Exemplo da invasão ideológica em todos os campos: o presidente Joe Biden escolherá o próximo membro da Suprema Corte por critério de raça e gênero.
Por Victor Davis Hanson (foto), The Daily Signal
O que acabou com os impérios malignos da Alemanha nazista e da União Soviética comunista foram os dogmas falidos. A ideologia destruiu a liberdade de expressão. E arruinou a meritocracia e garantiu a imposição desigual da lei – abrindo caminho para coisas ainda piores.
A ideia nazista de uma raça ariana superior abrangia tudo, da física à engenharia bélica. Os comissários soviéticos fizeram o mesmo, subordinando o pensamento racional à pauta comunista. Nos dois sistemas, fanáticos se infiltraram nas universidades e escolas para institucionalizar a doutrinação.
A ideologia woke, embora ainda não letal, é parecida. Sua versão racial defende a ideia de que a raça e o gênero da vice-presidente e da próxima ministra da Suprema Corte se sobreporá a todas as demais variáveis.
Mas será que a atual vice-presidente e a futura ministra da Suprema Corte começaram a escolher seus médicos ou pilotos de avião de acordo com o mesmo critério de raça e sexo?
O que – a não ser a ideologia – explica o motivo para a rejeição ao nome da juíza afro-americana Janice Rogers Brown, em 2003 e 2005, não ter sido considerada racista ou sexista, enquanto a rejeição ao nome de uma afro-americana indicada por Biden seria?
Por que a maioria dos criminosos dos grupos Antifa e Black Lives Matter, que saquearam, destruíram e provocaram violência naqueles 120 dias do verão de 2020, não foram acusados nem levados a julgamento? Por que, por outro lado, os manifestantes do 6 de Janeiro ou os caminhoneiros canadenses atuais são tratados com uma agressividade desproporcional pela imprensa?
Se os mesmos manifestantes do 6 de Janeiro ostentassem cartazes do BLM ou bandeiras do movimento LBGT, será que estariam sujeitos a um ano na solitária e ainda sem acusação formal? Se os manifestantes criminosos e saqueadores do verão de 2020 usassem o boné MAGA, será que teriam sido soltos sem qualquer tipo de acusação?
O que teria acontecido se manifestantes conservadores tivessem criado uma “zona sem policiamento” em Seattle? Será que a política teria deixado os manifestantes em paz e a imprensa teria romantizado tal ilegalidade?
Um dos motivos para os lockdowns e a obrigatoriedade do uso de máscaras contra a Covid-19 teriam caído no descrédito foi o fato de serem ideias profundamente corrompidas pela ideologia.
Em junho de 2020, quando milhares de pessoas desafiaram as quarentenas – com o apoio de profissionais da saúde que dizia que a pauta justificava a violação dos decretos de isolamento –, milhões de norte-americanos perceberam que as medidas do governo tinham mais a ver com a política identitária do que com o objetivo de salvar vidas.
Ainda em 2020, que políticos criticaram os programas de vacinação e disseram que provavelmente não se imunizariam se essas vacinas tivessem o apoio do ex-presidente Donald Trump?
Se Trump é demonizado e chamado de destruidor da legitimidade das eleições, o que se pode dizer da beatificada Stacey Abrams? Ela perdeu as eleições na Geórgia por mais de 50 mil votos. Durante anos, contudo, ela afirmou que o sistema eleitoral era um jogo de cartas marcada e que as eleições eram ilegítimas.
Em 2000, quem questionou durante semanas a contagem de votos, apesar das muitas auditorias públicas e privadas que confirmavam a vitória de George W. Bush na Flórida?
Em 2004-2005 — pela segunda vez na história – quem questionou o voto do Colégio Eleitoral no Congresso? De que partido faziam parte os 31 deputados e um senador que pediram o voto legislativo, numa tentativa fracassada de reverter o resultado das eleições?
Em 2016, quem financiou uma campanha publicitária de semanas que estimulava os eleitores escolhidos a violarem seus deveres constitucionais, ignorarem os resultados das prévias estaduais e votarem em Hillary Clinton?
E quem, ainda em 2016, dizia que o oponente vitorioso tinha sido eleito ilegitimamente? Quem dizia que se juntaria à “resistência” para prejudicar a Presidência dele? Quem aconselhou Biden em 2020 a não aceitar o resultado da eleição se a perdesse?
Se fanáticos conservadores estivessem saqueando as lojas, sequestrando inocente nas grandes cidades e fazendo os homicídios aumentarem a níveis históricos, seria que a administração Biden estaria mobilizando as forças policiais para garantir a prisão dessas pessoas? Ou será que os procuradores continuariam ignorando a situação
Se cubanos anticomunistas estivessem entrando ilegalmente no país, eles seriam recebidos com flores, como acontece hoje com aqueles que vêm do México ou da América Central?
Se até 2024 um presidente republicano contasse com o apoio de um Congresso republicano, qual seria a reação aos conservadores que defendem o fim das obstruções legislativas? Ou a exigência de identificação na hora do voto? E se eles votassem para aumentar o número de juízes da Suprema Corte para 15 a fim de garantir seis indicações de uma Presidência e Congresso controlados por republicanos?
Quando a ideologia aplicada em lugares como a Cuba castrista, a antiga União Soviética e a atual Venezuela prejudica a aplicação da lei, destrói o papel do mérito para determinar a qualificação, silencia o discurso e usa a lei de forma desigual, a sociedade sofre.
Nessas distopias, uma hora ou outra as prateleiras ficam vazias, a moeda deixa de ter valor e os países empobrecem e retroagem ao caos. Esse é o futuro que nos aguarda?
O mais assustador é que a ideologia garante que esse caos seja tratado como um sucesso. Os críticos são demonizados e caçados. E a obsequiosa imprensa estatal garante ao povo que está tudo indo muito bem.
*Victor Davis Hanson é classicista e historiador na Hoover Institution da Universidade de Stanford.
Gazeta do Povo (PR)