BRASÍLIA - O ex-deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB) conseguiu, ao renunciar cinco dias antes de ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 31 de outubro, atrasar em anos o seu julgamento pela tentativa de matar o ex-governador da Paraíba Tarcísio Burity, em 1993.
Por sete votos a quatro, os ministros decidiram que, depois da renúncia e, portanto, sem foro privilegiado, Cunha Lima deve ser julgado pelo Tribunal do Júri da Paraíba. Com isso, o caso que tramita na Justiça há mais de uma década e que estava no STF desde 2002, pode demorar mais dez anos para ser concluído, pelos cálculos do ministro Joaquim Barbosa, relator da ação contra Cunha Lima.
A decisão pode ajudar o ex-deputado a se livrar desse processo, porque o crime prescreve em 2012. Como a ação será remetida para a primeira instância, os advogados de Cunha Lima podem protelar por anos a decisão com recursos e manobras para que o caso seja depois remetido para o Tribunal de Justiça, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e, novamente, para o Supremo.
A viúva de Burity, Glauce Burity, que acompanhou o julgamento, se mostrou discrente e disse acreditar que Cunha Lima não será punido pela Justiça. "Se passaram 14 anos até agora, acha que vão julgar em quatro anos? Eu não acredito", reclamou. "Ele passou 14 anos ludibriando a Justiça. Agora, quando sabia que ia ser julgado, renunciou para ser julgado pelo Tribunal do Júri. É uma palhaçada", criticou.
Votaram contra Cunha Lima, para que a ação continuasse no STF, os ministros Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Cármen Lúcia e Carlos Ayres Britto. Para esses ministros, houve abuso de direito do ex-deputado ao tentar, com a renúncia cinco dias antes da conclusão do processo, fugir do julgamento no STF.
"O ato de renúncia seria legítimo em momento processual anterior. Com esse gesto, às vésperas do julgamento, se consumou a manobra processual", observou Barbosa. "A prerrogativa de foro não pode ser exercida como privilégio, muito menos quando e como se desejar", argumentou a ministra Cármen Lúcia.
Votaram em favor de Cunha Lima os ministros Marco Aurélio Mello, Ellen Gracie, Ricardo Lewandowski, Carlos Alberto Direito, Eros Grau, Celso de Melo e Gilmar Mendes. Para eles, o STF só poderia julgá-lo se o ex-deputado voltasse à Câmara.
Mensalão
A decisão de ontem, ponderou Peluso, pode servir de exemplo para os 40 mensaleiros denunciados neste ano pelo Ministério Público (MP) e que respondem à ação penal no Supremo Tribunal. Bastaria, disse o ministro, que os réus com foro privilegiado, como os deputados João Paulo Cunha (PT-SP) e José Genoino (PT-SP), renunciassem ao mandato para atrasar em anos a conclusão do processo.
Nesse caso, os réus denunciados por crimes menores seriam os principais beneficiados e sequer seriam punidos. "Um processo de 40 réus é penoso para qualquer juiz, ainda mais para esta Corte. Depois que o tribunal tiver exaurido suas forças nesta causa em dois, três ou quatro anos, podem repetir este ato", afirmou o ministro.
Apenas para que o juiz de primeira instância conhecesse todos os detalhes da ação, continuou Peluso, demoraria anos. "Só para ler, o crime já teria prescrito", ironizou. O mesmo valeria para o mensalão mineiro. Apenas o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) tem direito a foro e, portanto, deve ser julgado pelo STF. Se ele renunciar, os outros 14 denunciados seriam beneficiados com o atraso do processo.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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