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sábado, setembro 26, 2009

RECOMENDAÇÃO Nº 2 DA PROCURADORIA REGIONAL

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL EM SÃO PAULO
Av. Brig. Luís Antônio, 2.020, 4o andar, Bela Vista, São Paulo, SP, CEP 01318-911
Telefone: (11) 2192-8707 - www.presp.mpf.gov.br
RECOMENDAÇÃO Nº 2 DA PROCURADORIA REGIONAL
ELEITORAL AOS EXCELENTÍSSIMOS PROMOTORES ELEITORAIS
DO ESTADO DE SÃO PAULO.
“A Inconstitucionalidade do aumento retroativo do número de
vagas de vereador”
Recém aprovada proposta de emenda altera o artigo 29, IV, da
Constituição Federal e propicia o aumento do número de vereadores
nas Câmaras Municipais, embora estabelecendo freios para o
acréscimo de gastos. São estabelecidas vinte e quatro faixas de
população, com o correspondente número máximo de vereadores. A
estimativa é que sete mil novas cadeiras de vereança serão criadas.
O aumento do número de vereadores foi adotado em resposta às
Resoluções nº 21.702/04 e 21.803/04 do Tribunal Superior Eleitoral
que, interpretando o art. 29, IV, da Constituição, preservaram a regra
da proporcionalidade entre população e representantes legislativos
municipais. Até então, somente os valores máximos eram adotados
pelos municípios. Tivessem eles mil, ou novecentos e noventa e nove
mil habitantes, o número de vereadores seria o mesmo.
O texto aprovado da emenda dá eficácia “imediata” aos novos
limites, permitindo que as vagas passem a ser ocupadas desde já.
Trata-se, em verdade, de eficácia retroativa.
Essa eficácia é inconstitucional, porque desrespeita as regras do
jogo eleitoral tal qual estabelecidas anteriormente ao pleito de 2008.
Ofende-se gravemente a segurança jurídica e a democracia
representativa.
A segurança jurídica é ofendida porque norma posterior reverte
situação consolidada, desaplicando a regra da anualidade eleitoral, art.
16 da Constituição. Como o número de vagas em disputa é informação
essencial até para limitar a quantidade de candidatos que cada partido
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pode lançar, é elemento essencial do “processo eleitoral”, jungido à
referida anualidade.
O Supremo Tribunal Federal considerou o artigo 16 da
Constituição uma “cláusula pétrea”, por veicular uma garantia
individual do cidadão eleitor. O decisum se referiu à Emenda nº 52, de
2006, que permitia a “horizontalização” das coligações. O STF obstou a
aplicação do novo texto para as eleições de 2006, que seriam
realizadas a menos de um ano de sua promulgação (ADI 3.685, Rel.
Min. Ellen Gracie, julgamento em 22-3-06, DJ de 10-8-061).
Entendemos que a proteção do artigo 16 se estende não apenas
às mudanças feitas antes do pleito, mas também àquelas feitas
depois dele. É um ato jurídico perfeito com diferenciada proteção
constitucional.
A aplicar-se a nova emenda, ter-se-á a estranhíssima figura de
vereadores eleitos por voto popular, de acordo com as regras eleitorais
vigentes em 2008, convivendo com outros vereadores, que não
obtiveram êxito naquele certame, que ocuparão suas cadeiras por
força de emenda constitucional.
A questão foi anteriormente apresentada ao Tribunal Superior
Eleitoral, na Consulta nº 1.421-DF, Rel. Min. José Delgado, sessão de
19.06.2007, assim formulada: “uma Emenda à Constituição Federal
regulamentando o número de vereadores nas Câmaras Municipais,
entrando em vigor a menos de um ano da eleição municipal, seus
efeitos poderão ser aplicados na referida eleição municipal?”.
A resposta da Corte, embora restringindo o alcance protetivo do
artigo 16 da Constituição, foi de que: “a data-limite para a
aplicação da emenda em comento para as próximas eleições
municipais deve preceder o início do processo eleitoral, ou seja,
o prazo final de realização das convenções partidárias".
1 “...3. Todavia, a utilização da nova regra às eleições gerais que se realizarão a menos de sete meses colide
com o princípio da anterioridade eleitoral, disposto no art. 16 da CF, que busca evitar a utilização abusiva ou
casuística do processo legislativo como instrumento de manipulação e de deformação do processo eleitoral
(ADI 354, rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 12.02.93). 4. Enquanto o art. 150, III, b, da CF encerra garantia
individual do contribuinte (ADI 939, rel. Min. Sydney Sanches, DJ 18.03.94), o art. 16 representa garantia
individual do cidadão-eleitor, detentor originário do poder exercido pelos representantes eleitos e "a quem
assiste o direito de receber, do Estado, o necessário grau de segurança e de certeza jurídicas contra alterações
abruptas das regras inerentes à disputa eleitoral" (ADI 3.345, rel. Min. Celso de Mello). 5. Além de o referido
princípio conter, em si mesmo, elementos que o caracterizam como uma garantia fundamental oponível até
mesmo à atividade do legislador constituinte derivado, nos termos dos arts. 5º, § 2º, e 60, § 4º, IV, a burla ao
que contido no art. 16 ainda afronta os direitos individuais da segurança jurídica (CF, art. 5º, caput) e do
devido processo legal (CF, art. 5º, LIV). 6. A modificação no texto do art. 16 pela EC 4/93 em nada alterou
seu conteúdo principiológico fundamental. Tratou-se de mero aperfeiçoamento técnico levado a efeito para
facilitar a regulamentação do processo eleitoral. 7. Pedido que se julga procedente para dar interpretação
conforme no sentido de que a inovação trazida no art. 1º da EC 52/06 somente seja aplicada após decorrido
um ano da data de sua vigência.”
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A segunda ofensa se dá à democracia representativa. A emenda
permite que candidatos não-eleitos e, portanto, rejeitados de acordo
com as regras do pleito de 2008, passem a exercer a função de
representantes do povo. O espaço constitucional do voto direto,
secreto, universal e periódico é diminuído, desafiando a proibição do
art. 60, § 4º, II da Constituição.
É ofensivo à cláusula pétrea que a assunção de cargos de
representação seja feita por obra de outros representantes, exceto nas
hipóteses nas quais a Constituição autoriza a eleição indireta ou em
face da jurisdição constitucional eleitoral.
É disso que, ao fim, se trata: de uma eleição indireta, feita por
força de reforma constitucional. A propósito, não é correto dizer que os
suplentes de vereador foram eleitos: eles foram votados, mas não
venceram. Eles ostentam mera expectativa de direito.
A Emenda amplia o número de vereadores e silencia sobre o
modo de sua aplicação, pretendidamente imediata. Essa providência
dependerá do recalculo do quociente eleitoral e nova diplomação dos
eleitos.
A recomendação aos Exmos. Srs. Promotores de Justiça Eleitorais
é que ajuizem, no particular, se ocorrer a diplomação, os Recursos
Contra a Expedição do Diploma, art. 262 do Código Eleitoral, argüindo,
incidenter tantum a inconstitucionalidade da aplicação imediata da
nova Emenda.
Se, ao revés, simplesmente se der posse aos suplentes de
vereador, já anteriormente diplomados, cabível mandado de segurança
perante o Juízo Eleitoral, pois a matéria insere-se dentro da
competência da Justiça Eleitoral por referir-se aos critérios de
quociente eleitoral e elegibilidade.
São Paulo, 23 de Setembro de 2009
LUIZ CARLOS DOS SANTOS GONÇALVES
Procurador Regional Eleitoral de São Paulo

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