José Eduardo Cardozo, Roberto Magalhães, Fernando Coruja, Ibsen Pinheiro. Por que um número grande de políticos tidos como sérios desiste da vida parlamentar?
Bancada dos desiludidos: Cardozo (foto), Roberto Magalhães e Fernando Coruja explicam por que desistiram do Parlamento |
Quando parlamentares com notório reconhecimento público não se sentem mais tentados a permanecer na política, é hora de repensar as estruturas políticas de uma sociedade. Um fenômeno crescente no país está fazendo com que deputados desistam de disputar as eleições deste ano. Esse fenômeno, tido com um desestímulo coletivo em relação à política, é causado por vários fatores, mas todos desembocam em insatisfações pessoais de parlamentares em relação às regras políticas vigentes.
Em entrevistas ao Congresso em Foco, três nomes de peso na política nacional – José Eduardo Cardozo (PT-SP), Roberto Magalhães (DEM-PE) e Fernando Coruja (PPS-SC) - apontaram os principais motivos que os levaram à aposentadoria parlamentar. Entre eles, estão as incoerentes regras eleitorais e a falta de vontade política para realizar uma concreta reforma política; a ditadura ilegítima das maiorias no Congresso, que impõe no Legislativo pretensões do Executivo; e os desgastes da imagem política na sociedade.
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“Cinquenta por cento dos atuais parlamentares não vão voltar. Os outros 50% vão aos tribunais por causa do financiamento de campanha. Não concordo com o atual sistema eleitoral. Estou fora”, disse o deputado Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), por meio de sua assessoria. O peemedebista também está entre os que já declararam que não irá se candidatar.
Até o dia 30 de junho, data limite para realização das convenções de partido que definem quem vai se candidatar para qual cargo, o número de parlamentares que devem deixar a política deve aumentar. O fenômeno da desilusão política tem atingido deputados e senadores de diversos partidos. Além dos já anunciados, outros três parlamentares sinalizam que também podem abrir mão da disputa: Ciro Gomes (PSB-CE), Nilson Mourão (PT-AC) e Nelson Proença (PPS).
“A quantidade de parlamentares que me disse que a minha posição tinha mexido com eles e que, se eles não tivessem hoje já se alinhando para as eleições, teriam tomado uma postura igual, foram muitos. Esse é um fenômeno que precisa ser analisado”, declarou o deputado José Eduardo Cardozo.
Reforma
O deputado petista afirma que, apesar de não disputar as eleições, continuará na política como dirigente do PT para defender que o partido “lute com unhas, garras e dentes por uma reforma política”. Exercendo seu segundo mandato como deputado federal, José Eduardo Cardozo aponta a falta de uma reforma política, os custos da campanha eleitoral, a dificuldade do Congresso em aprovar o financiamento público de campanha e a crença de que “todo o político é bandido” como os motivadores para sua saída.
“Quando você pensa que terá que enfrentar uma campanha caríssima, onde o que importa, muitas vezes, é o peso da máquina eleitoral e não da sua ideia e de seu programa, você se sente muito desestimulado. (...) Nosso sistema político gera uma relação estrutural promíscua entre doador e aquele que recebe e é a porta de entrada da corrupção. É uma máquina de moer boas intenções, que abate e desanima”, afirma o parlamentar.
A ditadura das maiorias no Congresso é apresentada também como uma das fortes motivações para abandonar a vida política legislativa. O líder do PPS, Fernando Coruja, afirma que existe no Brasil uma “capacidade muito grande dos Executivos no sentido de cooptar, não só no Congresso, mas também em assembléias legislativas e câmaras de vereadores”. O deputado Roberto Magalhães, que exerce a sua quarta legislatura, considera que há “uma ditadura de uma maioria ilegítima”.
“Uma coisa é o partido ter maioria e ganhar. Outra coisa é o presidente ou governador ganhar, não ter maioria, e, em função do poder que tem a dar, ele se transformar em majoritário dentro das câmaras e assembléias. (...) A maioria, seja convalidando o que vem do Planalto, ou convalidando em caso de acordo para votar a favor ou contra, vai legitimando o processo, fazendo com que a decisão pareça democrática, embora seja uma decisão de rolo compressor”, diz Magalhães.
Inútil
Questionamentos sobre o papel do Legislativo e o trabalho dos deputados também tem sido feito pelos parlamentares. Em seu terceiro mandato, Coruja afirma que está sentindo que o mandato de deputado “está um pouco inútil”. O parlamentar argumenta que a “representação parlamentar não é mais capaz de responder à sociedade” e que é “preciso achar outros mecanismos de representação”.
“Essa separação de poderes clássica e essa democracia representativa dá sinais de estar se esgotando. O poder político, de maneira geral, tem se tornado cada vez menos importante na sociedade. Deu-se muito espaço ao poder econômico, e as discussões dentro do Legislativo se resumem muito a discutir para onde vai o dinheiro. Aí, é uma discussão que começa a ter muitos interesses, e são interesses que não são populares”, resume Coruja.
A máxima de que “todo político é bandido” também é apresentada pelos deputados como um motivo de peso para abater os ânimos dos bons parlamentares. José Eduardo Cardozo considera essa generalização como “perversa”. Para Coruja, o político ser apresentado como “o grande vilão da sociedade” é um senso comum que enfraquece a capacidade de luta política.
“Claro que o que a população pensa tem uma referência de realidade. Mas, quando ela cai no senso comum, ela uniformiza e acaba fazendo com que a tua capacidade de luta enfraqueça. (...) Na medida em que você é político, o seu discurso vai ficando mais frágil. A sensação já carrega uma carga preconceituosa”, conclui Coruja.
Fonte: Congressoemfoco