Paulo Celso PereiraO Globo
As críticas, públicas ou privadas, de vice-presidentes a iniciativas do governo não são incomuns. José Alencar foi um vice de lealdade exemplar ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso não o impediu, no entanto, de ter promovido uma cruzada contra as taxas de juros estabelecidas pelo Banco Central, então comandado por Henrique Meirelles com carta-branca do Planalto.
Em meio aos protestos de 2013, a então presidente Dilma Rousseff propôs que fosse criada uma Constituinte exclusiva para a realização da reforma política. A ideia não durou 24 horas. Foi abatida prontamente pelo vice Michel Temer. Ainda assim, no ano seguinte, ele foi novamente convidado para seguir na chapa presidencial de reeleição. A ruptura entre os dois, consagrada na famosa carta de Temer, só veio em 2015.
AMPLO CONFLITO – A novidade trazida pelas divergências entre o vice Hamilton Mourão e o presidente Jair Bolsonaro é o fato de elas serem parte de um amplo conflito aberto entre dois grandes grupos que sustentaram a vitória nas eleições de 2018. De um lado, a “direita alternativa”, que tem como foco o debate ideológico. Do outro, a ala militar, que busca a implantação de um governo conservador funcional.
A liderança do primeiro grupo, que tem em Olavo de Carvalho o mentor intelectual, vem justamente da família do presidente, que por consequência acaba sendo o principal propulsor desse debate. Neste fim de semana, Bolsonaro chegou a publicar um vídeo, depois apagado, com ataques do ideólogo aos militares.
Não é à toa que boa parte das polêmicas criadas por Bolsonaro desde que chegou ao Planalto surge nas redes sociais. Foi na internet que seu grupo conseguiu implantar a disputa ideológica que o levou à Presidência, insuflando, como segue fazendo, ataques aos principais nomes dos poderes Legislativo e Judiciário.
VISÃO PRAGMÁTICA – Mourão, por sua vez, é o principal representante no governo – até por ser o único eleito – da ala conservadora com uma visão pragmática. O foco do grupo, boa parte de origem militar, é uma gestão que alcance resultados práticos de melhoria econômica e social a partir de uma perspectiva de direita. Não à toa, uma preocupação central dos militares do Planalto é com o risco de o modelo de confronto permanente defendido pela ala ideológica levar ao fracasso do governo – com prováveis repercussões de longo prazo sobre a imagem das Forças Armadas.
Hamilton Mourão não faz o gênero de Marco Maciel, que tinha na conciliação e na discrição suas principais marcas como vice de Fernando Henrique Cardoso. A guerra zombeteira entre ele e Olavo de Carvalho é apenas a face pública desse embate em que ambos os lados tentam reforçar dia a dia suas diferenças.
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BOLSONARO CRITICA OS ATAQUES DE OLAVO A MOURÃO
O presidente Jair Bolsonaro criticou nesta segunda-feira (dia 22) por meio de nota os ataques do escritor Olavo de Carvalho ao vice-presidente Hamilton Mourão e ao ministro Santos Cruz, da Secretaria de Governo.
“O professor Olavo de Carvalho tem um papel considerável na exposição das ideias conservadores que se contrapuseram a mensagem anacrônica cultuada pela esquerda e que tanto mal fez ao nosso país. Entretanto suas recentes declarações contra integrantes dos poderes da República não contribuem para a unicidade de esforços e o consequente atingimento dos objetivos propostos pelo nosso projeto de governo, que visa ao fim e ao cargo o bem-estar da sociedade brasileira e o soerguimento do Brasil no contexto das nações”.