Por: Villas-Bôas Corrêa
Villas-Bôas Corrêa
Uma curiosa iniciativa da Câmara dos Deputados, que passou quase desapercebida do distinto público e com escassa repercussão parlamentar resultou num dos mais significativos recados do eleitor, não apenas indignado, mas com a paciência no limite do estouro.
Trata-se de uma pesquisa sem nenhum rigor técnico, com 1.200 telefonemas sobre a credibilidade dos três poderes, além de outras entidades públicas.
A TV Câmara divulgou os resultados em noticiário de fim de noite. Registros discretos na mídia e reações de poucos deputados sepultaram o aviso que está a merecer um esforço de interpretação. Pois se não causa o espanto da novidade, cutuca no nervo exposto da crise moral e ética que assola os três poderes em doses diversas, mas que bradam a urgência de uma mobilização para acudir o desastre antes que seja tarde.
A repetida afirmação categórica de que atravessamos uma fase de inabalável consolidação do regime democrático, com as instituições funcionando com a regularidade de um relógio é uma dessas tolices dos que não querem enxergar a necessidade de urgentes corretivos, sempre adiados na prometida reforma política.
Como fechar os olhos na cegueira da fuga, diante do grito da pesquisa que empilha nos primeiros degraus da estima e confiança da sociedade, as Forças Armadas, a Igreja, a imprensa, a seita do bispo Macedo, os Correios, o Corpo de Bombeiros e, na rabada, no desprezo decrescente, os fregueses do Legislativo: Senado, Câmara dos Deputados, assembléias legislativas, câmaras de vereadores e partidos políticos.
No mutirão das últimas semanas em clima de véspera de campanha eleitoral, alguns deputados manifestaram a sua irritação com o que consideram uma clamorosa injustiça da população que ignora a dedicação dos parlamentares, com extenuante carga de trabalho da semana de três dias úteis. E debita na má vontade da imprensa, sempre crítica e injusta, que só destaca os pequenos erros de suas excelências e não exalta o lado limpo e claro do que é aprovado em benefício do povo.
Sem perder tempo com lamúrias da intrujice, a crise ética do Congresso, que se alastra pelo Executivo e salpica no Judiciário – ora com saudável desempenho na correção de abusos do Legislativo – vem de longe, rola morro abaixo e precisa ser detida com a urgência do alarme.
O caiporismo castigou a série de desatinos, que inverteu a mão, depois da fase dourada que se inicia com a queda da ditadura do Estado Novo de Getúlio Vargas, em 45, e começa a virar o fio com a incompetência política e a ojerizas do governo do marechal-presidente Eurico Gaspar Dutra. O veto à candidatura natural do senador Nereu Ramos, pela copa e cozinha, abriu a cortina para a volta de Vargas, em 50, na crista da onda dos votos. Uma desforra pessoal e um erro político de dramáticas conseqüências.
O suicídio de Vargas, com o toque de genial jogada política liquidou com as remotas chances de um candidato udenista e garantiu a eleição de Juscelino Kubitscheck em 1955, depois da traumática deposição de Café Filho, o vice imposto pelo acordo com Ademar de Barros.
Até aqui, com os arranhões da pressão militar, o Congresso suportou os sacolejos da transição. Mas a mudança da capital para Brasília em construção, um canteiro de obras em que floresceu e ganhou viço a praga das mordomias, das vantagens, dos abusos que corroeram a popularidade o prestígio do Congresso.
A renúncia do embirutado Jânio Quadros abriu a porteira para os quase 21 anos da ditadura militar.
O resto fica para a próxima conversa.
Fonte: JB Online
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