Pedro do Coutto
A explosão da violência na tarde de domingo em Roma quando Jair Bolsonaro caminhava pelo centro histórico da cidade, representou um desastre para a imagem do Brasil no exterior e um fato terrivelmente negativo para o presidente da República que deve disputar a reeleição em 2022. Sua atitude hostil para com a imprensa e a omissão em relação aos agressores o fez perder ainda mais espaços na política brasileira.
Internacionalmente, ao não participar do encerramento do G20 em Roma e não comparecer à reunião sobre o clima promovida pela ONU em Glasgow, na Escócia, o presidente Bolsonaro assumiu um posicionamento péssimo sob todos os aspectos.
INTOLERÂNCIA – Ausente na Escócia e presente nas agressões, ele demonstrou mais uma vez a sua absoluta intolerância diante da liberdade de imprensa e o exercício de uma profissão que representa o único canal coletivo de comunicação entre os que exercem o poder e as populações que têm pleno direito a serem bem informadas.
Incomodaram o presidente da República as inevitáveis perguntas sobre por qual motivo ele não teve participação ativa na reunião do G20, na capital da Itália, e porque sequer compareceu à reunião de Glasgow voltada contra o aquecimento global, contra as queimadas, contra o desmatamento e a favor da ecologia.
O tema aquecimento global é de uma importância enorme para o futuro da humanidade e a participação brasileira é fundamental, principalmente em função da Amazônia, a floresta mais densa do mundo e maior reserva de água do planeta. Sem a Amazônia, o mundo não poderia existir. E com o aquecimento global progredindo de forma ininterrupta, uma parte da Terra tem a sua existência ameaçada, especialmente em consequência do degelo de grandes camadas em países como a Noruega, Suécia e Dinamarca.
EPISÓDIO TRISTE – Seguranças pessoais do presidente Bolsonaro e agentes italianos contratados pela embaixada, pois não faria sentido que italianos fossem se intrometer em questões brasileiras, marcaram um episódio triste no relacionamento internacional. As perguntas eram lógicas, a começar por qual razão Bolsonaro recusou-se a debater o clima no encontro da Escócia. O soco no correspondente da TV Globo em Roma, Leonardo Monteiro, agrediu a própria liberdade de informar e opinar. Os jornalistas da Folha de S. Paulo, do UOL e da BBC Brasil foram igualmente agredidos.
Surpreende o silêncio do ministro das Comunicações, Fábio Faria, que estava em Roma e seguiu para Glasgow. Um dos jornalistas agredidos, Lucas Ferraz, sofreu igualmente agressões e teve um celular arremessado ao chão e destruído. O presidente Jair Bolsonaro não teve razão em se irritar. O que foi veiculado na tarde de sábado pela TV Globo foi o seu diálogo com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdoğan. As palavras foram dele, Bolsonaro, e se chocaram com a realidade brasileira.
VERSÕES IRREAIS – O que a edição da TV Globo destacou foi que não eram verdadeiras as versões sobre a popularidade do governo e a ausência de influência político-partidária nas nomeações para ministérios. A imprensa não inventou nada ou mesmo colocou na voz de Jair Bolsonaro algo que ele próprio não tenha dito. Entre as suas afirmações, a de que a Petrobras era um problema, possivelmente se referindo à questão dos preços da gasolina e do diesel. Mas esta é uma outra questão.
O essencial é a impossibilidade de Bolsonaro e de seus apoiadores de se situarem dentro dos princípios democráticos. Essa contradição termina como aconteceu em Roma, prejudicando frontalmente a imagem do Brasil e refletindo de forma inevitável na campanha eleitoral de outubro do próximo ano.
AUTO-OPOSIÇÃO – Analisando-se bem o panorama verifica-se que as oposições não precisam se manifestar, o presidente Bolsonaro de forma permanente e violenta faz oposição a si mesmo.
Este aspecto não teria maior importância se não estivessem em jogo no presente e no futuro os legítimos interesses brasileiros, incluindo sobretudo os anseios democráticos de nossa população. O episódio de Roma foi mais um triste capítulo de uma narrativa até hoje inexplicável pelo governo que não conseguiu estabelecer sequer um projeto econômico-social integrado.
Quer substituir a falta de um projeto construtivo pelo apelo à violência destrutiva. Os efeitos são os piores possíveis e tornam cada vez mais distantes o exercício pleno da democracia no país. As manifestações de meses atrás na Esplanada de Brasília contra o Supremo, contra o Congresso e contra a imprensa estão de volta.