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quinta-feira, junho 09, 2022

Desempenho de Bolsonaro revela que o país precisa criar um partido popular de direita


Regras claras do governo de Bolsonaro. A charge de Frank Maia | Desacato

Charge do Frank Maia (Arquivo Google)

Pedro Doria

É cedo para afirmar que Jair Bolsonaro deixará a presidência da República quando o ano virar para 2023 — as urnas só fecham no segundo turno em 30 de outubro — mas este é o cenário mais provável. O bolsonarismo, porém, não vai acabar. Tanto Ipec quanto Datafolha identificaram que uns 30% dos brasileiros abraçam valores claramente de direita.

São ultraconservadores quando definem casamento, radicalmente contra o aborto, favoráveis à facilitação do acesso a armas, veem com simpatia o encontro entre religião e política. É uma peculiaridade desta nossa Terceira República, inaugurada pela Constituição de 1988, que jamais tenhamos tido um partido forte de direita. Mas isso não quer dizer que o eleitorado não exista.

EFEITO TRUMP – Nos últimos anos, justamente porque não havia um partido assim, estes brasileiros se congregaram no entorno de um líder populista e carismático. O que acontecerá quando Bolsonaro deixar o poder com estes seus eleitores?

Nos EUA, Donald Trump mantém poder político. Mas isso ocorre porque ele controla uma base fiel dentro do Partido Republicano. São pessoas que votam nas diversas eleições primárias, escolhendo candidatos alinhados com o ex-presidente.

Bolsonaro pode ser um líder popular, e é, mas não teve a capacidade de organização para erguer sua Aliança pelo Brasil. As redes sociais serão suficientes para ele se manter o líder deste eleitorado de direita? Esta é uma pergunta crucial.

BIPARTIDARISMO – Até a eleição de 2018, a Terceira República havia sido dominada por dois partidos que disputavam o Executivo — PT e PSDB — enquanto, no Parlamento, se alternavam com grandes bancadas também MDB e PFL-DEM, hoje União Brasil. A organização da Segunda República, antes do golpe de 1964, foi parecida, mas com uma diferença importante.

O período que começou após o Estado Novo foi marcado por três partidos. O PTB, liderado por Getúlio Vargas, depois João Goulart e Leonel Brizola, representava principalmente dois grupos da sociedade. Operários e funcionários públicos.

A UDN, por outro lado, era um partido particularmente ligado à classe média urbana e grupos conservadores no interior. Jogando por fora, o PSD formava uma teia de líderes políticos regionais.

SIMILITUDES – Por suas características, por quem representavam, os paralelos ficam logo evidentes. PT e PTB são partidos que claramente nasceram com os mesmos grupos na base. Também UDN e PSDB encontraram eleitores na classe média urbana assim como entre os mais conservadores do interior. E tanto MDB quando PFL-DEM-UB são partidos que, como o PSD daquele tempo, têm suas raízes nas oligarquias da Primeira República. Uma colcha de retalhos desses líderes regionais.

A comparação entre UDN e PSDB, porém, não é perfeita. Porque a UDN, apesar de no discurso antipopulista, na prática era diferente. A UDN era popular. No Rio de Janeiro, Carlos Lacerda levava multidões a comícios. Inflamava multidões. O partido apoiou Jânio Quadros à presidência — em seu tempo, um líder de massas.

Não é só isso. Durante os anos 1950, o apelido dos parlamentares udenistas era Banda de Música, e tinha motivo. Eram deputados que se sentavam na fila da frente no plenário e não perdiam a oportunidade de subir ao palco.

CHEIOS DE INDIGNAÇÃO – Curiosamente, o que tivemos de mais próximo da Banda de Música, nesta Terceira República, foi o PT dos anos 1990 no Congresso. Parlamentares hábeis, constantemente presentes nas tribunas em discursos cheios de indignação. Sempre dedicados a encontrar escândalos novos dos governantes que eram denunciados nos discursos, através dos extensos contatos com a imprensa ou em dossiês diversos.

Se ideologicamente eram muito distantes, no estilo, Afonso Arinos de Mello Franco e José Genoíno tinham muito a ver. E o PSDB nunca foi um partido popular, mobilizador de multidões e capaz de uma oposição aguerrida, como a UDN.

Depois, já em finais dos anos JK, uma nova geração mais pragmática, mais disposta a negociar por espaços no poder, assumiu a UDN. Era a turma da Bossa Nova, que teve em José Sarney um de seus nomes proeminentes. Foi a turma que abraçou com gosto o populismo à direita de Jânio. Mas era, também, um populismo que já estava ali presente nos discursos cheios de expressões como ‘mar de lama’ ou na verve agressiva e anti-getulista de Lacerda.

PÉ NA ACADEMIA – Como a UDN inicial, o PSDB tinha um pé importante na academia, nos corredores das universidades. Mas o PSDB nunca foi um partido popular, nunca teve líderes com grande apelo para multidões. E, mesmo na ação parlamentar, quando foi parar na oposição mostrou-se um partido tímido. Como se levantar escândalos do governo da vez fosse indigno.

Nunca houve um eleitorado tucano. Houve eleitores que votavam no PSDB, mas o PSDB polarizou com o PT por um acidente histórico. Porque calhou de ser o então ministro Fernando Henrique Cardoso quem levou, para o governo Itamar Franco, o plano de estabilização monetária de Pérsio Arida e André Lara Resende. O Real elegeu FHC por duas vezes, assim como botou José Serra, Geraldo Alckmin e Aécio Neves no segundo turno em quatro eleições.

O cientista político Cesar Zucco, professor da FGV e doutor pela UCLA, argumenta que em verdade, no Brasil, há petistas e antipetistas. O PT é um partido com base popular. Na ausência de um equivalente à direita, o que mobilizou emocionalmente eleitores do outro lado foi a aversão ao PT. A polarização entre petistas e tucanos, portanto, era pura miragem. O PSDB ocupou aquele lugar político como coringa. E nunca esteve, mesmo, plenamente confortável no papel de partido de direita.

NOVO LACERDISMO – Talvez o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, visse a Operação Lava Jato como uma luta contra o sistema político. Ou até, descrevendo com boa vontade, de limpeza do sistema político. Os eleitores de direita, não. Enxergaram, ali, uma forma moderna de lacerdismo. Era uma luta contra a esquerda. Uma nova bossa nova.

O lavajatismo mobilizou paixões como o PSDB nunca fez, mas era, ainda, um movimento acéfalo. Errático, com pouco carisma e nenhuma habilidade política, Sergio Moro não se viabilizou. Foi Jair Bolsonaro quem deu, para a direita brasileira, o que ela não tinha desde Jânio Quadros. Um líder popular.

Mas, àquela altura, este eleitorado já passara do lacerdismo para desembocar numa versão contemporânea de Plínio Salgado ou da Tradição, Família e Propriedade. De uma direita populista para uma extrema-direita populista.

PROCURA-SE UM PARTIDO – Sempre que encontra alguém disposto a ouvir, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (PSDB-RJ), bate num mesmo ponto: o Brasil precisa de um partido popular de direita. Tentou fazer isso dentro do DEM, hoje gostaria de fazê-lo no PSDB. Talvez nunca consiga. Mas ele tem razão.

Não teria havido golpe militar sem a colaboração da UDN. Desde o início o partido teve um braço golpista, fosse pelo brigadeiro Eduardo Gomes, por Lacerda, ou pelo governador mineiro José de Magalhães Pinto. Mas não precisava ter sido assim. Um partido popular de direita não precisa ser golpista. O que precisa é criar raízes na sociedade, ser combativo quando é oposição. Precisa emocionar. Porque política é, também, emoção.

Quando Jair Bolsonaro deixar o governo, seu eleitorado continuará na direita. Enquanto estes eleitores não tiverem um partido para chamar de seu, estarão à mercê de aventureiros carismáticos capazes de agrega-los. E aventureiros não combinam com democracia. Está na hora de aprendermos isso.

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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Excelente artigo do jornalista e escritor Pedro Dória, enviado por Duarte Bertolini. Uma excelente análise da política de Vargas para cá. (C.N.)

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