Por: Sebastião Nery
BUENOS AIRES - O motorista que me levava anteontem, no meio da tarde, para o comitê de campanha (aqui eles chamam de ("bunker") da Cristina Kirchner, no hotel Interncontinental, para as bandas da 9 de Julho e da "Casa Rosada," um senhor elegante, bem vestido, paletó e gravata apesar do belo dia ensolarado, não tinha dúvida nenhuma sobre o resultado da eleição:
"Ela vai ganhar. Contra meu voto mas vai ganhar. Não voto em gente peronista. Vai ser a vitória do "vo-tox": muito voto e muito botox". Ria da própria piada, mas era um riso meio raiva, de escárnio. Mais escárnio do que raiva. Era assim que a UDN ria do PTB, que o PFL ri do PT.
A língua
Já era a terceira cena, mais ou menos igual, a que eu assistia desde a manhã. No café do hotel "Kempinski", na esquina da Alvear, ao lado da embaixada brasileira, dois grupos, em mesas separadas, falavam de coisas diferentes, turistas do interior comentando a cidade. Em uma das mesas, uma mulher folheava o jornal "El Clarim" e aparecia a foto, bem grande, da Cristina Kirchner, ao lado das fotos, também grandes, de outros candidatos.
Um mulher da outra mesa, sem falar uma palavra qualquer, abriu bem a boca, pôs para fora uma língua enorme, rosada e ficou assim até a dona do jornal perceber que ela estava botando a língua para a candidata Kirchner. Mais do que o escárnio do motorista, era raiva mesmo.
O jovem
A segunda foi no primeiro táxi que tomei, na porta do hotel, para ir a uma das deslumbrantes livrarias "El Ateneo", na avenida Santa Fé, exatamente comprar os últimos livros da campanha eleitoral e principalmente o da veterana e competente jornalista Olga Wornat: "Reina Cristina" (Planeta). Os melhores repórteres de uma cidade são sempre os taxistas. Vou logo puxando conversa. Mas percebi que o jovem motorista, cabelo bem negro, italianado, mudou de assunto quando perguntei pelas eleições. Insisti, reagiu:
"Desculpe o senhor, mas não falo de política, muito menos de eleição. Ao menos desta eleição. Já sei que o casal vai ganhar, que meus candidatos vão perder e não vai ser bom para a Argentina, porque os pelegos da CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) vão voltar a ter força e influência".
Os radicais
Resolvi tentar forçar a conversa, para ver até onde ia a ira dele:
- Quem são seus candidatos?- Os radicais, da UCR (União Cívica Radical), de Frondisi e Alfonsín, que se dividiram entre a "Gorda" Carrió e o professor e ex-ministro da Econonia, Lavanha. Qualquer um dos dois seria um bom presidente, organizando a economia, sem o perigo de é essa dona Cristina jogar o país na desordem com os sindicalistas, o que não conseguiram fazer com o Kirchner, o que aliás foi o único mérito dele. Mas essa gente é sempre a mesma, vem desde Perón. Sobem os salários, esculhambam a economia e vem a inflação.
Tentei avançar o passo, lembrando que a Cristina só estava forte assim porque o marido Kirchner tirou o país do buraco em que Menem jogou e o pôs para crescer a 9% ao mês. Isso era ruim ou bom? Cortou o assunto:
- Por favor, não vamos falar de política. Mesmo acertando, são ruins. Eu me lembrei da UDN de Minas contra o PSD e o PTB.
Getulio e Perón
Aqui não há UDN, tambem não há PTB. Mas não há nada mais parecido com a velha UDN, mãe da Arena e avó do PFL, do que um radical argentino, igualzinho a um radical-liberal americano, europeu, brasileiro. E ninguém mais parecido com um getulista do que um peronista. Da mesma forma que o petista é um getulista ou peronista de roupa nova.
Ainda está cedo para uma análise mais funda das eleições daqui:
1 - Sem Perón nem Kirchner teria vencido em 2003 nem Cristina venceria agora. São netos dele. A espetacular vitória dela, agora, em quase todas as províncias, exceto cinco, é a continuidade da fidelidade do povo à memória de Perón. E para o povão Kirchner e ela são herdeiros dele.
2 - Só aí se explica que o radical Curió tenha tido a fantástica vitória na capital. (A capital, Buenos Aires, é pequena em território e em votos. A Província de Buenos Aires representa 40% da população e do eleitorado. Enquanto a Carrió ganhou folgado em Buenos Aires, capital, a Cristina teve, sozinha, mais de 45% de todos os votos da Província de Buenos Aires.
Cristina e Dilma
É só fazer o mapa social da capital e da província para ver que a capital é a Avenida Paulista, a Zona Sul do Rio, onde as elites sempre venceram. Enquanto isso, todo o grande cinturão industrial da Província de Buenos Aires, com seus trabalhadores sindicalizados e a CGT ainda liderando, votou fechado em Cristina, como quando votava em Perón. Em nome dos trabalhadores.
Com todas as diferenças históricas, de comportamento e de ação política entre o voto peronista e getulista e o voto petista, o povão votou na Cristina como no Brasil votou em Lula. Não creio é que em 2010 o PT arranje um candidato com a força, a determinação, a capacidade de comunicação, a clareza política e ideológica da Cristina Kirchner. Se a Dilma fosse ela...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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