Daniel Carvalho
Folha
Em conversa gravada com o senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) na noite de sábado, dia 10, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) chamou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) de “bosta” e afirmou que teria que “sair na porrada” com o autor do requerimento de criação da CPI da Covid-19.
“Se você [Kajuru] não participa [da CPI], vem a canalhada lá do Randolfe Rodrigues para participar e vai começar a encher o saco. Daí, vou ter que sair na porrada com um bosta desses”, afirmou Bolsonaro em áudio divulgado por Kajuru na manhã desta segunda-feira, dia 12, na Rádio Bandeirantes.
DIVULGAÇÃO DE CONVERSA – No domingo , dia 11, Kajuru havia divulgado gravação de uma conversa telefônica entre ele e Bolsonaro. No trecho que veio a público, Bolsonaro pedia ao senador que ampliasse o escopo da CPI para que atingisse também prefeitos e governadores.
Bolsonaro disse que, se os senadores não mudarem o escopo da CPI, ampliando para investigar as ações de governos regionais também, será investigado apenas o governo federal e seus aliados. Segundo ele, vão ouvir “só gente nossa” para produzir “relatório sacana”.
“Se não mudar a amplitude, a CPI vai simplesmente ouvir o Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana. Tem que fazer do limão uma limonada. Por enquanto, é um limão que tá aí. Dá para ser uma limonada”, disse ao senador.
CRÍTICA – Na manhã desta segunda-feira, ao conversar com apoiadores, Bolsonaro condenou o registro e a divulgação do diálogo, sugerindo que não sabia que estava sendo gravado. Kajuru, então, concedeu uma entrevista à Rádio Bandeirantes para explicar ao apresentador José Luiz Datena.
À rádio Kajuru disse ter avisado a Bolsonaro às 12h40 de domingo que, em 20 minutos, divulgaria o áudio da conversa. De acordo com o senador, todos sabem que ele grava conversas telefônicas e que já divulgou outros diálogos que teve com Bolsonaro.
Além disso, disse o senador, em nenhum momento o presidente pediu que ele não publicasse o áudio. “No caso do presidente Bolsonaro, eu avisei ontem [domingo], 12h40, ao ligar para ele para contar sobre o requerimento feito, que eu subscrevi, do senador Alessandro Vieira, nós dois somos do mesmo partido, o Cidadania. Que é exatamente o quê? É estender a CPI para governadores e prefeitos”, disse Kajuru.
DESABAFO – “Falei ‘presidente, vou colocar agora, uma hora da tarde, a nossa conversa, que vai ser importante’. Porque foi um desabafo dele. Então, eu considerei que aquilo, para mim, como várias vezes eu já conversei com ele e coloquei no ar falas dele, eu voltei a fazer isso porque para mim foi uma proteção a ele para mostrar ao Brasil inteiro que ele está se sentindo prejudicado e, repito, usou a palavra sacana porque realmente ele estava chateado”, afirmou o senador.Kajuru disse que, para proteger Bolsonaro, omitiu o ataque a Randolfe Rodrigues.
“A única parte da entrevista que não coloquei para protegê-lo, porque acho que foi desnecessário, foi quando ele ofendeu um senador e falou que ia para a porrada com este senador. Falei ‘presidente, calma, não é hora disso, presidente'”, relatou Kajuru.
Durante o programa, Datena mostrou a Kajuru a fala de Bolsonaro aos apoiadores, autorizando-o a divulgar toda a conversa. “Ele não está dizendo que eu menti. Ele está dizendo que eu não coloquei tudo o que ele falou. E ele sabe o que ele falou. Se ele quer que eu coloque, eu coloco”, afirmou, antes de pedir a um assessor que selecionasse o trecho para exibição.
BRIGA COM SENADORES – “Se ele deseja paz com a CPI, eu colocar no ar a parte do que ele falou, ele iria arrumar uma briga com todos os senadores. Agora, ele quer, ele vai ter”, disse Kajuru.
Até a publicação desta reportagem, o senador Randolfe Rodrigues não havia se manifestado. Filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaor (Republicanos-RJ) informou que irá representar contra Kajuru no Conselho de Ética do Senado.
###
O QUE BOLSONARO DISSE NO TELEFONEMA COM KAJURU
“Se mudar [o foco da CPI], [nota] 10 pra você, porque nós não temos nada a esconder.”
“Tem que mudar o objetivo da CPI. Ela tem que ser ampla. Aí você faz um excelente trabalho para o Brasil.”
“A CPI hoje é para investigar omissões do presidente Jair Bolsonaro, ponto final. Quer fazer uma investigação completa? Se não mudar o objetivo da CPI, ela vai vir só pra cima de mim.”
“O que precisa fazer pra ser uma CPI útil para o Brasil: mudar a amplitude dela. Bota governadores e prefeitos. Presidente da República, governadores e prefeitos.”
“Se não mudar [a amplitude], a CPI vai simplesmente ouvir o Pazuello, ouvir gente nossa, para fazer um relatório sacana.”
“A gente fica fazendo do limão uma limonada. Por enquanto, é um limão que tá aí. Dá para ser uma limonada. Acho que você já fez alguma coisa, tem que peticionar o Supremo pra botar em pauta o impeachment também [dos ministros do Supremo].”
“Nós estamos afinados, nós dois. É CPI ampla e investigar ministro do Supremo. Dez para você.”
“Sabe o que eu acho que vai acontecer? O que vai acontecer eles vão [inaudível] tudo. Não tem CPI não tem investigação de ministro do Supremo. Eu sou a favor de colocar tudo pra frente.”
“O que está em voga hoje em dia é que eu fui gravado numa conversa telefônica, a que ponto chegamos no Brasil aqui. Gravado”, disse Bolsonaro, segundo imagens divulgadas na internet por um apoiador.
“Não é vazar. É te gravar. A gravação é só com autorização judicial. Agora, gravar o presidente e divulgar. E outra, só para controle, falei mais coisas naquela conversa lá. Pode divulgar tudo da minha parte, tá?”, complementou o presidente na porta do Palácio da Alvorada.