Luiz Vassallo e Gustavo Queiroz
Estadão
O Tribunal de Contas da União abriu investigação para apurar irregularidades na atuação da Agência Nacional de Petróleo, Gás e Combustíveis (ANP) em casos relacionados à partilha bilionária de royalties da exploração de petróleo entre municípios. A “fiscalização na modalidade inspeção” foi aberta a partir de um parecer da auditoria da Corte sobre uma reportagem do Estadão a respeito do uso de uma entidade sem fins lucrativos para intervir junto ao órgão e à Justiça e mudar a distribuição dos valores a estas cidades.
Em setembro do ano passado, a reportagem do Estadão mostrou que advogados usaram a Associação Nupec para firmar contratos sem licitação com municípios e representá-los junto à Justiça e à ANP com o fim de enquadrá-los na distribuição dos royalties devidos a prefeituras que abrigam polos ou são atingidas pela exploração de petróleo.
R$ 1,5 BILHÃO – Segundo levantamento da reportagem, ao menos 20 municípios haviam firmado contratos com a entidade e conseguiram liminares para receber dinheiro em casos que envolviam R$ 1,5 bilhão. Os contratos preveem honorários de 20% sobre esta cifra.
À Justiça, os advogados ligados à entidade questionam a distribuição dos royalties. Após obterem liminares favoráveis às prefeituras, eles buscavam diretores da ANP acompanhados de políticos do Rio, onde o órgão é sediado, para tentar acelerar a liberação das verbas.
Entre os associados da entidade está o advogado Vinícius Peixoto, que foi alvo da Operação Lava Jato por suspeita de lavagem de dinheiro de propinas de contratos da Usina Angra 3, e familiares de ministros do STJ e do STF. A ação contra Peixoto foi retirada da Justiça Criminal e repassada à Eleitoral em razão da conexão com supostos crimes eleitorais. Nesta vara caberá ao Ministério Público reformular a denúncia, o que não ocorreu até o momento.
QUADRO SOMBRIO – Após a reportagem, o subprocurador do MP junto ao TCU, Lucas Furtado, pediu a abertura da investigação. Ele afirma haver um “quadro sombrio de suspeitas que pesam sobre ações judiciais” e o “possível tráfico de influência junto a autoridades com poder decisório sobre a questão e atuação em desvio de finalidade de entidade sem fins lucrativos”. Ainda segundo Furtado, “não é de duvidar que possa se tratar de esquema orquestrado em nível mais amplo, desde a atuação da ANP”.
Após a representação, a auditoria da Corte analisou com mais profundidade o tema. Nesta etapa do processo, analisa-se se há materialidade, relevância e risco evidentes, além da competência para a Corte atuar.
Segundo o parecer, “caso haja irregularidades no âmbito da ANP relacionadas à distribuição de royalties do petróleo, cuja probabilidade de ocorrência não se afigura desprezível, a consequência poderá ser desde a ocorrência de elevadas injustiças na distribuição dos recursos entre entes federativos; custos de transação causado por judicializações; desvio de conduta de servidores públicos; e, se descobertos esquemas ilícitos, pode-se desencadear grave crise de confiança na Agência que regula o setor”.
IMPACTO SIGNIFICATIVO – De acordo com a auditoria, “consequências derivadas das alterações realizadas nos percentuais de distribuição desses royalties” teriam o poder de “causar impacto significativo e abrupto às receitas dos entes federados, com reflexo direto na vida dos munícipes”.
Quando uma decisão judicial interfere na partilha de royalties estipulada pela ANP, a agência dispõe de procuradores para correr às Cortes e pedir a suspensão destas ordens. Segundo a auditoria, é necessário analisar como a agência tem reagido a estas demandas jurídicas.
“De posse das informações e processos, será possível avaliar se há contradição entre os argumentos apresentados nas ações, se a Agência tem recorrido ou acatado as decisões”, diz.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – A questão é mais intrincada do que parece. Os advogados oferecem aumento dos royalties aos prefeitos e eles aceitam, é claro. E como esses advogados conseguem vitórias judiciais retumbantes, é preciso saber se estão subornando magistrados e também a própria Agência Nacional do Petróleo, para que seus procuradores não recorram ou façam corpo mole, como se dizia antigamente. Advogados que recebem R$ 300 milhões merecem ser investigados, mas nada acontece. No final, ficam como Adriana Ancelmo, a ex-mulher de Sérgio Cabral, que ficou alguns dias na cadeia e foi logo libertada, para usufruir do enriquecimento ilícito. São coisas do Brasil, digamos assim. (C.N.)