Com seu voluntarismo, Bolsonaro é o único responsável pelo retorno das greves do funcionalismo público federal
A retomada da greve do funcionalismo público tem tudo para causar confusão no País nas próximas semanas. A sociedade já teve uma amostra da força dos servidores no início do ano, quando a mobilização de auditores fiscais causou filas e transtorno na liberação de cargas em portos e fronteiras. No Banco Central (BC), o movimento vai afetar a publicação de praticamente todos os indicadores do órgão. Com exceção da ata do Comitê de Política Monetária (Copom), colegiado que define a taxa básica de juros da economia e que divulga os termos de sua decisão uma semana depois, o governo ficará no escuro a respeito de dados essenciais para nortear políticas públicas, como o Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), prévia do Produto Interno Bruto (PIB); a pesquisa Focus, termômetro das expectativas do mercado sobre indicadores macroeconômicos; e o fluxo cambial, que pode até afetar as cotações da moeda.
Agora, é a vez da Polícia Federal (PF), cuja insatisfação se tornou ameaça para a adoção de paralisações e a entrega dos cargos de chefia. A origem dessa bagunça generalizada tem nome e sobrenome: Jair Bolsonaro. É imprescindível lembrar como e quando começou o movimento grevista do funcionalismo. Foi no fim do ano passado, ainda na tramitação do Orçamento no Congresso, quando o governo pediu formalmente a reserva de recursos para a reestruturação das carreiras das forças de segurança federais, um eufemismo para um reajuste salarial para uma parte relevante da base de apoio do presidente.
O voluntarismo de Bolsonaro foi como pólvora para que o funcionalismo público cobrasse sua parte no quinhão de R$ 1,7 bilhão reservado na peça orçamentária. Para alguém que foi eleito pela maioria dos brasileiros após quase 30 anos de mandato como deputado federal, a inconsequência de Bolsonaro chega a ser surpreendente. Propostas para botar panos quentes no ânimo dos servidores passaram por um aumento no vale-alimentação a um reajuste linear de 5% para todos, ínfimo diante da inflação, mas quatro vezes maior que a verba aprovada.
A persistência no erro, porém, parece ser um traço intrínseco de Bolsonaro. Ele manteve a malfadada aposta ao prometer, no cercadinho do Palácio da Alvorada, simulacro do Brasil real no imaginário bolsonarista, dobrar o número de convocados nos concursos realizados pela Polícia Federal e pela Polícia Rodoviária Federal. O teatro, com direito a ordens por telefone para que subordinados cumprissem o determinado, não durou nem um dia, uma vez que o Orçamento não comporta mais estripulias de sua caneta destrambelhada. Serviu, porém, para dar ânimo extra aos grevistas, já que a retomada dos concursos é demanda generalizada entre as carreiras típicas de Estado. Ao menos até o início de julho, limite a partir do qual a concessão de benesses fica proibida por lei em razão do período eleitoral, o País tem tudo para viver dias de desordem e de escuridão estatística. A depender do resultado do pleito de outubro, a baderna pode se prolongar por mais quatro anos.
O Estado de São Paulo