Por Paulo Roberto Sampaio
Durante meses os repasses do SUS para a Secretaria Municipal da Saúde giraram em torno dos R$ 28 milhões, segundo números levantados pelo senador César Borges, do PFL baiano. Gastos estabilizados em cima da média de atendimentos e, principalmente, de procedimentos classificados como de média complexidade como intervenções cirúrgicas e exames delicados como tomografia e outros. De repente, não mais que de repente, eles pularam mais de 50%, e exatamente no pré-eleitoral mês de setembro, atingindo a surpreendente marca dos RS$ 41 milhões, valores pagos entre outubro e novembro e que, forçosamente, passariam pelo crivo do zeloso funcionário municipal Neylton Souto Silveira, brutalmente morto no dia 6 de janeiro. Se o inesperado pulo e o recuo para patamares antigos no mês seguinte saltam aos seus olhos, imagine o que não deve ter provocado nos olhos do pobre do Neylton que, por certo, intrigado com o que acontecia, resolveu mexer onde não devia. E isso pode ter-lhe custado à vida, menos de 60 dias depois. Ou por ter descoberto ou por estar perto de descobrir. O criterioso levantamento de como o dinheiro público transitou pelos cofres da Secretaria de Saúde do Município e depois tomou rumos os mais variados foi feito pelo senador César Borges, do PFL, um ex-governador de estado e ex-secretário, e que por conta disso não deve ter motivos para se enganar no que diz. Ou no que apura, envolvendo contas públicas. Pois é, e até ele ficou surpreso com o que descobriu, tanto que ocupou horário nobre no plenário do Senado e ante colegas atônitos e incrédulos, sisudos homens públicos acostumados a ouvir de tudo, narrou tudo que apurou. São informações que ele considera oficiais, mas que ontem mesmo foram contestadas pelo secretário da Saúde do Município, Luís Eugênio Portela. Segundo ele, “o custo mensal do SUS em Salvador varia entre 17 e 19 milhões de reais e todos os dados estão disponíveis no site www.datasus.gov.br e pode ser conferido pela população. A secretaria nunca pagou e nem recebeu esse valor de 41 milhões, explicou o secretário. Para levar o assunto adiante e se certificar de que a descoberta pode ser um preciso indício que ligue as peças na misteriosa morte do servidor Neylton Souto Silveira, ontem mesmo conseguiu aprovar, no âmbito da Comissão de Fiscalização e Controle, um requerimento solicitando ao Tribunal de Contas da União a realização de auditoria na Secretaria Municipal de Saúde de Salvador, com o objetivo de verificar a legalidade, a legitimidade e a economicidade da aplicação dos recursos do Sistema Único de Saúde, SUS, nos anos de 2005 e 2006. Segundo o senador, as distorções no pagamento de recursos da gestão plena do SUS em Salvador são graves e podem estar ligadas ao assassinato do funcionário público. De acordo com a apuração da sua assessoria técnica, apresentada pelo senador em plenário, a prefeitura de Salvador pagou em setembro de 2006 uma conta 50% superior aos gastos médios da gestão plena, justamente às vésperas da eleição. A diferença paga a mais pela prefeitura em setembro significou um gasto atípico de mais de R$ 12 milhões, que desaparecem no mês seguinte, quando as transferências do SUS voltam a patamares normais. Para o senador, o fato tem que ser investigado pela Polícia Civil e por uma CPI na Assembléia Legislativa. Receoso de que por qualquer razão as ações sugeridas sejam obstacularizadas, ele aprovou no Senado requerimento para auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) nas contas do SUS de Salvador.
Gráficos apontam a variação dos números
; As distorções dos números foram tão gritantes que o senador César Borges resolveu fazer dois gráficos para mostrar com clareza a seus companheiros do Senado e ao Brasil como pequenos detalhes podem ajudar numa investigação, até porque, até aqui, a polícia baiana realmente tem evoluído no caso. Prendeu e aponta como autores da morte os dois seguranças que trabalhavam no prédio no dia e como mandantes, a subsecretária Aglaé Souza e a consultora Tânia Pedroso. Mas o que a Bahia cobra e a Tribuna tem, reiteradamente, insistido em esclarecer e continua sem resposta é: por que Neylton foi morto? Aos poucos a verdadeira motivação pode estar aparecendo. No discurso no qual apresentou gráficos com a evolução dos pagamentos ao longo de 2006 dos gastos gerais e dos gastos de média complexidade, referentes à gestão plena do SUS de Salvador, César Borges disse que o acréscimo é ainda mais estranho porque os gastos voltaram à normalidade depois. “Por que houve este acréscimo de recursos somente na véspera das eleições?”, perguntou. Seus gráficos mostram que o gasto de setembro destoa de todos os outros meses. Mão no queixo, encabulado, mas ao mesmo tempo convicto de que pode estar na pista certa, César diz que a descoberta é coerente com os fatos, “porque a própria polícia vê a motivação do crime como uma discordância de Neylton com a improbidade administrativa que estaria sendo praticada no âmbito da Secretaria Municipal da Saúde com recursos do SUS”. Extraído da edição da Tribuna da Bahia da última segunda feira, ele também leu um manifesto da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) contra a falta de resultado da investigação policial, “expressando a indignação de todos os baianos”. Preocupado em ser justo e não expor todo o organismo policial neste caso, como se a incompetência pudesse ser a causa do fracasso na busca da principal resposta, o porquê do crime, o senador disse que a policia baiana é competente, mas talvez enfrente pressões para não investigar. Ele também estranhou a ausência do governador do Estado, Jaques ??Wagner, durante todo o processo de investigação. “Neste período não assistimos a nenhuma providência ou qualquer manifestação de interesse por parte das autoridades, que se omitiram de dar aos baianos uma satisfação para um fato que choca a todos”, afirmou. E, ao desviar para a esfera política, o senador põe novos ingredientes no caso. De acordo com César, a lentidão das investigações conduz a suspeita de ligação política do crime, vez que a vítima era ligada ao gabinete do secretário municipal da Saúde, Luís Eugênio Portela, enquanto uma das acusadas trabalhou em Brasília também ligada ao PT. Para ele, “a boa notícia é que o Ministério Público está cumprindo seu dever”, ao denunciar os envolvidos na morte do servidor público.
Fonte: Tribuna da Bahia
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