Carlos Chagas
Torna-se necessário um passo adiante na decisão do Supremo Tribunal Federal de manter o texto da Lei de Anistia de 1979, negando excluir do perdão os agentes públicos envolvidos em crimes de tortura. Afinal, essa exclusão só passou a valer depois da Constituição de 1988, constituindo princípio basilar de Direito que a lei só retroage para beneficiar, jamais para prejudicar.
Acresce que até crimes de homicídio prescrevem em vinte anos. O que não prescreve, porém, é a memória. Sendo assim, torna-se dever da sociedade identificar e divulgar o nome de agentes do estado envolvidos em práticas de tortura durante o regime militar, bem como as diversas formas de sua ação deletéria. E mais o nome dos torturados, se possível com seus depoimentos.
Da mesma forma, não há que restringir investigações e denúncias ao período dos generais-presidentes. Em quantas delegacias de polícia torturou-se antes e depois de a Nova República haver sido instaurada, já se vão mais de vinte anos?
Sem esquecer a tortura privada, aquela praticada por quantos não serviam nem servem ao poder público, como os terroristas, os bandidos ou os sicários a serviço do poder econômico. E seus mandantes e responsáveis, porque tanto no âmbito de grupos, associações e empresas urbanas, quanto em propriedades rurais, também se praticaram e praticam lesões aos direitos humanos.
O que vem acontecendo depois de 1990, ainda sob a guarda da lei, deve gerar punições, valendo até mesmo para a babá que, esta semana, foi flagrada maltratando um bebê de sete meses. O importante é não esquecer, não perdoar, e denunciar constitui dever de todos. Antes e depois da prescrição só revogada pela Constituição de 1988.
Numa palavra, a tortura é abominável e, mesmo se não for mais possível levar o torturador à barra dos tribunais, precisa ser exposta.
Cabe à Justiça, à imprensa, às associações de classe, aos sindicatos, às igrejas e demais forças sociais promover ampla investigação nacional, claro que preservada do denuncismo que sempre rondará essa atividade.
Dividendos duvidosos
Atribui-se ao presidente Lula o comentário de que o vice-presidente na chapa de Dilma Rousseff já é Michel Temer. Deveria precaver-se o presidente da Câmara, porque a contrapartida de sua sagração, para o governo, é o apoio maciço do PMDB à candidata. Como diversas seções do maior partido nacional não se decidiram, e algumas até já manifestaram apoio a José Serra, eis aí um arremedo de pretexto para a palavra do rei voltar atrás.
Que o presidente Lula gostaria de outra indicação, é incontestável. Que tentou solução diversa, também, fosse em torno de Henrique Meirelles ou de Hélio Costa. Houve até um momento em que a cúpula do PMDB tremeu, supondo que o palácio do Planalto inclinava-se por Ciro Gomes como vice de Dilma. Foi no momento em que a candidata cresceu demais nas pesquisas e o maior partido nacional parecia descartável.
Michel Temer, hoje, é o favorito, mas como a decisão final ficou para junho, tanto na indicação quanto na sua aceitação, é bom tomar cuidado.
Fonte: Tribuna da Imprensa