Por: AUGUSTO NUNES
Por ter mentido, Richard Nixon foi forçado a deixar a Casa Branca, em 1974, antes que chegasse à metade do segundo inquilinato. As investigações em torno do Caso Watergate comprovaram que o presidente americano sabia, desde o prólogo da crise, de todas patifarias praticadas pelo bando de assessores a serviço do secretário da Justiça, John Mitchell. Nixon tentou redimir-se com a entrega das cabeças coroadas. Não funcionou. Teve de renunciar.
Por ter mentido, o presidente Bill Clinton quase abandonou a Casa Branca pela trilha Richard Nixon. Para o eleitorado americano, nenhum detalhe da aventura extraconjugal com Monica Lewinski foi tão chocante quanto saber que o presidente espancara a verdade para camuflar a perigosa intimidade. O romance, constatou Millôr Fernandes, transformaria por longos meses o homem mais poderoso do planeta no maior onanista do mundo: além da hostilidade de Hillary em casa, fora dali havia a vigilância generalizada. Mas foi a mentira que quase amputou o segundo mandato.
Para alívio dos americanos e do presidente que o Brasil elegeu, Luiz Inácio Lula da Silva não mora na Casa Branca, mas no Palácio da Alvorada. O eleitorado dos EUA não corre o risco de conviver com mais um desafeto da verdade. E o chefe de governo está longe dos rígidos cânones do puritanismo.
Como Nixon, Lula tem oferecido sem soluços pescoços da companheirada. Já rolaram cabeças que perseguiram o poder centímetros ao lado do guia: os ministros José Dirceu (''meu querido Zé'') e Antonio Palocci (''um grande irmão''), o ex-presidente do PT José Genoino (''pena que São Paulo não tenha escolhido o melhor candidato de todos os tempos'') ou Delúbio Soares (''poucos entendem tanto de dinheiro quanto ele''). Se for o preço para seguir no poder, presidirá sem choro outros sepultamentos.
Com uma exceção: o ''Japonês'', apelido usado por Lula para referir-se carinhosamente a Paulo Okamotto. Não pode sequer ter quebrado o sigilo bancário esse amigo que jura ter quitado espontaneamente, e com dinheiro do próprio bolso, a dívida do chefe.
A versão fez do presidente um refém da mentira.
Como nos velhos tempos
A sorte do governo Lula é lidar com uma oposição parlamentar bem mais tolerante que a bancada do PT em ação na Assembléia Legislativa de São Paulo. Nos últimos três anos, a turma subscreveu ou chancelou 67 pedidos de CPI. Como a bancada federal nos tempos de José Sarney, Fernando Collor ou FH.
Algumas dessas CPIs deveriam estar em funcionamento há muito tempo. É preciso investigar com urgência, por exemplo, tanto denúncias recentes - como as que tratam da esperta utilização de verbas publicitárias da Nossa Caixa - quanto outras mais idosas, quase sempre envolvendo licitações suspeitas. Mas seria mais fácil montá-las se fosse cancelados os pedidos rigorosamente cretinos.
As 67 CPIs ainda na gaveta incluem quatro destinadas a investigar o que é vagamente definido como ''danos ambientais''. Há a que quer devassar a ''exploração sexual''. Ou a que mira nos institutos de pesquisa de opinião, ''a começar pelo Ibope''.
O agora candidato à Presidência Geraldo Alckmin governou 1.500 dias sem uma única CPI a prejudicar-lhe o sono. A informação parece menos intrigante quando se esclarece que o PT paulista enxerga um escândalo por dia, e os deputados, a cada semana, pedem a abertura de uma comissão.
Como a bancada federal nos tempos em que brincava com estilingues
Fonte: JB Online
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