Por: Carlos Chagas (Tribuna da Imprensa) BRASÍLIA - Parece não ter fim, e tomara que não tenha mesmo, esse festival de bondades encenado pelo presidente Lula nos últimos meses. O homem ainda não decidiu se disputará a reeleição, mas por via das dúvidas distribui benesses aos montes. O funcionalismo público não teve reajustes nos últimos anos, ou melhor, ganhou ridículo 0,1% de aumento. Agora, o governo anuncia fazer justiça àqueles que, na realidade, sustentam a administração federal. Aumentou o número dos milhões que recebem o bolsa-família. Nos acampamentos, sem exceção, os sem-terra passam a receber a cesta-básica, enquanto são criadas quotas para negros e índios nas universidades públicas. E a classe média? No reverso da medalha, os especuladores internacionais ficaram isentos do pagamento do Imposto de Renda na compra e venda de títulos da dívida pública brasileira. Os bancos recebem incentivos para continuar lucrando como nunca. Os grandes produtores rurais acabam de levar para casa um pacote que absorverá suas dívidas e garantirá preços e juros subsidiados em seus empréstimos. É uma festa, só por coincidência acoplada à campanha que não é campanha, pelo segundo mandato. Fica uma dúvida, entre as bondades distribuídas para as massas e para as elites: e a classe média? A classe média continua comendo o pão que o diabo amassou e abre os braços, aguardando sua vez, para saber o que lhe será destinado neste último ano do primeiro mandato. Afinal, o cidadão comum, aquele que paga impostos, permanece envolvido com os sucessivos aumentos de combustível, com a elevação permanente das taxas de serviços públicos, com a indizível carga tributária, com os planos de saúde em permanente ascensão de mensalidades e quantos sacrifícios a mais? Não pode o presidente Lula esquecer-se de que a classe média foi fator decisivo de sua eleição em 2002. Apoiado só nas massas, perdeu três vezes a disputa pelo Planalto, e se for confiar nas elites acabará voltando a São Bernardo. Ainda mais por conta dos escândalos do mensalão, a classe média refuga em repetir votos anteriores. Para sorte de Lula, a opção apresentada ao assalariado, de terno e gravata, não lhe inspira a menor confiança. Se em São Paulo Alckmin vai bem, no resto do País é um desastre. Ignora-se que planos os laboratórios eleitorais da Esplanada dos Ministérios preparam para a classe média, mas seria bom Lula preocupar-se em voltar suas atenções para ela. Crime organizado O Poder Judiciário parece sensibilizado pela sugestão que cresce no Congresso, a respeito da criação de Varas Especiais destinadas a julgar o crime organizado. A idéia é de que um ladrão de galinhas e um Marcola não podem continuar a ser processados da mesma forma, submetidos a idênticas posturas penais e beneficiados pelos mesmos recursos oferecidos pela lei. A diferença é muito grande e essas Varas Especiais tratariam desigualmente os desiguais. Mais rigor é claro para com bandidos de alto coturno, que movimentam centenas de milhões e influem na vida de milhares de cidadãos. Tomara que a proposta se concretize em tempo rápido. Claro que não vai dar para realizar-se antes do depoimento do Marcola à Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga o contrabando de armas, marcado para o próximo dia oito. De qualquer forma, os primeiros passos estão sendo dados, supervisionados pela nova presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Ellen Gracie. Por quê? Reconhece o deputado Raul Jungmann, do PPS de Pernambuco, ter sido prejudicial às instituições democráticas a adoção da reeleição. Não há como deixar de repousar sobre os ombros de Fernando Henrique os ônus da mudança, especialmente porque permitem aos governantes disputar o segundo mandato no exercício dos cargos, sem desincompatibilização. O problema, para Jungmann, é o farisaísmo dos atuais detentores do poder, que se valem das facilidades da reeleição para impulsionar a candidatura do presidente, mas não perdem oportunidade de criticá-la. Se concordam com as críticas e com a necessidade de a reeleição ser revista, por que não cuidaram de revogá-la nos últimos três anos? Seria o mais ético, até porque dispuseram de maioria parlamentar desde o primeiro dia do mandato de Lula. Não mudaram porque não quiseram. Porque pretenderam valer-se dos benefícios da reeleição. Que parem de fazer coro com os arrependidos de ter aprovado a matéria. |
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sexta-feira, junho 02, 2006
O festival de bondades
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