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terça-feira, julho 27, 2021

“Golpe legislativo” do Centrão impõe absurdos retrocessos no sistema político do país

Publicado em 27 de julho de 2021 por Tribuna da Internet

Bolsonaro como 'boneco' do Centrão

Charge do João Bosco (O Liberal)

Merval Pereira
O Globo

O escandaloso aumento do fundo eleitoral aprovado pelo Congresso a toque de caixa é apenas uma das facetas de um golpe legislativo que está em curso para mudar também o sistema eleitoral e aprovar a maior reforma política já feita desde a redemocratização. Tudo sem o debate público necessário, a fim de que as novas regras sejam aprovadas até o começo de outubro, para que entrem em vigor já na eleição geral de 2022.

O valor triplicado do Fundo Eleitoral, passando de R$ 2 bilhões para R$ 5,7 bilhões, deve ser judicializado no Supremo Tribunal Federal, pois dificilmente o presidente Bolsonaro terá condições de vetar o aumento, embora tenha interesses pessoais  nisso.

CENTRÃO NA JOGADA – PT e o PSL, partidos opositores de Bolsonaro, receberão cada cerca de R$ 600 milhões para a campanha. No entanto, esse aumento abusivo interessa também aos partidos do Centrão, hoje a base de apoio do governo.

Além do mais, há um problema técnico: o valor do Fundo Eleitoral foi definido por uma porcentagem da verba do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e se o presidente vetar o artigo, estará acabando com o Fundo, pois não é possível simplesmente passar a porcentagem de 25%, como aprovado, para outra qualquer.

Num momento de crise, é simplesmente inaceitável que os partidos políticos aumentem irrazoavelmente  o gasto eleitoral. Mas há mais. A mudança do sistema eleitoral foi apresentada pela deputada Renata Abreu a partir de uma proposta original de mudança constitucional do PSDB que tratava da mudança de datas em eleições próximas a feriados nacionais.

MUITAS MUDANÇAS – A relatora, advogada especializada em direito eleitoral, propôs uma série de mudanças, que abrange do sistema eleitoral à cláusula de barreiras e ao incentivo ao voto em mulheres, que valeriam o dobro para o cálculo do Fundo Eleitoral.

Até mesmo a democracia direta, com incentivo a plebiscitos municipais, é sugerida na reforma. O mais grave, no entanto, é a adoção do distritão, considerado pelo especialista Jairo Nicolau “o pior modelo eleitoral do mundo”. O sistema tem o poder de retirar da disputa os votos de legenda para favorecer os chamados puxadores de votos.

O temor é que os partidos escolham apenas os candidatos populares, como artistas, jogadores de futebol, jornalistas de rádio e televisão, em detrimento de candidatos de voto de opinião. Ou prefiram candidatos já eleitos com boa votação. Assim, a renovação política seria inviabilizada.

PIOR DO QUE ESTÁ – Os partidos perderiam também o controle programático, pois cada eleito teria sua própria representatividade, sem necessariamente coincidir com o programa partidário. O que já é ruim ficaria pior.

Há, concomitantemente, uma reforma eleitoral profunda que está sendo debatida em comissão que, segundo Marcelo Issa, cientista político que dirige a ONG Transparência Partidária, representa um retrocesso no nosso processo eleitoral, retirando da Justiça Eleitoral algumas de suas prerrogativas.

Ela admite que os partidos contratem empresas privadas para analisar suas contas e informá-las à Justiça Eleitoral, prevendo neste caso multa irrisória se houver a reprovação (art. 70); acaba com a divulgação de bens dos candidatos, que permite ao eleitor conhecer as empresas, propriedades e investimentos e evolução patrimonial dos candidatos (art. 209, §9º). Faz com que os gastos de campanha sejam conhecidos só após a eleição.

E MUITO MAIS – A proposta permite ao Congresso Nacional cassar resolução do TSE que considere exorbitar os limites e atribuições previstos em lei (art.130, §1º); exige comprovação de gastos para caracterizar propaganda eleitoral antecipada, afastando desse conceito algumas condutas que ocorrem, por exemplo, em igrejas, templos e similares (art. 504); restringe a aplicação de multa no caso de propaganda eleitoral negativa apenas aos casos em que ocorrer “acusações inverídicas graves e com emprego de gastos diretos”, (art. 507, §2º), podendo levar a um aumento dos discursos de ódio e ofensas pessoais durante as campanhas, e instituí o crime de caixa dois eleitoral, mas com pena máxima passível de acordo para não persecução penal (art. 893 e art. 28-A do CPP).

Uma reforma feita “pelos partidos, para os partidos”, como define Marcelo Issa.

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