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terça-feira, abril 11, 2023

Quatro anos depois, Brasil volta a Unasul, que Bolsonaro abandonou por birra ideológica


Decreto de Lula formaliza retorno do Brasil à Unasul | Economia | PEGN

Bolsonaro desprezou a união dos países sul-americanos

Bernardo Mello Franco
O Globo

Na noite em que Jair Bolsonaro foi eleito, Paulo Guedes deu uma amostra do que os novos ocupantes do poder pensavam sobre a América do Sul. Ele festejava a vitória num hotel da Barra da Tijuca, a poucos metros da casa do presidente eleito.

Ao ouvir uma pergunta sobre o Mercosul, o futuro ministro acusou o bloco de ser dominado por “inclinações bolivarianas”. Em seguida, engrossou com uma repórter do jornal argentino Clarín. “O Mercosul não será prioridade. Era isso que você queria ouvir?”.

ESVAZIAMENTO – Por birra ideológica, o bolsonarismo torpedeou décadas de esforços pela integração regional. Hostilizou países vizinhos, esvaziou a cooperação econômica e ressuscitou a velha política de alinhamento automático aos Estados Unidos.

Em abril de 2019, o capitão anunciou pelo Twitter que o Brasil sairia da União de Nações Sul-Americanas, a Unasul. Depois de quatro anos, o presidente Lula acaba de formalizar o retorno à entidade.

Apesar de terem muito em comum, os países da região levaram quase dois séculos para dividirem a mesma mesa. A primeira reunião dos 12 presidentes sul-americanos só aconteceu em 2000, por iniciativa de Fernando Henrique Cardoso.

CRIAÇÃO DA UNASUL – Oito anos depois, Lula assinaria o tratado de criação da Unasul. O subcontinente vivia uma maré de governos de centro-esquerda, mas a entidade estava longe de ser monolítica. Entre seus fundadores, figuravam o colombiano Alvaro Uribe e o paraguaio Nicanor Duarte.

Apesar da presença de conservadores, a direita brasileira estrilou. Olavo de Carvalho escreveu que a Unasul teria “poderes para impor o socialismo a todo o continente”. O guru do bolsonarismo morreu, mas seus delírios continuam na praça.

Nesta sexta, o deputado Kim Kataguiri definiu a Unasul como uma “associação de países de regimes socialistas, todos extremamente autoritários”. “Não se sabe se o órgão agirá como uma união soviética latina ou um fórum de ditadores do narcotráfico”, emendou o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança.

QUEM TEM MEDO? – Na última edição dos “Cadernos de Política Exterior”, a embaixadora Eugênia Barthelmess lançou a pergunta: “Quem tem medo da integração da América do Sul?”. A diplomata anotou que os 12 países da região têm PIB conjunto de US$ 3,6 trilhões. Unidos, representariam a quinta economia do mundo, atrás da Alemanha e à frente da Índia.

O potencial da cooperação não se limita à esfera comercial. Ao somar forças, os sul-americanos podem ampliar sua voz em negociações de temas como defesa, desenvolvimento, saúde e combate às mudanças climáticas. O Brasil é quem tem mais a ganhar com a atuação conjunta. O país concentra quase a metade do território, da população e da economia do subcontinente.

A Unasul tem defeitos a serem corrigidos, mas abandoná-la foi uma atitude contrária ao interesse nacional. Para a embaixadora Barthelmess, a medida significou uma “abdicação de liderança brasileira”. “Em nome de rancores cultivados na esfera da política doméstica, sacrificaram-se princípios tradicionais de política exterior do país”, resumiu.


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