Carlos Chagas
A sabatina dos três principais candidatos presidenciais na Confederação Nacional da Indústria apenas confirmou a semelhança entre a atual campanha e aqueles armazéns de tempos atrás, nas cidades do interior, onde o freguês encontrava tudo o que quisesse. De fumo de rolo a açúcar, de sandálias a bananas, de tecidos a pregos, cadernos e lápis – não faltava nada a quem se debruçasse nos balcões.
Assim estão Dilma Rousseff, José Serra e Marina Silva nessa nova oportunidade de dirigir-se, em conjunto, a platéias específicas, como antes aos prefeitos municipais e agora aos barões da indústria. Falam tudo o que a platéia quer ouvir, despertando aplausos nas primeiras filas e ceticismo lá no fundo.
Ontem, cada qual por sua vez, o trio maravilhoso prometeu, com palavras distintas, menos impostos, juros mais baixos, limitação dos direitos sociais e das leis trabalhistas, reforma tributária, diminuição dos gastos do governo, redução do custo-Brasil, facilidades para as exportações e tudo o mais que a indústria reclama. Já havia sido assim junto aos prefeitos, que chegaram ao orgasmo cívico ouvindo promessas de descentralização, aumento dos repasses federais às prefeituras e participação nos lucros do pré-sal.
Quando os candidatos comparecerem a debates com as centrais sindicais, imaginem o que irão sustentar: mais direitos sociais, intangibilidade das leis trabalhistas, jornadas de trabalho reduzidas, participação no lucro das empresas, transporte, alimentação e vestuário subsidiado para os operários e sucedâneos.
Em suma, com todo o respeito, Dilma, Serra e Marina vendem para a sociedade o slogan “eu te engano e você gosta”. Depois, qualquer que seja o vencedor, a hora será das cobranças…
Em 15 dias, a guerra de papel
Quando oficialmente inaugurada, a Copa do Mundo irá ofuscar a sucessão presidencial. Claro que os candidatos continuarão nas pré-campanhas, mas sem despertar maiores atenções da população. Em dias de jogo do selecionado brasileiro, é bom que nem saiam á rua, exceção para freqüentar algum botequim onde haja televisão transmitindo diretamente da África do Sul.
Será o período da “guerra de papel”, onde para alimentar o noticiário político, Dilma, Serra e Marina produzirão textos, expedirão notas sobre assuntos variados e evitarão prever o resultado das partidas. Sem esquecer os e-mails, os blogs e os twitters que o usuário dos meios eletrônicos consultará nos intervalos das informações sobre o Dunga e seus pupilos.
Fica a experiência para o futuro: que tal, na reforma política sempre anunciada e jamais concretizada, incluir-se emenda constitucional desatrelando as eleições presidenciais das copas do mundo? Cinco anos de mandato para os futuros presidentes, sem direito à reeleição, bem que resolveria.
Apreensão petista
Mesmo sem passarem recibo, os companheiros estão preocupados com a hipótese de Aécio Neves aceitar tornar-se candidato a vice-presidente na chapa de José Serra. Seria um golpe na euforia dos partidários de Dilma Rousseff. Por isso, o PT mobiliza seus jornalistas para a produção diária de notícias contrárias à decisão que Aécio ainda não tomou, apesar das pressões tucanas sobre ele. No reverso da medalha, o PSDB estimula comentários a respeito dos resultados de uma união entre São Paulo e Minas, os dois maiores colégios eleitorais do país, em torno de Serra-Aécio. Essa novela entrará pelo mês de junho.
Força estranha
A matéria pertence a cientistas políticos e a sociólogos, mas é bom meter a colher na panela: que força estranha será essa impulsionando candidatos sem a menor chance de vitória a concorrer às eleições presidenciais?
Não se fala dos picaretas e dos vigaristas ávidos de quinze segundos de exposição nas telinhas, megalômanos sem a menor importância. Importa indagar por que, por exemplo, Marina Silva, pelo PV, e Plínio de Arruda Sampaio, pelo Psol, insistem em apresentar-se sabendo que nem por milagre seriam eleitos?
O leque contém opções diversas: a defesa de uma idéia ou de um programa, a possibilidade de participarem de debates com os demais concorrentes, com chance de superá-los na retórica e no conteúdo, a fidelidade a princípios tradicionais, a vontade de mesmo inutilmente demonstrar ao eleitorado o erro em que irá incorrer.
Tem sido assim no passado, continuará ser assim no futuro. São profundas as raízes dessa força estranha que expôs líderes como Ulysses Guimarães, Mário Covas, Aureliano Chaves, Ciro Gomes, o próprio Leonel Brizola, a correrem para a derrota inevitável. O problema é que Marina Silva fará falta, no Senado, e Plínio de Arruda Sampaio, na Câmara.
Fonte: Tribuna da Imprensa