Câmara abre guerra contra o STF e se recusa a cassar Carla Zambelli

Carla Zambelli está presa na Itália aguardando julgamento
Carolina Linhares
Folha
A Câmara dos Deputados salvou o mandato da bolsonarista Carla Zambelli (PL-SP), nesta quarta-feira (10), por 227 a 170 — era necessário haver maioria de 257 votos para cassá-la. A deputada está presa na Itália, para onde fugiu após ter sido condenada pelo STF (Supremo Tribunal Federal).
A decisão do plenário contrariou a votação de mais cedo na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania), que obteve maioria pela perda do mandato com a ajuda de deputados do centrão. Em 2022, Zambelli foi a deputada mulher mais votada e a terceira no ranking geral, com mais de 946 mil eleitores.
DE SURPRESA – Na terça (9), o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou, para surpresa dos líderes partidários, que pautaria o caso de Zambelli no plenário no dia seguinte. Ele também decidiu que, até o recesso na próxima semana, a Casa vai decidir sobre as cassações de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Alexandre Ramagem (PL-RJ), além da votação que suspendeu Glauber Braga (PSOL-RJ) também nesta quarta.
Zambelli foi condenada, em maio, à perda de mandato e a dez anos de prisão por invadir o sistema do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) com ajuda do hacker Walter Delgatti Neto, também condenado.
O plenário da Câmara deliberou a respeito da perda de mandato, seguindo o entendimento de Motta de que, de acordo com a Constituição, cabe ao Congresso a palavra final em caso de parlamentar condenado criminalmente. Motta havia dito inicialmente que a Mesa da Câmara homologaria a ordem do STF imediatamente, mas recuou após pressão do PL e mandou o caso para a CCJ em junho.
MEDIDA DRÁSTICA – Pesou a favor de Zambelli, assim como no caso de Glauber, o corporativismo dos deputados e a avaliação de que a cassação é uma medida drástica. Além disso, a votação se soma aos recados de insatisfação dos parlamentares em relação ao STF.
Adversários de Zambelli, por outro lado, lembraram, durante a votação, o episódio em que ela sacou e apontou uma arma para um homem na véspera do segundo turno das eleições de 2022, o que também lhe rendeu uma condenação.
Com a deputada ausente no plenário, sua defesa foi feita pelo advogado Fabio Pagnozzi, que disse que a deputada, mesmo absolvida da perda de mandato, renunciaria. “Zambelli foi muito clara: quando ela ganhasse aqui no plenário, ela pediria a renúncia, porque não quer incomodar seus colegas, ela só quer dignidade”, afirmou.
SEM PROVAS – “Ela não cometeu e nem ordenou invasão ao CNJ. […] A única prova que eles julgam ser prova é o depoimento de um hacker”, disse ainda o advogado. Segundo ele, uma decisão pela cassação abriria um precedente perigoso para os deputados que são alvos, segundo ele, de mais de cem ações no STF.
Durante a tarde, a deputada participou de forma remota da CCJ, e seu filho estava presente na comissão. “A justiça que eu peço hoje é a justiça para que o Parlamento continue sendo honrado. […] Eu fui a primeira pessoa que levantou a voz contra a ditadura do Supremo Tribunal Federal”, disse.
O deputado Diego Garcia (Republicanos-PR) —cujo relatório a favor da deputada foi derrotado na CCJ— argumentou que o processo contra Zambelli não garantiu ampla defesa, tem sinais de perseguição política e é mantido em sigilo. “Esta Casa não pode ser carimbadora de decisões do STF, esta Casa precisa zelar pelas suas prerrogativas”, completou.
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Este é o ponto. O Supremo, de repente, passou a se julgar acima dos demais poderes, fazendo condenações de caráter político e claramente exageradas. Agora, ganhou o troco, com a Câmara se recusando a cassar Zambelli, cujas provas eram fraquíssimas, porque não se pode confiar na palavra de um criminoso notório para condenar um representante do povo. É uma questão que se inclua nas salvaguardas da democracia, que precisamos de respeitos. (CN)