Opinião - Marcelo Campos Galuppo
O Instituto Vox Populi publicou em 29/8 o resultado de pesquisa encomendada pela UFMG sobre a percepção do brasileiro acerca da corrupção, na qual foram entrevistadas 2.421 pessoas entre 10 e 16 de maio. Ao que tudo indica, a reprovação da corrupção vem crescendo nos últimos tempos, à medida que a escolarização e a renda aumentam, como já indicou, há um ano, o livro de Alberto Carlos Almeida, A cabeça do brasileiro. No entanto, na nova pesquisa, dois resultados são surpreendentes: enquanto 86% dos entrevistados crêem que as operações da Polícia Federal (PF) ajudam no combate da corrupção e 81% dos entrevistados crêem que as ações do Poder Legislativo ajudam nesse combate, apenas 68% dos entrevistados crêem que as ações do Poder Judiciário ajudam no combate à corrupção. Em segundo lugar, enquanto 37% dos entrevistados crêem que, no combate à corrupção, a PF e o Legislativo têm agido às vezes fora da lei, 43% deles crêem que, no combate à corrupção, o Judiciário tem agido, às vezes, fora da lei. Portanto, a percepção geral é que o Judiciário é, das três instituições, a que menos contribui para o combate à corrupção e a que mais abusos pratica nesse combate. Isso é especialmente grave, à medida que, no Estado democrático de direito, é tarefa do Judiciário coibir os abusos praticados pelas outras duas instituições, sobretudo no que diz respeito à violação de direitos e garantias individuais.
Com relação à percepção da baixa contribuição do Judiciário, é provável que, quando o combate à corrupção se tornou midiático, tanto pela PF, com megaoperações com nomes risíveis, tendentes a causar impacto na população. Não raramente, de legalidade duvidosa, quanto pelo Legislativo, com transmissão em tempo real de comissões parlamentares de inquérito (CPIs), que, quase sempre, mostram parlamentares em atos de nítido desrespeito pelos depoentes, o Judiciário não tenha optado pela exposição pública do serviço que presta à sociedade. Inclusive porque, de outro modo, estaria violando princípios jurídicos inafastáveis, como a dignidade da pessoa humana e a presunção de inocência até prova em contrário.
Quanto aos abusos praticados pelo Judiciário no combate à corrupção, talvez o próprio ato de coibir o abuso das outras instituições, pela concessão de habeas corpus e de mandados de segurança, seja percebido, equivocadamente, como uma forma de abuso a direitos, não dos suspeitos, mas da sociedade como um todo. Isso certamente se deve à má compreensão do que é a corrupção no Estado de direito, que, como dizia Gianfranco Pasquino, deve ser avaliada em termos de legalidade e ilegalidade, e, não, de moralidade e imoralidade, sobretudo porque, em sociedades heterogêneas e pluralistas como a nossa, a definição do que é moral e imoral é muito mais variável do que a definição do que é legal ou ilegal.
O que deveríamos perguntar é se o Judiciário deveria ou não mudar sua forma de agir, dando maior publicidade, ou seja, expondo de modo mais explícito os suspeitos à execração pública. Tambémdeveríamos indagar é se o Judiciário deveria ou não funcionar como garantidor dos direitos individuais, inclusive de suspeitos das ações das outras instituições, que, ao fim e ao cabo, provou-se serem inocentes. Creio que a resposta a ambas as perguntas é, certamente, não. Mas a postura quase profética do Judiciário parece implicar um desgaste de sua imagem pública. Talvez seja esse o preço a pagar em uma sociedade em que, cada vez mais, o Judiciário vem perdendo importância frente às escutas telefônicas e aos interesses econômicos inescusáveis, e o Estado democrático de direito vem soçobrando frente às "exigências dos novos tempos".
Fonte: Estado de Minas (MG)
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