Informe mostra violações em 159 países; em 61, houve tortura sem punição. Entidade considera que brechas na justiça global causam sofrimento
G1/Globo.comA impunidade foi o tema principal abordado pelo relatório 2010 da ONG Anistia Internacional (AI), que realiza anualmente um levantamento sobre as condições dos direitos humanos ao redor do mundo. A entidade critica o fato de que, para muitas pessoas “a prestação de contas e justiça efetiva são um ideal distante, pois suas vidas continuaram sendo arruinadas pro repressão , violência e discriminação, jogos de poder e interesses políticos”. O informe foi realizado em 159 países e relata um estudo referente ao ano de 2009. Nele, organização se mostra otimista, destacando progressos em relação ao combate à impunidade contra crimes relacionados à violação de direitos humanos.
“Este informe retrata a coragem de um amplo movimento de direitos humanos formado por organizações e indivíduos que trabalham constantemente para fortalecer as leis internacionais e nacionais e que insistem para que elas sejam usadas para fazer justiça de verdade”, relata a AI em seu comunicado à imprensa. “Os governos devem assegurar que ninguém esteja acima da lei e que todos tenham acesso à Justiça para todas as violações de direitos humanos. Até que os governos parem de subordinar a justiça aos seus interesses políticos, o direito de viver sem medo e sem privações vai continuar fora do alcance da maioria da humanidade.”
- Saiba mais
- Lobo descarta repetir Zelaya e tentar reeleição em Honduras
- Alemão acusado de tráfico humano preso no México será enviado ao Brasil
- Ataque a bomba no sul da Tailândia deixa 2 mortos e 51 feridos
- Prefeito de Cancún é preso por suposta ligação com narcotráfico
- Relatório da Anistia Internacional critica violência policial no Brasil
Tim Cahill, porta-voz da entidade para o Brasil, explicou por que a impunidade foi abordada como o tema central de seu relatório este ano. “A mensagem central da Anistia neste ano é a necessidade de se criar uma responsabilização, uma prestação de contas por parte das pessoas que estão no poder. Acreditamos ser a melhor forma de controlar a implementação dos avanços das responsabilidades que os governos tem perante seus cidadãos.”
Em relação a punições de responsáveis por crimes hediondos contra a humanidade, a entidade considera ter havido avanços em 2009. Cahill destacou a condenação o presidente do Sudão, Omar Al Bashir, além de algumas decisões envolvendo a América Latina, que resultaram na condenação do ex-presidente peruano Alberto Fujimori e de militares da Argentina, Uruguai e Chile envolvidos em crimes de tortura durante o regime militar. “Nesse sentido, o Brasil está um passo atrás de seus vizinhos”, ressaltou o porta-voz.
Brechas
A Anistia Internacional disse em seu informe que os governos, através de políticas de poder, têm obstruído o progresso da justiça internacional e pediu a eles que prestem contas de suas próprias ações. “A repressão e a injustiça prosperam nos vácuos da justiça global, condenando milhões de pessoas a abusos, opressão e pobreza”, afirma o secretário-geral interino da AI, Claudio Cordone.
A ONG ressalta porém que essas brechas na justiça não devem ser atribuídas somente a indivíduos ou governos, mas grupos privados também - que agem em uma economia globalizada sem a prevalência de uma lei na mesma escala. “As empresas globais tem poder e influência cada vez maiores, mas raramente tem de prestar contas de suas ações (...) As desregulamentações , a necessidade de atrair investimentos estrangeiros e as cláusulas dos acordos de comércio e de investimentos são todos fatores que afrouxaram as proteções que a lei pode prover às pessoas afetadas pelas operações das corporações – sobretudo nos países em desenvolvimento.”
Entre os pontos positivos destacados pelo informe, está a restrição à pena de morte (abolida no Burundi e no Togo, suspensa no Japão e milhares condenações revertidas à prisão perpétua no Quênia). Destacou também avanços em relação à condição das mulheres em alguns países árabes e muitos casos isolados em países de todo o mundo.
Já os pontos negativos foram regionalizados. A África foi destacada como uma região propícia a despejos forçados em massa. A América Central por denúncias de violência contra mulheres, enquanto o extremo oriente asiático e Oceania por exploração, violência e abusos de imigrantes. A Europa, por sua vez, juntamente com a Ásia Central, foi criticada pelo aumento da xenofobia, racismo e intolerância. Já o Oriente Médio e o norte da África foram relacionados ao aumento da insegurança e da presença de grupos armados de cunho terrorista. O Brasil e o restante da América Latina também registraram abusos na violência provocada por forças de segurança.
Estatísticas
Segundo a entidade, houve impunidade em casos de tortura em pelo menos 61 países. No caso de torturas e maus tratos durante interrogatórios, esse número sobe para 111. Julgamentos considerados injustos tiveram abrigos em 55, enquanto prisioneiros de consciência estavam detidos em ao menos 48 países. Também foram analisadas as restrições à liberdade de expressão, ocorrida em 96 países segundo o relatório.
TPI
A entidade também cobra 81 dos países pesquisados por não ratificarem sua adesão ao Tribunal Penal Internacional (TPI), única corte internacional de caráter permanente - criada em 2002 e sediada em Haia, Holanda -, destinada ao julgamento de indivíduos. Entre esses países, destacou EUA, China Rússia, Turquia, Indonésia e Arábia Saudita. “Há uma expectativa de que nos próximos anos se torne inevitável a adesão de países como os EUA. Ao mesmo tempo, até os atuais signatários, como o Brasil, são muito lentos em fazer as reformas necessárias para encaixar suas legislações dentro das normas do TPI.”
Para o porta-voz, a relutância dos países em aderir ao tribunal existe pelo temor da prestação de contas. “É uma resistência clara em ter esse monitoramento, porque os governantes sabem que não conseguirão manter suas responsabilidades perante as garantias dos Direitos Humanos tanto em seu próprio país quanto internacionalmente. A única forma de acabar com essas extremas violações será quando tivermos uma Justiça transparente, na qual os responsáveis sejam condenados como devem”, afirmou.
Fonte: Gazeta do Povo