Por: ELIO GASPARI
Amanhã, Nosso Guia terá uma boa oportunidade para mostrar a injustiça que se faz à sua diplomacia acusando-a de antiamericanismo. Havia um certo antilulismo em Washington, e o "New York Times" o carimbava como "esquerdista", mas esses tempos passaram. Desde 2002, quando a embaixadora americana Donna Hrinak desfez as macumbas de um grupo de aloprados da Casa Branca contra o poder petista, os dois governos se entendem muito bem. De um lado, os americanos aprenderam a ouvir a parolagem de Lula. De outro, o aconselhamento brasileiro ajudou a travar algumas maluquices de Washington. Em cinco anos, Nosso Guia se meteu na disputa pela presidência da Organização Mundial do Comércio, ergueu a bandeira de um imposto supranacional para beneficiar países pobres, perseverou na busca de uma cadeira no Conselho de Segurança da ONU e tentou criar um Supermercosul. Colecionou insucessos. Na outra ponta, os americanos acharam que poderiam derrubar Hugo Chávez, impedir a eleição de Evo Morales e, quem sabe, ampliar sua presença militar na América do Sul com a base de Manta, no Equador, e o projeto de outra em Mariscal Estigarribia, no Paraguai. Colecionaram fracassos. Bush e Lula construíram um entendimento que ajudou a reduzir a tensão provocada por Chávez e por Morales. Mesmo um tema muito mais delicado, como o império do crime e da contravenção na Tríplice Fronteira, saiu da jurisdição de aloprados capazes de planejar uma intervenção militar na área. Lendo-se as revelações do repórter José Casado, que exibiu o plano de contingência do governo americano para invadir o pedaço em outubro de 2001, vê-se o tamanho do delírio da máquina militar de Bush. O antiamericanismo da nação petista e a diplomacia das canhoneiras da diáspora cubana de Miami tinham tudo para envenenar as relações do Brasil e dos Estados Unidos. O desastre não aconteceu. Sem alarido, Lula deu um passo histórico. Indicou o economista Paulo Nogueira Batista Jr. para uma diretoria do Fundo Monetário Internacional e mostrou que o Brasil se desonerou da função de mascote da diplomacia financeira americana, função que exerceu por quase meio século. Deveu-se à cabeça colonial da ekipekonômica a hostilidade brasileira ao calote argentino de 2005. Parecia uma causa perdida e tornou-se um êxito. Dessa crocodilagem resultou uma relação crispada entre o presidente Néstor Kirchner e Nosso Guia. A excepcional relação de FFHH com Bill Clinton salvou seu governo da bancarrota em 1998. Bush ainda não fez nada parecido por seu último amigo de infância. Nada indica que baixará as barreiras tarifárias que encarecem o etanol brasileiro no mercado americano. Mesmo assim, pela primeira vez em muitas décadas, uma grande iniciativa industrial brasileira evolui com a expressa simpatia do governo dos Estados Unidos. A idéia segundo a qual Lula pode se transformar num anti-Chávez é indigente, quase uma armadilha. Quando ele fizer isso, perderá o encanto. Os pelegos que tentaram fazer carreira como anti-Lulas se perderam no pó da História. Todas as vezes que o Brasil se meteu a fazer biscates para os americanos ficou no prejuízo. Como o presidente venezuelano não é bobo, na sexta-feira estará numa grande manifestação contra a visita de Bush. Onde? Em Buenos Aires. ELIO GASPARI é jornalista.
Fonte: O POVO
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