Dora Kramer
Folha
Eleição municipal atípica, a que termina agora, dá um sinal claro para a próxima, daqui a dois anos, coisa que normalmente não ocorria: duas das mais relevantes lideranças políticas no plano nacional não obtiveram vitórias significativas. Ou, por outra, tiveram derrotas eloquentes.
Isso não antecipa necessariamente o cenário de 2026, mas evidencia que o presidente Luiz Inácio da Silva (PT) e o antecessor Jair Bolsonaro (PL) não comandam o espetáculo da política na dimensão em que ambos acreditaram ou talvez ainda acreditem.
AMBOS PERDERAM – No cômputo geral dos resultados nas capitais, a aparência foi de prevalência de Bolsonaro, cujo partido elegeu quatro prefeitos contra apenas um do PT de Lula. No detalhe, porém, vê-se que ambos perderam, e muito em função de erros de cálculo sustentados em excesso de confiança nos respectivos tacos.
Lula já tivera uma ideia ruim quando impôs Dilma Rousseff em 2010 apostando numa volta fácil em 2014. Agora teve três más ideias: chamar a polarização à cena, confiar na transferência de votos e considerar a aliança com Marta Suplicy receita de sucesso.
O presidente gabaritou no equívoco: o eleitorado preferiu julgar gestões e Guilherme Boulos (PSOL) manteve o patamar de votos de 2020, quando não tinha dinheiro nem presidente na retaguarda. Além disso, houve o retraimento de Marta, que por impossibilidade de falar mal de Ricardo Nunes (MDB), de quem foi secretária de Relações Internacionais, não foi a debates de vices e recusou-se a dar entrevistas.
CHEIRO DE QUEIMADO – Bolsonaro perdeu para o próprio ego ao se confrontar com governadores e parlamentares de seu campo, comprovando-se mais uma vez desleal. Nesse quesito, também perdeu para Lula, que soube detectar o cheiro de queimado a tempo de se distanciar de embates com partidos aliados em Brasília.
O presidente levou em conta o dia de amanhã, mas seu antecessor preferiu combater ao sol e à chuva sem cacife robusto o suficiente para ganhar. Contratou desafetos na forma de potenciais adversários futuros.
Juntos no estrelato em 2022, Lula e Bolsonaro terminam 2024 unidos no infortúnio.