar cidades e usar artilharia de longo alcance para atingir redutos de resistência e, em seguida, tentar usar agentes e forças especiais para "essencialmente assassinar líderes da sociedade civil".
A Ucrânia está agora lutando por sua sobrevivência.
O país combateu forças apoiadas pela Rússia no leste nos últimos oito anos, mas a ameaça agora é existencial para toda a nação.
Tendo acabado de visitar a Ucrânia, Watling diz que há uma "determinação sombria de sobreviver como país, mas há o reconhecimento de que estão em desvantagem e que será extremamente sangrento".
BBC Brasil