Deputados denunciam abuso no uso de escutas autorizadas pela Justiça
Lenilde Pacheco
O trabalho da CPI dos Grampos da Câmara Federal ainda não acabou, mas os deputados que a integram já têm algumas convicções. A primeira delas é de que existe hoje no país uso abusivo das escutas telefônicas autorizadas judicialmente. A segunda refere-se à necessidade de serem estabelecidos critérios muito mais rigorosos para uso desse instrumento complementar ao trabalho de investigação. É o que irão recomendar os integrantes da CPI, antecipa o seu relator, o deputado baiano Nelson Pellegrino (PT). “O uso abusivo das escutas legais é uma distorção”, avalia o parlamentar petista.
Representantes de operadoras de telefonia fixa e móvel informaram à comissão que as empresas realizaram cerca de 409 mil escutas determinadas por ordem judicial em 2007, o que representa 0,23% de todos os telefones fixos e celulares do país. É a grampomania avançando, de forma descontrolada, em todos os estados brasileiros.
Para situar a gravidade da situação, Pellegrino cita dados de 2007, apresentados à CPI dos Grampos, indicando que, no Rio de Janeiro, somente a operadora Oi teve 3.642 linhas fixas interceptadas judicialmente; em Minas Gerais foram 2.940; em Pernambuco, 1.757, e na Bahia, 1.599. São números relativos ao trabalho de investigação conduzido pela Polícia Federal. O relator explicou que as demais operadoras não apresentaram os números por estado. Para Pellegrino, os números “demonstram que as escutas telefônicas, mesmo autorizadas judicialmente, têm sido realizadas de maneira indiscriminada”. “Está havendo, inclusive, uma inversão: primeiro grampeia, depois investiga”.
Interceptação - Segundo dados citados pelo relator da CPI, somente a TIM foi responsável pela interceptação de 235 mil telefones no ano passado, atendendo a decisões judiciais. A segunda foi a Vivo, que realizou 72.376 escutas legais. A Brasil Telecom, a Oi e a Claro foram responsáveis, cada uma, por cerca de 20 mil escutas autorizadas judicialmente.
Os representantes das companhias informaram ter havido um aumento de 10% ao ano nos pedidos de interceptação telefônica. “Isso demonstra claramente que estamos diante de um processo de banalização da escuta, que deveria ser uma medida excepcional, e não regra”, situou Nelson Pellegrino.
O uso excessivo das escutas autorizadas produz uma série de anomalias, reclama Pellegrino. A interceptação autorizada legalmente deveria ser feita por 15 dias e, se necessário, prorrogada por mais 15 dias. “Foi identificado até um caso de escuta feita, no Rio de Janeiro, por dois anos”, exemplificou. “É um verdadeiro Estado policial. Numa situação como essa não se investiga o fato, mas a vida da pessoa”.
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OAB defende normas
Ao opinar sobre o excesso de grampos autorizados pela Justiça, o presidente da secção baiana da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-BA), Saul Quadros, defendeu a fixação de novos critérios para a utilização de escuta telefônica na investigação criminal. Ele cita a Constituição para resguardar os direitos dos cidadãos brasileiros diante da verdadeira espionagem patrocinada com autorização judicial.
“O sigilo telefônico é assegurado constitucionalmente e deve ser violado somente em último caso, sob ordem judicial”, assinalou. “Sem esse rigor, passa a haver uso disseminado desse instrumento de prova”, declarou o presidente da OAB-BA.
Na avaliação de Saul Quadros, é necessário que cada pedido de quebra do sigilo telefônico seja cuidadosamente analisado em seus motivos: “É a única forma de pôr fim à farra dos grampos no país”, defende. A CPI segue analisando a fragilidade do sistema, a responsabilidade do Judiciário como poder concedente das autorizações de monitoramento, a rede de escritórios de detetives particulares que fazem da bisbilhotagem um meio de vida e o papel das operadoras de telefonia. O desafio é separar o grampo legal do clandestino e propor leis para regulamentar o setor. (LP)
Fonte: Correio da Bahia
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