PF não precisa de um representação formal para apurar produção de dossiê dos cartões corporativos
Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - A Polícia Federal pode abrir inquérito para investigar denúncia sobre eventual crime na construção do dossiê dos cartões corporativos sem que para isso tenha que ser formalmente provocada por representação. O alerta é de juristas, advogados e juízes criminais que apontam para o artigo 5º do Código de Processo Penal, parágrafo primeiro - norma que confere à autoridade policial poderes para instaurar inquérito de ofício.
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Na sexta-feira, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, reconheceu que os dados do dossiê sobre os gastos do governo FHC saíram de dentro do Palácio do Planalto e que houve vazamento de informações sigilosas. Deixou claro que ao governo só interessa quem vazou as informações, "o que é crime". Insinuou que o vazamento só interessa aos adversários do governo e que ela foi o alvo principal: "Tem uma direção certa, a mim. Tem uma tentativa de atribuir à Casa Civil".
A ministra disse que o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI) fará uma auditoria nos computadores da Casa Civil. Contudo, este órgão é uma autarquia federal vinculada ao próprio ministério. Ou seja, o ITI responde diretamente à própria Dilma. É um órgão com perfil técnico-burocrático, não especializado em perícias como as do Instituto de Criminalística da Polícia Federal.
O Palácio do Planalto teme a entrada da Polícia Federal na investigação sobre o vazamento de informações. O receio é de que os agentes da PF transformem a apuração num espetáculo, ampliem o foco do trabalho e vazem dados sobre a montagem do dossiê que comprometam a Casa Civil. Mais: o governo avalia que a apuração pode sair do roteiro original e ferir de morte a ministra, hoje a principal candidata do PT à sucessão presidencial, em 2010.
Embora tenha definido o vazamento como "crime", a ministra disse que o governo ainda vai "avaliar" se a PF deve entrar no caso. O ministro da Justiça, Tarso Genro, por sua vez, afirmou que a corporação só será acionada a pedido de alguma autoridade - "seja a Procuradoria, a ministra da Casa Civil ou a própria CPI".
PF já pode entrar no caso
Juristas, advogados e juízes criminais explicam, contudo, que a PF pode abrir inquérito para apuração de qualquer caso assim que souber da prática de algum crime - seja lá por qual meio tomou conhecimento: denúncia anônima, flagrante ou mesmo notícia de jornal. Muitas vezes a polícia já recorreu ao Judiciário para pedir interceptação telefônica a partir de uma denúncia.
Há outras hipóteses para abertura de inquérito: quando mediante ordem judicial ou requisição do Ministério Público. Ou, ainda, a requerimento do ofendido ou de quem tiver condições legais para representá-lo.
Excluídas essas possibilidades, o delegado tem autonomia total para baixar portaria e dar início à sua função constitucional, que é a investigação.
O caminho a ser rastreado está na lei: logo que tiver conhecimento de infração penal a autoridade policial deverá dirigir-se ao local do crime, apreender objetos do crime, ouvir testemunhas, colher todas as provas (artigo 6º do CPP).
Luiz Flávio Gomes, advogado e ex-juiz criminal, disse que no caso do vazamento de dados sigilosos o enquadramento pode ocorrer pelo artigo 325 do Código Penal - revelar fato de que tem ciência em razão do cargo, pena de 6 meses a 2 anos ou multa. "Nesse caso não depende de provocação de ninguém, a polícia tem que apurar obrigatoriamente."
A polícia não depende de provocação formal, salvo nos crimes especiais que demandam representação do ofendido ou requisição do Ministério da Justiça, como no caso de crime contra a honra do presidente da República.
Se no curso do inquérito a polícia esbarrar em algum suspeito com foro privilegiado, o inquérito será submetido ao crivo do tribunal competente. No inquérito do mensalão a PF enviou os autos ao Supremo Tribunal Federal quando identificou envolvimento de deputados.
"A Polícia Federal pode abrir inquérito, de acordo com o Código de Processo Penal, mas em primeiro lugar é preciso identificar o fato criminoso", pondera Amaury Portugal, presidente do Sindicato dos Delegados da PF em São Paulo. "O fato de ter vazado o dossiê precisa ser analisado à luz do Direito. Teria a ver com uma representação do próprio ex-presidente Fernando Henrique ou do Ministério da Justiça."
Fonte: Estadao.com
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