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terça-feira, fevereiro 15, 2022

Crise na Ucrânia: O que os EUA podem esperar da Alemanha?




Mobilização de militares russos na fronteira da Ucrânia fez Casa Branca endurecer sua retórica. Qual poderia ser a contribuição da Alemanha? Oliver Sallet, correspondente da DW em Washington, analisa a situação.

Por Oliver Sallet

Um momento chamou a atenção na entrevista coletiva do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, ao lado do presidente americano, Joe Biden, na segunda-feira (07/02). Questionados sobre o gasoduto Nord Stream 2, entre a Rússia e a Alemanha, foi Biden, e não Scholz, quem deixou claro que o projeto seria encerrado se os russos invadissem a Ucrânia.

Enquanto isso, Scholz mantém as suas opções em aberto, embora ambos tenham enfatizado que a Alemanha e os Estados Unidos continuariam a planejar e tomar decisões de forma coordenada.

A mensagem dos dois líderes para o Kremlin foi que os Estados Unidos, a Alemanha e a Europa falam com uma só voz. Permanece, porém, a questão de o que os EUA podem realmente esperar da Alemanha em relação à crise na Ucrânia.

"Alemanha nunca foi uma parceira fácil"

Quando a Ucrânia recentemente pediu o fornecimento de armas para equipar melhor seu exército, que tem muito menos soldados que o da Rússia, em vez disso a ministra da Defesa alemã ofereceu 5 mil capacetes. A proposta foi ridicularizada e despertou preocupação nos EUA e em outros lugares.

Em vez de armas, a Alemanha quer contar com a diplomacia. Mas só isso não será suficiente, acredita a Casa Branca.

Uma coisa é clara. Historicamente, a Alemanha tem restrições sobre fornecer armas a regiões em crise. Isso não deveria surpreender os americanos, mas Washington tem pedido repetidamente a Berlim que adote uma política mais dura em relação à Rússia e à China. No entanto a Alemanha tem relutado, tanto sob a ex-líder Angela Merkel como agora com o atual chefe de governo, Olaf Scholz.

A relutância da Alemanha também tem a ver com seu sistema político, explica Constanze Stelzenmüller, especialista em política transatlântica do Brookings Institution, com sede em Washington. "A Alemanha nunca foi uma parceira fácil", afirmou.

E o fato de Scholz governar com uma coalizão inédita de três partidos, composta pelos partidos Social-Democrata (SPD), Verde e Liberal Democrático (FDP) não facilita as coisas. "É difícil explicar a quem vive em democracias presidenciais, como a França e os Estados Unidos, mas um chanceler federal alemão tem menos poder em comparação", acrescenta Stelzenmüller.

Sendo uma nação exportadora, a Alemanha é muito sensível aos mercados chinês e russo, especialmente quando se trata de produtos industriais. Sophia Besch, especialista alemã em política externa do think tank Atlantic Council, vê o país como uma voz influente na Europa, também quando se trata da crise na Ucrânia, e atribui o foco de Berlim na diplomacia aos seus interesses econômicos.

"O país sofreria com as sanções econômicas, caso chegue a esse ponto", aponta Besch, referindo-se às possíveis medidas contra o Kremlin e à forte ligação entre as economias alemã e russa. Além disso, a Alemanha tem na memória anos de mediação diplomática com a Rússia, incluindo as conversas e negociações do formato Normandia, em torno do acordo de Minsk.

Para EUA é mais fácil romper com a Rússia

Já a economia dos Estados Unidos é estruturada de forma diferente da economia alemã, e outras prioridades se aplicam. Para Biden, faz sentido pedir à Alemanha que seja mais dura com países como a China ou a Rússia. A Alemanha, por outro lado, depende desses mercados e é menos capaz de arcar com um conflito diplomático. Além disso, considerações históricas e morais moldaram a política externa alemã no pós-guerra.

Os EUA, e por extensão a Ucrânia, não podem contar com mais armas ou soldados da Alemanha. Os 350 soldados enviados para a Lituânia há apenas alguns dias foram apenas um esforço simbólico, assim como a promessa de 5 mil capacetes. Scholz viaja a Moscou nesta terça-feira para mais uma rodada de diplomacia com o presidente russo Vladimir Putin, mas há dúvidas em Washington se haverá algum resultado.

Quase diariamente, a CIA e o Pentágono advertem que um ataque russo é provavelmente iminente. Enquanto isso, no Congresso americano, a questão das sanções tem sido tema de um debate inflamado. O Partido Republicano preferiria impô-las agora, quer os soldados russos cruzem ou não a fronteira com a Ucrânia.

Ato de equilíbrio diplomático

O papel da Alemanha nesse conflito tornou-se uma questão fundamental de diplomacia ou dissuasão. Há esperança em ambos os lados do Atlântico de que se possa alcançar uma solução diplomática, talvez sob a forma de um renascimento do acordo de paz de Minsk de 2015, observa Besch.

Entretanto, o acordo é "notoriamente ambíguo, interpretado de forma diferente por todos os lados, e nunca foi totalmente implementado", acrescenta. Os sucessos diplomáticos da Alemanha e da França dependem da boa vontade da Rússia, e "isso é mais do que questionável no momento", disse.

Na perspectiva dos Estados Unidos, Putin só entende a linguagem da dissuasão. Isso inclui sanções econômicas e, se necessário, o fim do gasoduto Nord Stream 2.

Fiona Hill, ex-diretora-chefe para a Rússia e Europa no Conselho de Segurança Nacional dos EUA, descreveu a situação como uma "dança diplomática".

"É claro que há risco para o governo alemão de processos judiciais e todos os tipos de violações de contrato que possam se desdobrar de tudo isso", disse à DW, sugerindo ao governo americano que não coloque muita pressão sobre Berlim. "Durante a administração anterior [de Donald Trump], toda a pressão exercida sobre o governo alemão foi contraproducente."

Biden, segundo ela, está tentando deixar para a Alemanha decidir sobre o Nord Stream 2. "Mas o que nós realmente precisamos mostrar é unidade total. E acho que, de alguma forma, o chanceler Scholz precisará resolver esse impasse difícil", concluiu Hill.

Deutsche Welle

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