BRASÍLIA - A menos de um mês da eleição, os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs)ainda não conseguiram concluir os processos de julgamento de vereadores acusados de infidelidade partidária. Por todo o País, já foram cassados centenas de vereadores, desde que o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou ilegal a troca injustificada de legenda.
Mas ainda existem dezenas de processos e recursos sobre o assunto na Justiça, criando clima de incerteza política em várias cidades e entupindo a pauta de votações dos TREs - normalmente sobrecarregada em período eleitoral por conta da análise de registros de candidaturas e de ações judiciais movidas no calor das campanhas.
Além disso, muitos desses processos acabam passando também pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em forma de recursos. Levantamento feito pelo TSE mostra que tramitaram pela corte 551 processos sobre fidelidade partidária, dos quais apenas 78 já tiveram desfecho. Ou seja, 473 ainda estão pendentes de decisão.
Esses números se referem apenas a ações principais - recursos especiais eleitorais, recursos ordinários e agravos de instrumento. Não estão incluídos os casos de recursos contra decisões da corte, como agravos regimentais. Trata-se de uma imensidão de processos. Na semana passada, por exemplo, o TRE mineiro cassou mais 17 vereadores, elevando para 203 seu total de punições por infidelidade.
No TRE do Paraná, tradicional modelo de agilidade administrativa, passaram a ser realizadas sessões diárias para limpar a pauta de recursos relativos às eleições municipais nas 399 cidades do Estado e pelos casos de infidelidade. Até o fim de agosto, o TRE paranaense já contabilizava o julgamento de 1.805 processos, incluindo a cassação de 164 vereadores pela troca irregular de partido.
Em São Paulo, o TRE também se desdobra para tentar limpar sua pauta. Na última quinta-feira, decretou a perda dos mandatos de mais três vereadores - das cidades de Vinhedo, São Caetano do Sul e Pontal. Com isso, o número de cassados em São Paulo por infidelidade chega a 42. Um número ainda baixo, considerando-se o tamanho do Estado, o mais populoso do País.
Volta rápida
Vereadores cassados por infidelidade, contudo, não ficam inelegíveis. Assim, mesmo que percam o mandato por alguns meses, podem voltar ao cargo, eleitos novamente, pouco tempo depois, já pelos novos partidos.
É o caso, por exemplo, do vereador José Vicente do Carmo, conhecido por Zé Vicente, que teve a cassação aprovada pelo TRE de Minas, na sessão do dia 27 de agosto. Vereador na cidade de Belo Vale, ele foi eleito pelo PDT e mudou para o PMDB, caracterizando, na interpretação do TRE mineiro, a prática da infidelidade. Zé Vicente não concordou com a decisão e vai recorrer. Mas pode conseguir um novo mandato antes de recuperar o antigo. Tudo porque sua candidatura a vereador por Belo Vale já foi aceita pela Justiça Eleitoral e ele está apto a concorrer este ano.
Para complicar ainda mais o cenário, os desembargadores dos TREs julgam os casos conforme sua interpretação. Essa liberdade de análise da regra de infidelidade fez com que o TRE da Bahia decidisse que não julgaria nenhum pedido de perda de mandato por esse motivo, avaliando que se trata de uma medida inconstitucional. Dessa forma, os vereadores baianos que trocaram de legenda ficaram imunes a qualquer punição, ao contrário dos colegas dos outros estados.
A discussão sobre fidelidade partidária deve ressurgir no próximo ano dentro do Congresso. Contrariados com a rigidez da norma imposta pelo Supremo, a tendência é que os deputados dêem sinal verde à proposta que flexibiliza essa regra e estabelece um período para que os parlamentares possam trocar de legenda sem correr o risco de perder o mandato.
Na ativa
O único deputado federal cassado por infidelidade partidária, Walter Brito Neto (PRB-PB), continua na Câmara cinco meses depois da decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Mesmo não havendo mais recursos pendentes, o TSE não comunica a decisão ao presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), a quem caberia dar posse ao suplente, que é o tucano João Batista Freire Viegas.
O processo contra os infiéis, pensado pelo Judiciário para ser célere e imune a chicanas jurídicas, falhou neste e em outros casos. A resolução do TSE que trata desses processos determina que após o julgamento que decretar a perda do mandato, a Câmara deve ser informada imediatamente para que o suplente assuma em 10 dias.
O presidente do TSE, ministro Carlos Ayres Britto, mostrou-se surpreso ao saber da demora em solucionar o caso de deputado paraibano. A assessoria da Corte admitiu a demora e argumentou que, por se tratar de um procedimento novo, inaugurado em outubro de 2007, não há certeza de quando o processo deve ser remetido à Câmara para que o infiel perca o cargo.
Enquanto isso, o deputado cassado continua participando das sessões plenárias, pode protocolar projetos de lei e usa livremente o dinheiro público destinado aos parlamentares, incluindo verba indenizatória - de abril a agosto, gastou R$ 72.385 -, auxílio-moradia e verba de gabinete.
Britto afirmou que confia "totalmente" que conseguirá concluir seu mandato na Câmara (em 2010). E aproveitou para criticar a decisão do TSE, referendada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de cassar políticos que trocam de partido após as eleições. "Essa decisão do TSE não tem validade jurídica. O Judiciário não tem essa competência de legislar", disse. "Eu fui eleito, eu tenho voto e tenho a minha história."
Britto chegou à Câmara por um caminho tortuoso. Candidatou-se em 2006 pelo DEM, mas, sem votos suficientes para se eleger, ficou como primeiro suplente. Em outubro de 2007, mudou de partido, filiando-se ao PRB, e assumiu o mandato um mês depois, quando Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) renunciou para fugir do julgamento no STF por acusação de tentativa de assassinato.
Por ter mudado de partido sem justa causa, o DEM pediu ao TSE que decretasse a perda de mandado de Brito. O julgamento começou em fevereiro e foi suspenso duas vezes. A decisão, unânime, saiu em março. De lá para cá, o deputado já tentou, sem sucesso.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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