Carlos Chagas
Decide-se hoje a sorte do projeto ficha-limpa, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. A dúvida é saber se o líder do governo, Romero Jucá, pedirá vistas, apresentará emenda ou simplesmente mobilizará as bancadas oficiais para ausentar-se ou votar contra. Qualquer das quatro hipóteses impedirá que a proposta venha a ser votada imediatamente pelo plenário e suba à sanção presidencial ainda a tempo de valer para as eleições de outubro. Ficaria para 2012, desmoralizada e sujeita a mudanças capazes de desfigurar ainda mais o texto apoiado por 1 milhão e 600 mil eleitores.
Senadores como Demóstenes Torres, presidente da CCJ, e Pedro Simon, insistem na aprovação imediata e mostram-se dispostos a enfrentar Romero Jucá, mas o que deve pesar mesmo na decisão da maioria é o interesse do governo. Mais propriamente, do presidente Lula. Há quem suponha que, embalado pelo sucesso de sua incursão no plano internacional, o primeiro companheiro tenha deixado instruções para os senadores do PT votarem como quiserem, na Comissão de Constituição e Justiça e depois, no plenário. Trata-se de um bom sinal, para os defensores do ficha-limpa, em especial diante da informação de que, aprovado, o Lula não vetará o projeto.
A decisão que vier a ser tomada exprimirá a sintonia ou a separação do Senado com a opinião pública. Fosse feito um plebiscito e 99% da população apoiariam a proibição de cidadãos condenados pela Justiça candidatarem-se a cargos eletivos.
A conta do florista
Entrou no folclore político o alerta feito pelo cômico Raul Solnado logo depois da revolução que restabeleceu a democracia em Portugal: “Depois da festa dos cravos, há que aguardar a conta do florista”.
O presidente Lula chega amanhã, depois do seu mais importante périplo pelo exterior em oito anos, vitorioso ao obter do Irã o compromisso de enviar para a Turquia 1.200 quilos de urânio enriquecido a baixo teor, a ser trocado por 120 quilos com enriquecimento a 20%.
Com o acordo, espera-se estar afastada a possibilidade de o Conselho de Segurança das Nações Unidas deixar de votar sanções econômicas e políticas contra o país dos aiatolás.
O problema é que as potências nucleares empenhadas em castigar o Irã continuam manifestando ceticismo e fazendo pouco caso do entendimento liderado pelo Brasil. Insistem em que aquela nação permanece trabalhando para construir sua bomba atômica e não terão abandonado a idéia da invasão armada, se suas suposições estiverem corretas.
Sendo assim, com os Estados Unidos à frente, a mídia internacional foi mobilizada para descrer ou duvidar do sucesso da iniciativa do Lula. Sem esquecer a mídia nacional, ou a maior parte dela, incluída no sistema. Logo o governo brasileiro enfrentará retaliações, mesmo em setores ao largo da questão nuclear, como o comercial e o financeiro. É a conta do florista.
Os males da inveja
Desmoralizante, mesmo, para o ex-presidente Fernando Henrique, foi a sua piadinha referente ao sucesso do presidente Lula no plano internacional. Ao ouvir que o sucessor havia marcado um gol, o sociólogo indagou se não teria sido um gol feito em impedimento.
Há quem defina a inveja como o mais letal dos pecados capitais. O ex-presidente não se conforma em ter sido superado em todos os planos, até na política externa, por um monoglota sem diploma universitário, ainda mais torneiro-mecânico.
Por essas e outras é que o candidato José Serra não quer a presença de Fernando Henrique em sua campanha. Qualquer comparação de governos ser-lhe-á desfavorável.
Conselho oportuno
Dilma Rousseff recomendou a seus auxiliares que evitem manifestações de euforia diante das mais recentes pesquisas eleitorais. Agora que ela ultrapassou José Serra, a hora é de mais empenho e mais trabalho, jamais de comemorar. Até porque, outras pesquisas virão. Eleição se ganha no dia, jamais antecipadamente, tem dito a candidata, de partida para Nova York, onde participará de homenagem ao presidente do Banco Central brasileiro, Henrique Meirelles.
Fonte: Tribuna da Imprensa