Pedro do Coutto
Reportagens de Jussara Soares, de Natália Portinari e Geraldo Adoca, O Globo desta segunda-feira, revelam duas movimentações: primeiro o Palácio do Planalto começou a treinar o general Eduardo Pazuello para o seu depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito sobre os erros e omissões do governo em relação ao enfrentamento à Covid-19 e também ao primeiro estágio do coronavírus.
Isso de um lado. De outro, destacam os esforços tanto de Jair Bolsonaro quanto de Lula da Silva tentando obter o apoio do ex-presidente José Sarney no que se refere à CPI e à sucessão presidencial de 2022. O ex-presidente da República retorna ao centro do palco agora como fator de equilíbrio entre os choques ideológicos que podem ser classificados hoje entre a direita de Bolsonaro e a esquerda de Lula.
CONSERVADORISMO – Pessoalmente, acho que Bolsonaro é da direita e Lula não é praticamente da esquerda. Ao contrário, Lula é um conservador conforme comprovou nos mandatos que exerceu e também no êxito que teve ao eleger Dilma Rousseff para sucedê-lo. No segundo mandato Dilma fracassou e não teve sensibilidade para conduzir a política fora de uma esfera de atrito permanente. Atrito esse que abrangeu a realidade do país.
Lula, de fato, é um homem de centro-esquerda. Ele não se propõe a reformas profundas, mas a mediar reivindicações dos trabalhadores com os interesses dos empresários. Lula tem a seu favor um forte respaldo da opinião pública. Venceu eleições e transferiu 43% dos votos do país a Fernando Haddad, candidato muito fraco.
No Planalto, a preocupação é grande com o desempenho de Pazuello, sobretudo porque o general continua no governo aguardando uma nomeação para a área político-militar de Brasília. Portanto, a sua posição é bastante sensível. Não há dúvida de que ele fracassou no desempenho à frente do Ministério da Saúde, não conseguindo resolver os problemas que encontrou.
CLOROQUINA – O desastre foi muito grande, ampliado pela compra de cloroquina que não teve nenhum uso prático para combater a Covid-19. É verdade que em matéria de compras surgem sempre assessores bastante entusiasmados com aquele ou esse fornecimento.
Não quero dizer, nem de longe, que Pazuello tenha representado interesses alheios à administração. É um homem honesto, mas é preciso que os administradores tenham cuidado acentuado com esse tipo de influência da assessoria. Acrescento como exemplo o caso da refinaria de Pasadena, adquirida pela Petrobras por um preço seis vezes maior do que valia, com a presidente da República endossando a aquisição prejudicial aos interesses do país.
Quanto ao retorno de Sarney à arena política, o ex-presidente é um homem de ótimo trânsito em todas as faixas políticas brasileiras. Ele tem a seu favor o fato de ter exercido o mandato sem causar problemas relativos ao choque ideológico inevitável. O destino, contudo, agiu contra ele e contra o país na medida em que Fernando Collor elegeu-se presidente da República. Mas esta é outra questão.
BUSCA POR EMPREGO – Na edição de ontem da Folha de São Paulo, Ruy Castro escreveu um artigo sobre a iniciativa do escritor Lúcio Cardoso de procurar uma agência de propaganda buscando colocação profissional no quadro de redatores.
Por ironia do destino, o texto que apresentou não foi suficiente para classificá-lo. Isso acontece vida afora. Muitas vezes, o entrevistador ou selecionador não conhece o candidato à seleção. Em outras vezes, Ruy Castro cita, conhece muito bem. E, por isso, evita aprová-lo pois amanhã o então candidato pode representar uma ameaça para o próprio autor do exame.
DA VINCI – Pessoalmente tenho muito apreço por quem pede emprego, pois na vida já pedi algumas vezes. A favor do pedido de emprego cito um fato que pertence à história universal. Um dos maiores gênios da humanidade, Leonardo da Vinci, na época em que a Itália não estava unificada, pediu emprego no reino de Florença, cidade onde nasceu. Depois de não satisfeito pediu emprego à Ludovico Sforza, no reino de Milão. Foi atendido como artista e como engenheiro.
Mas não como engenheiro militar, atividade a que se propunha também. Em Florença e em Milão idealizou um sistema eficaz de abastecimento de água e de circulação das correntes aquáticas.
Quando o rei da França, Carlos V, invadiu e dominou Milão,
Leonardo da Vinci dirigiu a ele carta solicitando a sua manutenção no emprego. Foi atendido, sobretudo como artista. Leonardo também exerceu a elaboração de espetáculos de artes que foram, um sucesso. Fica aí, portanto, o exemplo para todos que já buscaram emprego na vida.