Sede do Credit Suisse, em Zurique
Uma investigação global da mídia, chamada Suisse Secrets, revelou que o segundo maior banco da Suíça falhou em bloquear recursos ilícitos que passavam por contas mantidas por ditadores, criminosos e políticos corruptos.
O gigante do setor bancário Credit Suisse abriu, por muitos anos, contas para autocratas, traficantes de drogas, suspeitos de crimes de guerra e traficantes de seres humanos, segundo um consórcio global de veículos de imprensa noticiou neste domingo (20/02).
A investigação do Suisse Secrets, baseada em um grande volume de dados vazados por um informante para o jornal alemão Süddeutsche Zeitung (SZ), revela os titulares de 100 bilhões de francos suíços (R$ 558 bilhões) mantidos no banco suíço.
O SZ, as emissoras públicas alemãs NDR e WDR, o jornal britânico Guardian e o The New York Times são algumas das mais de 40 organizações de mídia envolvidas na investigação, que integra o projeto Organized Crime and Corruption Reporting Project (OCCRP).
O que a investigação Suisse Secrets descobriu?
Os veículos de comunicação analisaram os dados vazados de 30 mil clientes do Credit Suisse em todo o mundo.
As contas haviam sido abertas em algum momento desde a década de 1940 até a década passada. Mais de dois terços delas haviam sido abertas depois de 2000, e muitas existem até hoje.
Entre os correntistas descobertos, estão um traficante de pessoas condenado nas Filipinas, um chefe da bolsa de Hong Kong preso por suborno e um bilionário egípcio que ordenou o assassinato de sua namorada, uma libanesa estrela do pop.
Outros clientes incluem numerosos chefes de estado e de governo, ministros e agentes de inteligência, bem como oligarcas e empresários de reputação duvidosa, segundo a apuração.
'O ex-presidente armênio Armen Sarkissian é um dos vários políticos citados no Suisse Secrets'
O SZ informou que um ex-gerente da Siemens condenado por suborno em 2008 estava vinculado a seis contas. Em 2006, uma das contas do ex-gerente da Siemens tinha ativos no valor de mais de 54 milhões de francos suíços (atualmente cerca de R$ 300 milhões), uma quantia que o jornal afirma que não pode ser resultado de seu salário na Siemens.
O vazamento também revelou contas secretas mantidas pelo rei Abdullah II da Jordânia, pelo ex-vice-primeiro ministro do Iraque Ayad Allawi, pelo autocrata argelino Abdelaziz Bouteflika e pelo ex-presidente armênio Armeniano Armen Sarkissian.
Sarkissian renunciou ao cargo de presidente em janeiro, pouco depois que o SZ o contatou para perguntar sobre suas contas no Credit Suisse. Ele disse que havia fechado todas as contas antes de ser obrigado a declarar seus bens.
Banco falhou na checagem de clientes suspeitos
O vazamento aponta uma falha generalizada de diligência por parte do Credit Suisse na avaliação e rejeição de clientes suspeitos e que lidam com fundos ilegais.
O SZ informou que os fraudadores poderiam ter aberto ou mantido contas mesmo "se o banco pudesse ter conhecimento há muito tempo que estava lidando com criminosos".
Os repórteres falaram com vários ex-funcionários do banco, que descreveram uma "cultura corporativa altamente tóxica que incentivava a tomada de riscos para maximizar os lucros – e bônus", escreveu o OCCRP em seu site.
Ex-funcionários disseram que isso levou a uma cultura que aplicava regras diferentes para dois tipos de clientes: os ricos e os ultra-ricos.
O informante, cujo nome permanece em sigilo para os veículos de imprensa, descreveu o sigilo bancário suíço como "imoral".
"A alegação de proteger a privacidade financeira é apenas um disfarce para encobrir o vergonhoso papel dos bancos suíços como colaboradores dos evasores de impostos", disse o informante.
Credit Suisse rejeita acusações
O Credit Suisse negou veemente neste domingo as acusações, dizendo que a investigação é "baseada em informações incompletas, imprecisas ou seletivas retiradas do contexto, levando a interpretações tendenciosas da conduta comercial do banco".
O banco também disse que 90% das contas citadas já haviam sido fechadas.
Quanto às contas que permanecem ativas, o banco afirmou que "diligências apropriadas, revisões e outras medidas de controle foram tomadas de acordo com as nossas regras atuais".
O banco também disse que a lei o impede de comentar sobre "potenciais relacionamentos com clientes".
A Suíça tem sido há muito tempo um dos centros financeiros mais opacos do mundo. Mas o país tem procurado, nos últimos anos, deixar para trás sua imagem de paraíso para a evasão fiscal, lavagem de dinheiro e desvio de verbas públicas.
Os bancos suíços agora trocam informações sobre os titulares de contas com vários países, mas não com algumas das nações mais pobres e mais corruptas.
A investigação descobriu que um grande número de clientes nos dados do Suisse Secrets vem da Venezuela, Egito, Ucrânia e Tajiquistão.
O Credit Suisse esteve envolvido em dezenas de escândalos nas últimas duas décadas e pagou mais de 10 bilhões de dólares (R$ 51 bilhões) em multas.
Neste mês, ele se tornou o primeiro grande banco suíço a enfrentar acusações criminais de que teria ajudado um cartel de drogas búlgaro a lavar dinheiro. O Credit Suisse nega a acusação.
No mês passado, o banco perdeu o seu presidente, Antonio Horta-Osorio, após ele ter desrespeitado duas vezes regras sanitárias sobre a pandemia.
Deutsche Welle