Mantega negou rumores de que esteja pensando em deixar o cargo por conta da derrota do governo
BRASÍLIA - Na manhã de ontem, mesmo dia da derrota da emenda constitucional que propunha a prorrogação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva tratou o assunto como um transtorno político, mas a equipe econômica não encarou a situação, apesar da perda de R$ 40 bilhões de arrecadação, como uma "emergência fiscal".
Doze horas depois da sessão no Senado, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, não apresentou nenhuma medida emergencial e cuidou apenas do recado para o mercado, garantindo que as metas fiscais são intocáveis.
"Nós vamos manter a política de responsabilidade fiscal e vamos cumprir as metas fiscais que estão estabelecidas", disse Mantega. No bastidor da Fazenda e do Planejamento, o governo avalia que o Senado fez uma "desoneração forçada" de R$ 40 bilhões - ultrapassando os R$ 39 bilhões dos pacotes de desonerações anunciados nos últimos cinco anos.
O dinheiro da CPMF vai voltar para sociedade e retroalimentar o crescimento da economia. Essa desoneração forçada vai reduzir o custo das empresas e aumentar o poder aquisitivo da população.
O governo não tem pronta uma medida de grande impacto para anunciar na próxima semana. Terá que fazer mais do mesmo em torno de corte de despesas e suspensão de alguns programas que não são tão essenciais no momento. Também não há espaço para grandes ousadias do lado do aumento da carga tributária. A elevação do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) é uma opção, mas o governo ainda não tomou a decisão. Faz cálculos e simulações para ver o seu impacto.
O crescimento robusto da economia (referendado pelos dados do IBGE), navega a favor do governo neste momento. É sinal de que poderá contar com receitas maiores no ano que vem, que irão ajudar a cobrir o rombo da CPMF.
"A redução do chamado superávit primário (economia de recursos públicos para pagar juros da dívida) chegou a ser cogitada nos meios técnicos como uma alternativa para cobrir parte do "buraco" aberto com o fim da CPMF. Era uma medida esperada pelo mercado financeiro. Porém, Lula deixou claro que o superávit primário é intocável.
O "plano B" para a CPMF, portanto, vai se restringir ao cardápio clássico: corte em despesas e um eventual, pequeno e pontual aumento na tributação. Mantega evitou confirmar possíveis aumentos de impostos. Mas, em entrevista, há duas semanas, ele citou a possibilidade de elevar alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e do IOF.
Essas medidas podem ser adotadas sem autorização do Congresso Nacional, bastando um decreto do presidente. O ministro mencionou também a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Nesse caso, informam técnicos, seria necessário editar uma Medida Provisória e submetê-la ao Legislativo.
"Não queremos cortar os investimentos do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), não queremos cortar os programas sociais, então a margem de manobra não é tanta", admitiu ao Estado o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. A tesoura vai ser direcionada a investimentos que não são parte do PAC e aos gastos de custeio da máquina pública. Esses, porém, somam cerca de R$ 20 bilhões. "Não dá para tirar R$ 40 bilhões de R$ 20 bilhões", comentou Bernardo.
Um alvo certo é a área da Saúde, que no ano que vem receberia uma injeção de R$ 24 bilhões, conforme estabelece a regulamentação da Emenda Constitucional 29. Porém, a origem desses recursos é a CPMF. Ou seja, os recursos não existem mais.
Crescimento
O governo conta com o próprio crescimento econômico de 2008 para dar conta de parte do problema. Bernardo fez os cálculos: se a economia crescer 5% como espera o governo e a inflação ficar na casa dos 4%, a arrecadação crescerá pelo menos 9%. Nos dez primeiros meses deste ano, os recolhimentos de impostos e contribuições ficaram R$ 15,5 bilhões acima do esperado e R$ 35 bilhões acima do que foi recolhido em igual período de 2006.
Incomodado com a derrota política, Mantega negou que vá deixar o cargo em função da derrota no Congresso. Essa possibilidade foi levantada pelo senador Demóstenes Torres (DEM-GO). "É só ver de onde vêm os rumores para saber que eles são fofocas, especulações que não vou nem comentar porque não têm a menor relevância", disse.
Ele avaliou que a derrota do governo não se deveu a erros na negociação. "O que falhou é que um segmento da classe política não queria a aprovação de jeito nenhum, não adiantava negociar", afirmou Mantega. "Podia fazer qualquer proposta que iam encontrar algum subterfúgio para não votar." Mantega ressaltou, porém, que o governo obteve a maioria dos votos para a CPMF. O problema é que eram necessários 3/5.
Para Bernardo, o PSDB voltou atrás nos acordos que havia fechado com o governo "por causa de 2010". Na avaliação do ministro, a sucessão de boas notícias - o Brasil entrar para o clube dos países com alto índice de desenvolvimento humano, a pesquisa Ibope mostrando a aprovação do governo, os dados do IBGE reafirmando a aceleração do crescimento - levou os tucanos a uma posição intransigente. "É demais para o coração deles", disse.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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