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segunda-feira, outubro 04, 2021

Agressividade à esquerda - Editorial




Mesmo depois dos danos causados ao Brasil, Lula prega a irresponsabilidade fiscal e a cizânia, como se vê pelo comportamento de seus apoiadores

O bolsonarismo não respeita quem pensa de forma diferente. Quando era deputado federal, Jair Bolsonaro defendeu o fuzilamento de Fernando Henrique Cardoso. Na Presidência da República, continua na mesma rota de intolerância e violência. Não apenas utiliza o aparato estatal para perseguir adversários políticos, como suas milícias digitais promovem campanhas difamatórias na internet contra os que resistem aos intentos bolsonaristas.

Mas a violência e a agressividade na política não são exclusividade do bolsonarismo. As ameaças sofridas pela deputada Tabata Amaral, por ocasião de sua filiação ao PSB, recordam como parte da esquerda também é intolerante, desrespeitosa e agressiva. O ator José de Abreu, conhecido apoiador do PT, reproduziu em sua conta no Twitter mensagem que dizia: “Se eu encontro (a Tabata) na rua, soco até ser preso”.

A publicação gerou imediata repercussão, com inúmeras manifestações de solidariedade à deputada. No entanto, houve também por parte de alguns simpatizantes da esquerda a tentativa de relativizar a agressividade contra Tabata Amaral, mencionando como contraponto suas opções políticas. Ou seja, o princípio da dignidade humana, pedra basilar dos direitos humanos, não valeria sempre. A depender das escolhas políticas da vítima, nem toda violência ou intolerância seria abominável.

Além disso, a ignorância também está presente em setores da esquerda. Se é vergonhoso que Jair Bolsonaro fale, na Assembleia-Geral da ONU, que “estávamos à beira do socialismo”, várias manifestações de militantes de esquerda reproduzem obtusidades e preconceitos igualmente constrangedores.

“Não nos esqueçamos (de) que Tabata do Amaral estudou nos USA, apoiada por um bilhardário (sic) brasileiro. Ela se embebeu da ideologia destas duas fontes. Seria bom se voltasse às origens humildes de onde veio e aprender (sic) com o povo. Os olhos suplicantes das crianças pedindo comida a converteriam”, escreveu Leonardo Boff em sua conta no Twitter.

O post do conhecido teólogo, valendo-se do preconceito como arma política, também não é um caso isolado. Seu conteúdo remete ao constante discurso do PT, sempre carregado de imprecisões, simplismos e, não raro, do mais cabal negacionismo. 

A esquerda mostra-se muito arredia a qualquer comparação entre bolsonarismo e lulopetismo. Em sua ótica, haveria uma diferença radical quanto ao compromisso das duas forças políticas com a democracia, o que inviabilizaria, por princípio, qualquer possibilidade de cotejo entre elas. A realidade é um pouco mais embaraçosa, no entanto.

O apoio de Lula a regimes não democráticos, como o da Venezuela ou de Cuba, campeões de violações de direitos humanos em nome do “socialismo”, revela que sua defesa da democracia depende da plateia. Não se trata de uma convicção firme. Outros interesses podem condicioná-la, sem maiores rubores.

A defesa lulopetista da “regulação da mídia”, sob o argumento de que a imprensa persegue Lula, também contraria os fundamentos do Estado Democrático de Direito, sendo, portanto, tão constrangedora quanto a hostilidade bolsonarista à imprensa. Não cabe ao Estado determinar o que os cidadãos podem ou não saber.

Por fim, o lulopetismo e o bolsonarismo se equivalem no negacionismo. Bolsonaro, por exemplo, não reconhece que errou ao dificultar a aquisição de vacinas e continua pregando o uso da cloroquina no tratamento contra a covid, custando milhares de vidas de brasileiros, apenas para satisfazer os interesses eleitorais do bolsonarismo. Incapaz de enfrentar com responsabilidade a pandemia, Bolsonaro optou por negar sua gravidade, instaurando uma revoltante política de descaso com a vida da população.

Igualmente negacionista e repleta de interesses políticos é a recusa do PT em admitir seus erros na seara econômica, na conivência com a corrupção e com o mau uso do dinheiro público e na disseminação do ódio no País. Mesmo depois de todos os danos causados ao Brasil, Lula continua pregando a irresponsabilidade fiscal e a cizânia, como se vê pelo comportamento de seus apoiadores. A esquerda pode ser democrática e responsável – tudo o que o lulopetismo não é.

O Estado de São Paulo

Comunismo em xeque

 




Por Merval Pereira (foto)

O anúncio do governo de Cuba de que empresas privadas poderão operar na ilha, no que chamam de “atualização do socialismo”, traz de volta o debate sobre modelos de governo totalitários que tendem a adotar, na visão ocidental, um “capitalismo de Estado”. A Constituição de Cuba já diz que o socialismo é regime político “irrevogável”, o que representou uma mudança importante, pois anteriormente o socialismo era apenas uma etapa para o comunismo.

Também na China, embora, ao comemorar o centenário do Partido Comunista Chinês, seu Secretário-Geral e presidente da República Popular da China Xi Jinping tenha reforçado uma visão marxista, não há mais referência ao comunismo, o socialismo ganhando dimensão, mesmo à moda chinesa. A revista "Qiushi", veículo teórico do Partido Comunista da China, publicou sexta-feira artigo de Xi Jinping em que pede que o marxismo seja compreendido e praticado, reforçando assim a confiança no caminho socialista.

Ele já havia ressaltado, na abertura das comemorações do centenário do PCCh, o papel central que o partido ocupa na sociedade chinesa. "Dediquem tudo, até mesmo suas preciosas vidas, ao partido e ao povo". Éric Li, cientista social e empreendedor de risco na China, define bem: “China tem muitos problemas, mas o sistema chinês estado-partido tem provado a todos uma extraordinária habilidade em mudar. Na América, você pode mudar de partido político, mas não pode mudar a maneira política de ele agir. Já na China, você não pode mudar o partido, mas pode mudar a maneira política de ele atuar”.

“Nesses últimos anos a China tem sido administrada por esse único partido e, ainda assim, as mudanças têm sido extensas e amplas, possivelmente  maiores do que do que qualquer outro grande país. China é uma economia de mercado, mas não é um país capitalista. Não há jeito ou maneira de um grupo de bilionários controlar o comando das decisões politicas, como os bilionários americanos controlam os fazedores de politica dos partidos. Na China você tem uma economia vibrante, mas o capital não se sobrepõe às autoridades políticas. Capital não tem direitos eternos e entronizados. Na América, capital e juros se colocaram acima dos interesses na Nação americana. A autoridade política não pode auditar o poderio do capital, por isso América é um país capitalista, e a China não é.”

A crítica sobre o modelo chinês, que eles classificam de “meritocracia” e, no Ocidente, chamamos simplesmente de “ditadura”, está em discussão há muito na China, e ganha cada vez mais destaque à medida que o modelo ocidental de democracia representativa está em crise. A eleição de presidentes como Donald Trump nos Estados Unidos é usada para indicar que o modelo eleitoral é sujeito a distorções e corrupção, o que na China não aconteceria, pois os líderes, até chegarem ao topo do Comitê Central, passam por um longo processo de subida na hierarquia partidária, que seria uma seleção natural.

Xi Jinping projeta uma “Comunidade de Futuro Compartilhado para a Humanidade”, que seria fruto do Socialismo com Características Chinesas na Nova Era. No meu novo livro recém lançado, “Desafios da Democracia”, da editora Topbooks, há relatos de seminários de que participei na China nos últimos anos que debatem o chamado “modelo chinês”, que não seria simplesmente um "capitalismo de Estado" como comumente é conhecido no Ocidente, mas uma organização social que lida com valores específicos.

Até o momento o modelo chinês não leva em conta "valores universais" tais como liberdade, direitos humanos, democracia, fraternidade, mas lida com "valores fundamentais" como estabilidade, harmonia e desenvolvimento. Por isso que, no 72º aniversário da República Popular da China, o controle das grandes empresas tecnológicas, como exemplo o grupo Ali Baba, e outras big techs, tem sido perseguido pelo governo central, para deixar claro que o controle é do Estado, através do PCChc, e que a disfunção do capitalismo na distribuição de rendas não será tolerada.  

O Globo

A punição depois da CPI da Covid - Editorial




Não é trivial a coleção de fatos apurados pela CPI da Covid. Não se trata, como no passado, apenas de investigar corrupção, enfraquecer adversários e aproveitar os holofotes — embora tais ingredientes também estejam presentes. Desta vez, o inquérito dos senadores se debruçou sobre um evento singular: o morticínio de 600 mil brasileiros na pandemia. Nunca houve CPI como esta. À medida que os trabalhos se aproximam do desfecho, o desafio do relatório final é atribuir as responsabilidades e configurar os crimes diante de fatos chocantes e revoltantes por si sós. Eis os principais:

1) O presidente Jair Bolsonaro desprezou as normas sanitárias e pôs em risco a saúde da população, ao promover e participar de dezenas de aglomerações, desdenhar o uso de máscaras e o distanciamento social, recomendados pelo consenso científico;

2) O governo federal sabotou medidas de prevenção e defendeu a ampliação do contágio — portanto, das mortes — como forma de atingir mais rápido a “imunidade de rebanho”;

3) Desde o início da pandemia, Bolsonaro criou um gabinete paralelo de aconselhamento, à revelia dos organismos oficiais, formado por pseudocientistas, empresários e políticos alinhados ideologicamente;

4) O governo federal tentou manipular o número de mortes para reduzir o impacto público da pandemia;

5) Bolsonaro e o governo incentivaram a produção e distribuição de milhões de comprimidos de cloroquina e do “kit Covid” para o “tratamento precoce” com drogas ineficazes, temas de propaganda oficial;

6) Empresários próximos ao governo financiaram uma campanha de desinformação que pôs em risco a saúde pública, com foco em teses descabidas como “imunidade de rebanho”, “tratamento precoce”, “isolamento vertical” e mentiras contra as vacinas;

7) O governo desdenhou ofertas de vacinas que poderiam ter evitado centenas de milhares de mortes;

8) Representantes do governo participaram de esquemas para importar vacinas de intermediários suspeitos em troca de propina. Informado sobre um dos esquemas, Bolsonaro nada fez;

9) No auge da tragédia no Amazonas, o Ministério da Saúde ignorou os hospitais em colapso sem oxigênio, enquanto enviava cloroquina ao estado;

10) O governo foi omisso diante da população indígena. O resultado foi mais contágio e mais mortes;

11) Pacientes do Amazonas e do Rio Grande do Sul foram usados sem consentimento como cobaias em testes pseudocientíficos sem aval dos organismos éticos competentes;

12) Acusações de uso de cobaias humanas sem consentimento e fraudes se estendem à operadora de saúde Prevent Senior, cujo corpo técnico foi vinculado ao gabinete paralelo de aconselhamento a Bolsonaro.

Esses são os fatos. É deles que derivarão as consequências jurídicas. Apontar o que configura crime, quem são os acusados, processá-los e puni-los será outro desafio nada trivial. No parecer técnico encaminhado ao Senado, a comissão de juristas liderada pelo advogado Miguel Reale Júnior dividiu os tipos penais em cinco grupos, que poderiam ser reunidos em três, de acordo com o caminho dos processos.

Primeiro, os crimes de responsabilidade, cujo julgamento cabe ao Congresso. O parecer atribui a Bolsonaro o “desrespeito aos direitos à vida e à saúde” garantidos na Constituição. Seria motivo para mais um pedido de impeachment, além dos 131 a aguardar decisão do presidente da Câmara. Devido à natureza intrinsecamente política do impeachment, que exige dois terços na Câmara e no Senado, é improvável essas acusações prosperarem.

Segundo, os crimes contra a saúde, a paz e a administração públicas, cujo julgamento cabe à Justiça comum. Nesse capítulo, o parecer inclui, contra Bolsonaro ou integrantes do governo, acusações de infração de medida sanitária, epidemia, charlatanismo, incitação ao crime, corrupção passiva, estelionato, advocacia administrativa e prevaricação. No caso específico do presidente, enquanto ele estiver no poder, a abertura de processo dependeria da Procuradoria-Geral da República (PGR) — cujo titular, Augusto Aras, é conhecido pela leniência — e da autorização de dois terços da Câmara. O contexto político torna novamente improvável um processo no curto prazo.

Há, por fim, os crimes contra a humanidade, cujo julgamento caberia ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia. Estão incluídos aí os fatos relativos aos povos indígenas e à crise no Amazonas. O relatório final da CPI deveria seguir a recomendação dos juristas e evitar acusar Bolsonaro pelo crime que está na boca de todos os adversários políticos: o genocídio.

Tal acusação não se sustenta. Na definição jurídica, o genocídio envolve a intenção de destruir um grupo étnico, religioso, nacional, racial, cultural, de gênero etc. Por mais revoltantes que sejam os fatos apurados, nenhum corresponde a isso. “Com respeito ao genocídio, a evidência que vi não sustenta as exigências estabelecidas no artigo 6º do Estatuto de Roma”, afirma o franco-britânico Philippe Sands, jurista que defendeu várias causas no TPI.

Não significa que as barbaridades de Bolsonaro e dos demais envolvidos devam ser minimizadas. “Não vi as provas em detalhes, mas, pelo disponível publicamente, parece defensável a acusação de crimes contra a humanidade, embora difícil de estabelecer”, diz Sands. Trata-se de um tipo penal mais amplo, que inclui atos desumanos como tortura, escravidão, apartheid, violência sexual ou deportação forçada. A principal dificuldade (imposta pelo artigo 7º) seria mostrar que se tratou de “ataque generalizado ou sistemático contra a população civil”. O parecer dos juristas aponta nos fatos o contexto exigido para isso, mas o êxito em Haia, mesmo desimpedido pelas circunstâncias políticas locais, não seria fácil. O tribunal nunca julgou uma causa do tipo, e o procurador teria de correr um risco imponderável.

Os caminhos oferecidos pela Justiça para punir os responsáveis pela tragédia são íngremes. Não se deve, por isso, descartar a chance de mais esta CPI ter pouca consequência prática. Mas eles não devem ser abandonados. A memória dos mortos exige reparação.

O Globo

4 Dinheiro oculto, imóveis luxuosos e um mistério em Monte Carlo vinculado a Putin




El presidente ruso, Vladímir Putin, en un acto en Suiza en junio de 2021.

Documentos do ‘Pandora Papers’ apontam para uma mulher que supostamente manteve uma relação secreta durante anos com o presidente russo e a propriedade de um luxuoso apartamento em Mônaco

Por Paul Sonne Greg Miller

Mônaco - O apartamento está suspenso sobre as águas azuis do Mediterrâneo, sob o lendário cassino Monte Carlo dos filmes de James Bond. No porto abaixo, membros da realeza, magnatas e oligarcas passam flutuando em iates do tamanho de um iceberg.

Não existem muitos indícios na origem humilde de Svetlana Krivonogikh que indiquem que ela tinha recursos para comprar uma propriedade com vista para esse playground da elite mundial. Segundo foi relatado, a mulher russa cresceu em um apartamento comunitário abarrotado em São Petersburgo e um dos empregos que tinha era como faxineira de uma loja do bairro.

Mas registros financeiros desconhecidos e documentos fiscais locais mostram que Krivonogikh, de 46 anos, se tornou dona do apartamento em Mônaco por meio de uma empresa offshore criada poucas semanas depois de ter dado à luz a uma menina. A menina nasceu em um momento em que, segundo informou a imprensa russa no ano passado, mantinha um relacionamento secreto de muitos anos com o presidente russo Vladimir Putin.

O apartamento de luxo de Krivonogikh no complexo Monte Carlo Star foi revelado pelos documentos vazados para o Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ) e compartilhados com o Washington Post. Esses documentos, que fazem parte dos Pandora Papers, mostram que a mulher tinha uma empresa de fachada nas Ilhas Virgens Britânicas e usou os serviços financeiros de uma empresa de Mônaco que trabalhava para um dos amigos bilionários de Putin.

Nos arquivos não aparece de onde obteve o dinheiro para pagar um apartamento que custou 4,1 milhões de dólares (cerca de 22 milhões de reais) em 2003 e que hoje provavelmente vale muito mais. Mas a transação coincidiu com um período em que Krivonogikh supostamente tinha uma relação com Putin e acumulava uma assombrosa carteira de ativos na Rússia, segundo o Proekt, um veículo investigativo russo que expôs sua suposta ligação com o líder do Kremlin e que desde então foi proibido na Rússia.

Um porta-voz do Kremlin negou a história quando foi publicada no ano passado. Mas os detalhes que surgiram agora sobre esse apartamento reforçam a principal afirmação dessa investigação: que depois que Krivonogikh iniciou seu suposto relacionamento com Putin, acumulou ativos vinculados frequentemente com parceiros próximos do mandatário de uma forma ou de outra.

Antes da reportagem do Proekt, os laços de Krivonogikh com o círculo íntimo de Putin tinham vindo à tona, mas não tinham chamado atenção do público. O Bank Rossiya revelou em 2010 que a mulher era uma de suas maiores acionistas, por meio de sua empresa OOO Relax. O banco com sede em São Petersburgo seria submetido mais tarde a sanções por parte do Tesouro dos Estados Unidos, que o rotulou como o “banco pessoal para altos funcionários da Federação Russa”.

Krivonogikh não falou sobre sua suposta relação com Putin ou sua notável acumulação de riqueza.

Mas sua filha, que completou 18 anos neste ano e é conhecida pelo nome de Luiza Rozova, alimentou especulações sobre a identidade do pai em entrevistas, captando atenção para construir um crescente número de seguidores on-line. Nas imagens, Rozova tem uma semelhança surpreendente com o presidente russo e ela inclusive reconheceu isso, embora se recuse a confirmar ou desmentir que Putin é seu pai.

Não há registros do pai de Rozova nos documentos oficiais russos obtidos pelo Proekt e revisados pelo Washington Post. Mas figura um segundo nome, “Vladimirovna”, um patronímico que significa “filha de Vladimir”. Em sua conta no Instagram, que tem mais de 83.000 seguidores, ela se chama “rozova luiza v”.

Krivonogikh não respondeu aos pedidos de comentários sobre seus negócios em São Petersburgo com o Bank Rossiya, sua filha e a empresa de serviços financeiros de Mônaco. Os esforços para entrar em contato com Krivonogikh em três endereços residenciais ligados a ela não tiveram êxito. Um porta-voz do Kremlin não respondeu a um pedido de comentários feito pelo ICIJ em nome do Washington Post e outros veículos de comunicação associados no projeto Pandora Papers.

As pistas que conectam Krivonogikh à propriedade de Mônaco aparecem no novo vazamento em massa de documentos financeiros, que inclui planilhas, memorandos, faturas e e-mails obtidos de escritórios de advocacia, escritórios de contabilidade e administradores de fundos fiduciários que operam em algumas das jurisdições financeiras mais permissivas do mundo.

Os registros lançam luz sobre as manobras financeiras ocultas de líderes mundiais, investidores bilionários, celebridades, atletas e outros clientes de elite. O conjunto o fornece uma visão particularmente ampla de quantos aliados mais leais a Putin se enriqueceram de forma exorbitante e mantiveram ativos no exterior, inclusive quando o presidente russo menosprezou o Ocidente e pediu às elites russas que mantivessem seu capital em casa.

Os arquivos mostram, por exemplo, que o executivo de mídia Konstantin Ernst obteve uma participação em um lucrativo negócio imobiliário depois de receber elogios do líder russo por ajudar a organizar os Jogos Olímpicos de Inverno de 2014 em Sochi. O projeto envolveu a conversão de complexos de cinemas da era soviética, que ainda são propriedade do Estado, em empreendimentos de apartamentos e lojas particulares. A participação de Ernst não foi divulgada publicamente, mas aparece nos documentos do Pandora relacionados ao projeto.

Em comunicado escrito, Ernst confirmou sua participação no projeto imobiliário, mas negou que se tratasse de uma “compensação pelos Jogos Olímpicos de 2014″. Ele não respondeu a outras perguntas enviadas pelo ICIJ e outros veículos de comunicação associados, mas disse: “Não pratiquei nenhuma ação ilegal”.

Outros documentos mostram que Herman Gref, o presidente do banco estatal russo, tinha mais de 50 milhões de dólares em dinheiro e empréstimos a receber no exterior para sua família por meio de contas em Samoa, Panamá e Singapura, apesar de ser a face pública mais proeminente do sistema bancário.

As autoridades de Singapura apontaram transações envolvendo Gref e dois de seus colegas russos, de acordo com um relatório de auditoria da autoridade monetária de Singapura incluído nos Pandora Papers, e posteriormente multaram a empresa financeira que administra os ativos de Gref em 1,1 milhão de dólares por não cumprir as regras antilavagem de dinheiro. Uma porta-voz da autoridade monetária de Singapura disse que a empresa pagou a multa e tomou medidas para corrigir essas falhas.

Gref recusou-se a fazer comentários por meio de uma porta-voz do Sberbank.

Cinco anos depois das revelações dos Panama Papers, os novos documentos mostram que, em vez de deixar de usar contas offshore, os russos ricos e os administradores do seu dinheiro procuraram ocultar melhor seus ativos. Em um trecho, um advogado que representou dois dos amigos mais antigos de Putin advertiu uma empresa panamenha para que não repetisse os erros que levaram ao vazamento dos Panama Papers.

“Vocês são obrigados a manter sigilo para os nossos clientes”, escreveu o advogado em uma mensagem em 2016, “e não fazer com que seja possível de forma alguma uma segunda história dos Panama Papers”.

O rastro dos documentos

Aqueles que organizaram a compra em Monte Carlo para Krivonogikh tomaram medidas para impedir que seu nome e sua condição de proprietária aparecessem nos registros públicos.

Em 2 de abril de 2003, quase exatamente um mês depois do nascimento da filha de Krivonogikh, uma empresa opaca chamada Brockville Development Ltd. foi constituída nas Ilhas Virgens Britânicas, de acordo com os documentos dos Pandora Papers. Meses depois, segundo os registros de propriedade de Mônaco, essa empresa de fachada comprou o apartamento no principado por 3,6 milhões de euros (cerca de seis milhões de dólares na atualidade com os reajustes pela inflação).

O edifício onde fica o apartamento é “muito procurado pelos mais ricos do mundo”, diz o material promocional on-line de uma imobiliária de Mônaco. Os apartamentos “luminosos e arejados” do complexo possuem “varandas espaçosas, ideais para jantar ao ar livre ou para ver alguns dos superiates mais luxuosos do mundo entrando e saindo do mundialmente famoso Porto Hércules”, descreve a empresa.

Os Pandora Papers não mostram exatamente quando Krivonogikh se tornou a “beneficiária real” da Brockville, um termo que se refere à pessoa que em última instância controla ou se beneficia de uma empresa offshore, para além de outros nomes que apareçam nos documentos de registro. O que figura é que ela já era a beneficiária efetiva em 2006.

A Moores Rowland, a firma de serviços financeiros de Mônaco que administrava as transações, usou empresas de fachada que teriam dificultado as coisas para qualquer um que tentasse esclarecer a propriedade de Krivonogikh. A Brockville estava escondida dentro de uma segunda empresa de fachada chamada Sefton Securities, que por sua vez pertencia a Eamonn McGregor, um contador britânico que dirige a Moores Rowland em Mônaco. É aí onde termina o rastro do papel público.

Em 1º de janeiro de 2006, Krivonogikh assinou um acordo que transformava a Sefton em proprietária declarada da Brockville, quando, na verdade, o apartamento era dela, segundo os Pandora Papers. Uma carta de garantia de 2015, parte dos documentos vazados, torna esse acordo explícito, ao declarar que Krivonogikh tinha autorizado uma estrutura em que a Sefton “foi nomeada representante e fiduciária do beneficiário real”.

Os escritórios de Moores Rowland se encontram no coração de Mônaco, a poucos quarteirões do famoso cassino. A firma parece ter transferido o controle da Brockville para outra fachada com sede no Panamá em 2018, mas não há indícios nestes arquivos ou registros públicos de que Krivonogikh tenha renunciado à propriedade.

Quando um repórter do The Washington Post visitou o edifício Monte Carlo Star em meados de agosto, um segurança na entrada do prédio disse que não havia nenhuma Svetlana Krivonogikh na lista de moradores. E quando bateu à porta do apartamento que os registros locais identificam como sendo de propriedade da Brockville, uma mulher que atendeu disse que não havia nenhuma pessoa chamada Svetlana morando ali. Ela não se parecia com as fotos de Krivonogikh.

As autoridades fiscais monegascas confirmaram que a Brockville ainda é dona do apartamento. Se Krivonogikh o mantém alugado, poderia ganhar 25.000 dólares ou mais por mês, segundo anúncios imobiliários recentes.

As leis de Mônaco exigem que firmas financeiras que operam nessa jurisdição submetam a um escrutínio especial os clientes considerados “pessoas politicamente expostas” —ou seja, que ocupam cargos públicos destacados ou têm vínculos estreitos com outras pessoas que se ajustam a essa descrição. Moores Rowland não qualificou Krivonogikh como “politicamente exposta” nos documentos dos Pandora Papers.

Moores Rowland tem vínculos comerciais com outros russos próximos a Putin. Entre eles se encontra Gennady Timchenko, um bilionário trader petroleiro cuja amizade com Putin remonta à década de 1990.

Documentos vazados mostram que Moores Rowland agiu como procurador de Timchenko, ajudando a formar uma empresa que se tornaria parte do seu império petroleiro. Documentos similares mostram também a participação de Moores Rowland na criação de empresas de fachada cujos ativos incluíam iates comprados por Timchenko e sua filha.

O Departamento do Tesouro dos Estados Unidos impôs sanções a Timchenko em 2014, alegando que Putin tinha investimentos em sua empresa de comércio de petróleo. A companhia de Timchenko negou a acusação, mas tem um histórico de envolvimento em transações comerciais com pessoas supostamente próximas a Putin.

Por exemplo, Timchenko vendeu um luxuoso apartamento junto ao rio Neva, em São Petersburgo, à avó da ginasta Alina Kabayeva, que foi apontada como suposta amante de Putin, segundo uma reportagem da TV Rain da Rússia, que cita registros de propriedade russos. Em 2008, Putin negou ter uma relação com Kabayeva.

Procurada através do Grupo Nacional de Mídia da Rússia, onde atua como presidenta, Kabayeva preferiu não fazer comentários.

Timchenko também vendeu uma mansão em Biarritz, na França, e uma grande participação na companhia petroleira e petroquímica russa Sibur a um ex-genro de Putin, segundo a Reuters.

O Carter-Ruck, um escritório de advocacia londrino que representa Timchenko, disse que “sempre agiu de forma totalmente legal ao longo de sua carreira e seus acordos comerciais”.

Em carta ao The Washington Post, um escritório britânico de advocacia que representa Moores Rowland defendeu seu cliente, mas não forneceu nenhum comentário para publicação.

Lista de propriedades

O apartamento em Mônaco é parte de uma assombrosa lista de propriedades acumulada por Krivonogikh logo depois de supostamente iniciar sua relação com Putin.

Ela tem uma participação em um banco russo dirigido por sócios de Putin, segundo os registros públicos e a investigação do Proekt. Possui uma participação majoritária numa estação de esqui onde uma filha de Putin se casou. Tem um iate, uma conta bancária na Suíça que também aparece nos Pandora Papers e apartamentos nos endereços mais cobiçados de São Petersburgo, conforme reportagem do Proekt e registros públicos russos.

Não há indícios de que sua fortuna pessoal provenha de riqueza familiar.

Duas fontes anônimas que disseram conhecer Krivonogikh relataram ao veículo russo que ela havia sido “amiga próxima” de Putin durante anos, forjando com ele uma relação que começou na década de 1990, em São Petersburgo, onde Putin trabalhou como alto funcionário municipal, e continuou nos primeiros anos deste século em Moscou, depois de que o líder russo assumiu a presidência. O Proekt concluiu, analisando registros de passageiros, que Krivonogikh se tornou uma visitante assídua da capital russa quando Putin assumiu o comando do Kremlin.

As perspectivas profissionais de Krivonogikh melhoraram repentinamente, segundo os detalhes expostos na investigação do site jornalístico russo. Já em 2001, ela começou a trabalhar no banco Rossiya. Posteriormente, adquiriu uma participação de aproximadamente 3% do banco, segundo os extratos bancários.

Virou dona de um apartamento na prestigiosa ilha Kamenni, na zona norte de São Petersburgo, e adquiriu uma participação em um centro de artes cênicas na mesma cidade, segundo a investigação do Proekt, que cita registros públicos russos verificados pelo The Washington Post.

Outro acordou lhe concedeu uma participação de 75% em uma estação de esqui ao norte de São Petersburgo, em sociedade com um amigo de Putin que atuou como presidente e acionista majoritário do banco Rossiya, segundo os registros públicos russos.

Os sete teleféricos e as pequenas pistas da estação de Igora não são um atrativo para os esquiadores de elite da Europa. Mas a propriedade se beneficiou de milhões de dólares em investimentos e se expandiu desde sua inauguração, durante o segundo mandato presidencial de Putin, e em 2013 serviu de cenário para a cerimônia de uma das filhas do presidente —ele tem duas, de um casamento encerrado em 2014.

Semelhança com o presidente

Putin mantém sua vida privada e seu patrimônio pessoal sob o sigilo esperado de um ex-agente da KGB. Mesmo suas duas filhas reconhecidas protegem suas identidades do público com pseudônimo.

Mas o muro que ele construiu para proteger sua vida privada sofreu fissuras nos últimos anos, em meio de uma onda de revelações feitas pela internet por ativistas da oposição, jornalistas e detetives digitais. No começo deste ano, por exemplo, o principal adversário político de Putin, Alexei Navalny, revelou numa publicação digital que um palácio de um bilhão de dólares na costa do mar Negro era uma residência secreta para o líder russo, paga com dinheiro da corrupção. Putin nega ser dono do imóvel.

As autoridades russas responderam nos últimos meses com uma dura repressão à oposição política e aos jornalistas. Depois da publicação da denúncia sobre a mansão do mar Negro, Navalni foi condenado a três anos e meio de prisão e sua organização foi fechada pela Justiça. Desde então, a Rússia também proibiu o Proekt alegando motivos de segurança nacional. Seu editor fugiu do país por medo de ser processado penalmente.

O Proekt estimou no ano passado que os ativos de Krivonogikh só na Rússia valiam 7,7 bilhões de rublos (569 milhões de reais). Os Pandora Papers proporcionam a primeira evidência de que suas propriedades se estenderam além das fronteiras russas.

Krivonogikh se negou a fazer declarações sobre o suposto relacionamento com Putin e evita aparições em público e nas redes sociais. Sua filha, entretanto, chamou a atenção para especulações sobre sua ascendência.

Em março, Rozova apareceu numa casa noturna de Moscou para tocar um set-surpresa como DJ, como parte da sua festa de 18 anos. Acumulou dezenas de milhares de seguidores no Instagram, onde as imagens que publica ocultam partes de seu rosto, mas revelam pálpebras grossas que se assemelham às do líder russo.

Seu perfil on-line mostra que está familiarizada com a cena da Riviera Francesa, que cerca Mônaco. Durante uma aparição em vídeo numa rede social em fevereiro, Rozova contou que visita a cidade francesa de Menton todos os anos para assistir ao Lemon Festival, um evento que acontece a menos de 20 minutos do apartamento de Monte Carlo. Rozova não respondeu aos pedidos para fazer comentários.

Em uma entrevista de fevereiro à edição russa da GQ, a jovem não quis explicar por que deixou de usar o sobrenome Krivonogikh, da sua mãe. Tampouco se referiu diretamente à identidade de seu pai. Entretanto, estava disposta a reconhecer que tem uma semelhança com Putin.

“Escute, em comparação com fotografias dele quando jovem, provavelmente, sim, me pareço com ele”, disse. “Mas acontece que tem muita gente que se parece com Vladimir Vladimirovitch.”

Em uma entrevista de agosto ao site Srsly.ru, também se negou a falar sobre a identidade de seu pai, alegando que a intriga já se espalhou e que seria “chato saber a verdade”. Também se negou a dizer se alguma vez conheceu Putin.

O entrevistador lhe perguntou o que lhe diria ao presidente russo se o tivesse à sua frente.

“Provavelmente lhe faria uma pergunta”, respondeu Rozova.

“Qual?”, quis saber o entrevistador.

“Por quê?”

El País

Pandora Papers: como os poderosos escondem sua riqueza

 




Vazamento de documentos lança luz sobre uso de paraísos fiscais por políticos e empresários para escapar de impostos e ocultar riqueza. Ministro Paulo Guedes e líderes da Jordânia e Azerbaijão são citados.

Milhões de documentos vazados de escritórios administradores de offshores jogaram luz sobre os segredos financeiros de políticos - incluindo líderes mundiais -, ministros, empresários e celebridades que usam paraísos fiscais para movimentar secretamente grandes somas de dinheiro e assim escapar de impostos e do olhar da opinião pública, ou, em alguns casos, ocultar fortunas obtidas ilegalmente.

Uma investigação com base no vazamento, realizada pelo Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês) em conjunto com 150 veículos de notícias - incluindo a DW - revela que mais de 330 políticos de alto escalão e agentes públicos em todo o mundo têm vínculos com contas e empresas offshore.

Os milhões de documentos vazados e examinados pela maior parceria jornalística mostram até que ponto as operações offshore secretas estão emaranhadas na política financeira global, algumas vezes beneficiando justamente personagens que denunciam esses mecanismos.

Os ministros das finanças do Paquistão e Holanda têm laços com empresas offshore, assim como ex-ministros das finanças de Malta e da França - incluindo o ex-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI) Dominique Strauss-Kahn.

No caso do Brasil, o atual ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, aparecem ligados a offshores nas Ilhas Virgens Britânicas e no Panamá. No caso de Guedes, segundo a revista Piauí, trata-se de um offshore que continuou ativa mesmo depois de o economista assumir um cargo-chave no governo.

De acordo coma publicação, Guedes aportou na conta offshore entre 2014 e 2015 US$ 9,55 milhões (valor que no câmbio atual corresponde a R$ 51 milhões). O ministro respondeu de modo vago aos questionamentos da revista, afirmando que "sua atuação sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade".

'O ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, movimentou quase 10 milhões de dólares em paraíso fiscal'

Hipocrisia

De acordo com o ICIJ, os Pandora Papers mostram que detentores do poder que poderiam ajudar a pôr fim ao sistema offshore estão se beneficiando dele - escondendo ativos e fundos em empresas secretas enquanto seus governos fazem pouco para desacelerar um fluxo global de dinheiro ilícito que enriquece criminosos e empobrece nações.

O ex-primeiro-ministro do Reino Unido Tony Blair, por exemplo, denunciou a evasão fiscal por décadas, mas os vazamentos revelam que ele e sua esposa adquiriram um prédio de US$ 8,8 milhões por meio de uma empresa imobiliária offshore da família do ministro do Turismo de Bahrein, Zayed bin Rashid al-Zayani.

Ao comprar as ações da empresa offshore detentora do imóvel - e não o prédio diretamente - Blair e sua esposa, Cherie, conseguiram evitar o pagamento de impostos sobre transações imobiliárias que poderiam chegar a US$ 400.000.

Tanto os Blairs quanto os al-Zayanis disseram que inicialmente não sabiam sobre o envolvimento um do outro no negócio. Cherie Blair disse que seu marido não se envolveu diretamente na transação. 

O primeiro-ministro tcheco Andrej Babis, um bilionário que chegou ao poder em 2017 com a promessa de combater a corrupção, também é citado nos Pandora Papers.

Os registros vazados mostram que, em 2009, Babis injetou US$ 22 milhões em uma série de empresas de fachada para comprar uma mansão com duas piscinas e um cinema na Riviera Francesa, perto de Cannes. O site Investigace.cz apontou que as empresas offshores e a residência não estavam listadas nas declarações de bens que Babis apresentou quando se candidatou. Babis não respondeu aos questionamentos enviados pela imprensa.

'O ex-premiê britânico Tony Blair escapou de pagar centenas de milhares de libras em impostos ao usar uma offshore'

Ex-repúblicas soviéticas

O presidente da Ucrânia,  Volodimir Zelenski, também possuía uma participação em uma empresa de fachada registrada nas Ilhas Virgens Britânicas. Um mês antes de sua vitória na eleição presidencial de abril de 2019, o ator que virou político silenciosamente vendeu suas ações da Maltex Multicapital Corp.  para Serhiy Shefir, um amigo próximo.

Um documento de junho de 2019 mostra que Shefir, um importante assessor presidencial que sobreviveu a uma tentativa de assassinato em setembro, manteve sua participação na Maltex Multicapital Corp depois de ingressar no governo de Zelenski.

Shefir e Zelenski não responderam aos questionamentos dos parceiros do ICIJ.

O presidente russo, Vladimir Putin, que regularmente é acusado de manter uma fortuna secreta, não aparece nos arquivos dos Pandora Papers. Mas vários amigos próximos do presidente constam nos vazamentos, incluindo seu melhor amigo de infância - o falecido Petr Kolbin - a quem os críticos apelidavam de "a carteira de Putin".

Membros da família e pessoas próximas do presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, também aparecem envolvidos com empresas offshore que realizaram negócios imobiliários no Reino Unido que movimentaram mais de 400 milhões de libras.

'O premiê tcheco Andrej Babis usou uma offshore para comprar - e ocultar - uma propriedade milionária na França'

Líderes africanos, realeza árabe

Já o presidente Uhuru Kenyatta, que vem de uma das dinastias políticas mais conhecidas do Quênia, liderou uma campanha em 2013 com discursos anticorrupção e por mais transparência na política. Mas registros vazados mostram que Kenyatta e sua mãe são beneficiários de uma fundação secreta sediada no Panamá.

Outros membros da família, incluindo três irmãos, possuem cinco empresas offshore com ativos no valor de mais de US$ 30 milhões, de acordo com os registros.

Os Pandora Papers revelam os verdadeiros proprietários de mais de 29.000 empresas offshore. Algumas dessas empresas são usadas para ocultar contas bancárias secretas, jatos particulares, iates, mansões e obras de arte de artistas como Picasso e Banksy.

O rei Abdullah II da Jordânia, por exemplo, comprou em 2011 três mansões à beira-mar por US$ 68 milhões em Malibu, nos EUA, usando empresas offshore justamente quando seu país passava pela Primavera Árabe, quando os jordanianos foram às ruas para protestar contra a corrupção e o desemprego.

Ao todo, o rei  aparece ligado a 30 empresas que adquiriram 14 propriedades de luxo nos EUA e Reino Unido por mais de US$ 106 milhões.

Os documentos secretos também revelaram que a princesa Lalla Hasnaa do Marrocos é proprietária de uma empresa de fachada que adquiriu uma casa de US$ 11 milhões em Londres. Hasnaa fez a compra com fundos da família real marroquina, de acordo com os documentos, que indicaram sua ocupação como "Princesa".

Mohammed bin Rashid Al Maktoum, o primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos e emir de Dubai, era acionista de três empresas registradas em paraísos fiscais.

Já o emir do Catar, Tamim bin Hamad Al Thani, continua a usar empresas offshore para fazer investimentos e administrar seu patrimônio. A investigação do Panama Papers já havia revelado que seu super iate de US$ 300 milhões era controlado por meio empresas offshore.

'O presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta: sua família possui milhões de dólares em contas offshore'

Celebridades

A cantora colombiana Shakira e a ex-estrela idiana do críquete Sachin Tendulkar, também são nomes ligados a ativos offshore. O advogado de Shakira disse que as contas offshore da cantora foram declaradas e que não oferecem nenhuma vantagem fiscal. O advogado de Tendulkar disse que o investimento do jogador de críquete é legítimo e foi declarado às autoridades fiscais.

Mais de 130 bilionários expostos

O líder populista tcheco Babis não é o único bilionário com negócios em paraísos fiscais: mais de 130 empresários da Turquia, Rússia, Índia, Estados Unidos, México, entre outras nações, têm laços com contas offshore.

O bilionário e magnata da construção turco Erman Ilicak tinha ligações com duas empresas offshore - registradas em nome de sua mãe em 2014. Ambos detinham ativos do conglomerado de construção da família.

Uma delas, a Covar Trading Ltd., obteve US$ 105,5 milhões em receitas de dividendos durante seu primeiro ano de operações. O dinheiro ficou guardado em uma conta na Suíça - mas não por muito tempo.

No mesmo ano, mostram documentos, a empresa direcionou quase todos o valor de US$ 105,5 milhões como uma "doação" listada em "despesas extraordinárias". As declarações não indicam quem recebeu o dinheiro. Ilicak não respondeu aos questionamentos do ICIJ.

A empresa do magnata turco, a Rönesans Holding, foi responsável pela construção do palácio presidencial de 1.150 cômodos para o líder de seu país, Recep Tayyip Erdogan.

'A construtora de Erman Ilicak foi responsável por erguer o palácio do autocrata turco Recep Erdogan'

Por que os paraísos fiscais são problemáticos

Assim funcionam as empresas offshore: muitas vezes, por apenas algumas centenas de dólares, consultores podem ajudar os clientes a criar uma empresa offshore cujos verdadeiros proprietários permanecem em segredo.

E, por uma taxa de US$ 2.000 a US$ 25.000, eles podem estabelecer um fundo que, em alguns casos, permite que seus beneficiários controlem seu dinheiro, embora não sejam legalmente responsáveis ​​por suas ações. Vários mecanismos também ajudam a proteger os ativos de credores, autoridades policiais, cobradores de impostos e ex-cônjuges.

Possuir contas ou empresas offshore e conduzir transações financeiras por meio de paraísos fiscais é perfeitamente legal em muitos países - mas a prática é cada vez mais encarada como problemática.

Muitas pessoas que usam essas empresas dizem que elas são necessárias para operar seus negócios com eficiência. Os críticos, no entanto, apontam que os paraísos fiscais e as operações offshore devem ser monitorados mais de perto para combater a corrupção, a lavagem de dinheiro e a desigualdade global.

De acordo com Gabriel Zucman, especialista em paraísos fiscais e professor associado de economia da Universidade de Berkeley, na Califórnia, o equivalente a 10% do PIB mundial é mantido em paraísos fiscais em todo o mundo.

Lakshmi Kumar, diretora da Global Financial Integrity, apontou que as táticas dos ricos para esconder dinheiro por meio da evasão fiscal têm um impacto direto na vida das pessoas. "Isso afeta o acesso de seu filho à educação, à saúde e à habitação", disse ela.

Devido à natureza complexa e secreta do sistema offshore não é possível saber a quantidade exata de riqueza que está ligada à evasão fiscal e outros crimes. E também saber qual foi o valor efetivamente declarado por detentores de empresas.

O montante total de dinheiro canalizado de países com taxas de impostos mais elevadas para paraísos fiscais com impostos significativamente mais baixos é desconhecido. No entanto, de acordo com um estudo de 2020 da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), pelo menos US$ 11,3 trilhões são mantidos "offshore".

Os paraísos fiscais costumam despertar imagens de pequenas nações no Caribe, mas os Pandora Papers mostram que o sistema offshore opera em todo o mundo e em lugares como Cingapura, Holanda, Irlanda, Hong Kong e até mesmo alguns estados dos Estados Unidos.

Como o vazamento ocorreu e foi analisado?

O Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos obteve os 11,9 milhões de arquivos confidenciais e liderou uma equipe de mais de 600 jornalistas de 150 veículos de notícias que passaram dois anos examinando os documentos, rastreando fontes e vasculhando registros judiciais e públicos de dezenas de países.

Os dados vazados vêm de 14 firmas de serviços offshore de todo o mundo que abriram empresas de fachada para clientes que muitas vezes procuram manter suas atividades financeiras nas sombras.

Os Pandora Papers estão sendo revelados cinco anos após a investigação histórica do Panama Papers. Em 2016, as revelações deste último caso incentivaram operações policiais e levaram legisladores a aprovarem novas leis em dezenas de países. O caso ainda teve desdobramentos políticos, incluindo a queda dos primeiros-ministros da Islândia e do Paquistão.

Deutsche Welle

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