O livro-caixa, com quase 80 páginas, é um roteiro de pagamentos "por fora" que teriam sido realizados durante os dois mandatos de Zeca, avalia o Ministério Público. Os promotores sustentam que o diário apreendido representa "forte indício" da existência de um mensalão nos moldes daquele que o PT promoveu na esfera federal, descoberto em 2005, e que a CPI dos Correios desmontou.
O dinheiro do mensalão de Zeca teria origem em desvios na área de publicidade, presumem os promotores. Ainda segundo as investigações, o rombo pode ter atingido R$ 30 milhões. A devassa mostra também que transações com agências de publicidade abriram caminho para "grandioso esquema de corrupção". Os promotores alegam que o governo contratava as agências, que nem sequer realizavam os serviços.
A contabilidade era feita com notas fiscais frias. Uma gráfica, a Sergrapf, cobrava entre 12% e 17% do valor de nota. Desse montante, 15% ficava com a agência e o restante voltava ao governo para a distribuição "a servidores públicos envolvidos no ilícito".
As anotações manuscritas no livro-caixa apontam nomes ao lado de valores e das letras "PG". Um dos nomes que aparecem na lista é o do deputado estadual Ari Artuzzi (PMDB). São dois lançamentos que fazem referência ao parlamentar. Apesar de negar ter recebido propinas, ele admite que conhece Salete.
Na página 19 do livro são citados quatro vereadores de Campo Grande, cada um associado a R$ 5 mil. Na mesma página, abaixo das palavras "complementação/suprimento", aparece uma anotação: "Lista Brasília".
Balanço parcial revela pagamentos que podem ter somado R$ 584,44 mil em um único mês de 2005. Em outro trecho do volume surgem 14 nomes ligados a secretarias do Estado e autarquias. Pelo menos três coronéis aparecem com freqüência no caderno, assim como três letras maiúsculas: "MST".
A blitz na casa de Salete ocorreu em agosto. As despesas eram autorizadas por ela, asseguram os promotores, e pagas por ordem bancária às agências de publicidade. O objetivo seria dar aparência de legalidade às fases de execução da despesa pública - empenho, liquidação e pagamento.
"A conduta de José Orcírio feriu princípios essenciais da administração pública", acusam os promotores. Apresentado à Justiça na sexta, o caderno foi anexado pelos promotores aos autos das duas ações penais e das duas ações civis propostas contra o ex-governador. Na quinta, a promotoria mandou fazer perícia no livro e exames grafotécnicos.
"Entre janeiro de 2005 e dezembro de 2006, o governador José Orcírio Miranda dos Santos e o secretário de Coordenação-Geral de Governo, Raufi Antonio Jaccoud Marques, em estratagema gerado no âmbito desta secretaria, valeram-se reiteradamente dos contratos celebrados com as agências de publicidade para desviar recursos públicos por meio de notas frias apresentadas como serviços de impressão, reimpressão e criações diversas", afirmam os promotores.
Agências
O Ministério Público também diz ter encontrado documento com assinatura de Zeca, que autorizou pagamentos a agências de publicidade em 28 de dezembro de 2006, a três dias do encerramento de seu segundo mandato.
Nesse documento, que os promotores anexaram a uma das denúncias criminais contra Zeca, a então subsecretária de Comunicação Ivanete Leite Martins solicita à superintendente de Administração e Finanças, Rosely de Barros Lavarda Dallamico, a divisão dos números de programação de desembolsos (PDs) de 2006 "a pedido do Tesouro pela indisponibilidade de recurso financeiro para a quitação total das despesas".
Ivanete é testemunha-chave do Ministério Público. Apontada como elo do governo com empresários de publicidade, ela acusa o ex-governador de "participar diretamente" de reuniões para acertar comissões. O valor que Zeca liberou para três agências ao fim de sua gestão chegou a R$ 257,4 mil. Entre 2005 e 2006, ele mandou pagar R$ 122 milhões às agências que contratou.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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