Por: Alberto Oliva
Na bandeira de nossa pátria já poderia ter sido substituído o dístico Ordem e Progresso pelo Decifra-me ou Devoro-te. As melhores sociedades estão entre o céu e o purgatório. As infernais são ajuntamentos conflitados chamados de países. O Brasil aos poucos vai sendo minado pela corrupção e insegurança generalizadas. Nas últimas quatro décadas quase tudo tem se tornado perigoso em nossa ""antiga pátria mãe gentil"". Perdeu-se a inocência da convivência tranqüila - no meio da rua - dos anos 50. As flechas vêm de quase todas as direções. O brasileiro é um candidato permanente a São Sebastião. Está submetido ao elevado risco de ser ludibriado, roubado e assassinado. E o pior é que seus inimigos podem ser tanto os governantes que escolheu quanto os marginais saídos das catacumbas do desconhecido. Não tem o pobre cidadão como viver feliz num ambiente que oculta tantas ameaças. O assustador é que o homem de bem é cada vez mais um amador encurralado por profissionais do mal. Da corrupção gerida com eficiência tentacular ao assalto à mão armada, passando pela falta de serviços públicos de qualidade, quase tudo empareda o brasileiro, transformando-o em marionete de um sistema perverso. Sofre tantos desrespeitos que acaba padecendo da síndrome de Estocolmo: vê com enorme complacência os algozes. E o pior é que acredita em candidatos e autoridades que propõem soluções fáceis para problemas estruturais. Com isso, passa a apresentar sintomas de infantilização. Por esperar muito dos governantes não presta atenção nas funcionalidades viciosas das instituições. Decepciona-se com as condutas do presidente sem vinculá-las ao projeto de poder de seu partido. O eleitor que coloca no poder um partido com idéias socialistas retrógradas não pode depois estranhar as tentativas de reduzir ou suprimir a liberdade por meio, por exemplo, de excrescências como o Conselho Federal de Jornalismo. O bolchevismo tardio, sem causa e desmoralizado pela história, se juntou na Terra Brasilis ao velho patrimonialismo para criar uma grande rede de corrupção que fosse capaz de alavancar um projeto de poder canhestramente imitador do modelo chinês: ""livre mercado"" para alguns empresários e chicote do Estado em quem se opuser. Com a queda do Muro de Berlim, alguns gênios petistas chegaram à luminosa conclusão de que a corrupção seria a baldeação rumo à Estação Finlândia. Quando Stalin se acasala com Macunaíma o rebento apresenta traços teratológicos.. No Brasil, o cidadão não tem o direito de contemplar o céu e rolar pela relva; não tem como ser amador cercado que está por riscos oficiais, extra-oficiais e marginais. Precisa andar nas ruas olhando para os lados, em sobressalto permanente, atento aos mais diferentes golpes que podem vir de qualquer esquina de qualquer logradouro. Precisa financiar um Estado que lhe cobra impostos escorchantes que acabam mal aplicados, perdidos nos desvãos da burocracia inepta ou nos dutos da corrupção. Vota apreensivo porque é grande a chance de o governante se envolver em atos imorais ou criminosos, de não terminar o mandato, de gerar uma enorme frustração depois de ter alimentado, por meio de marketing pirotécnico, a ilusão das soluções mágicas. Todo brasileiro hoje sonha em poder se dedicar às suas tarefas sem precisar se defender de quase tudo e todos. Quando os golpes deixam de ser monopólio de estelionatários e criminosos, podendo até ser praticados por agentes do governo, fica o cidadão impossibilitado de se proteger. É a fragilidade das instituições que explica por que os profissionais do crime e da política atentam com tanta facilidade contra a coisa pública. As instituições crescem fracas quando a sociedade não se aferra a determinados valores. Em que a média dos brasileiros acredita com firme convicção? Infelizmente, a democracia - não o democratismo populista - entendida como forma de limitar e distribuir o poder, a economia de mercado e a clara separação entre governo e Estado não são prezados como merecem. É o laxismo geral que faz com que o país esteja sempre desorientado. Os desequilíbrios estruturais e a bandalheira moral não são combatidos porque faltam ao povo e às elites o profundo comprometimento com determinados valores filosóficos. Os ""carismáticos"" contratam publicitários com dinheiro ilícito e os grotões seduzidos com migalhas os (re)elegem. Os espertalhões da propaganda criam para os donos do poder o slogan ""Um país de todos"" e os desatentos não percebem que todos são Eles, apenas Eles: os donos do Diário Oficial.
Fonte: JB
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