José Saraiva, advogado e mestre pela PUC-SP
Tempos de festejos pelas decisões judiciais que fixam parâmetros para a fidelidade partidária, a partir do princípio fundamental de que o mandato pertence à agremiação.
Bom para a democracia. A sociedade esperava, há muito, providência no sentido de impor o mínimo de coerência entre o eleitor e o eleito, após aquele apertar o botão da urna eletrônica. Até a mediação judicial, paradoxalmente, o voto ungia o destinatário das crenças do eleitor nos compromissos ideológicos e nas promessas de campanha, e, ao mesmo tempo, liberava os candidatos de toda e qualquer correlação com esses compromissos e promessas, após eleitos.
Todavia, o reconhecimento do partido político como esteio natural da legitimação eleitoral traz consigo urgente necessidade de reflexão e regulamentação, a respeito da garantia de democratização interna nas agremiações partidárias. Ou seja, de nada adianta manietar o eleito se, concomitantemente, não se assegurar instrumentos para coibir eventual tirania das lideranças ou órgãos partidários, antes e depois da eleição.
A revelação judicial da norma constitucional que confere aos partidos políticos o mister de figurar entre os guardiões da vontade popular deve, igualmente, transferir ao partido político o dever de estabelecer funcionamento interno democrático, controlável judicialmente, sob pena de retirar do eleitor a escolha de candidatos que se apresentem ou possam se apresentar, selecionados pela agremiação política de forma democrática.
O partido político é considerado entidade de natureza privada, a quem cabe estabelecer livremente o próprio funcionamento dos órgãos internos e de escolha dos candidatos, sendo as deliberações imunes, em regra, ao controle judicial (interna corporis). Tal realidade privatista é incompatível com a função atual dos partidos políticos, pois, ao receberem a revelação constitucional da primazia sobre mandato eletivo (vontade popular manifestada), igualmente, receberam a imposição de garantias constitucionais de funcionamento democrático interno, a fim de tornar tal funcionamento compatível com os princípios constitucionais que nortearam a novel elevação do status político e jurídico das agremiações partidárias.
Não são raras as manifestações de autoritarismo dentro dos partidos políticos, muitas vezes escondidas em mecanismos utilizados para mascarar a ausência de democratização interna. Assim, a mantença dessa realidade de autonomia interna absoluta é incompatível com as atuais atribuições das agremiações partidárias, pois eventuais desvios na democratização do funcionamento da agremiação refletirão diretamente na legitimação das possibilidades e da própria escolha do eleitor; logo, na legitimação do próprio exercício do poder.
Aliás, o TSE já mitiga a feição privatista dos partidos políticos ao fixar o controle prévio da possibilidade de desfiliação de eleito interessado em sair (consulta administrativa) por "mudança substancial ou desvio reiterado do programa partidário" ou por "grave discriminação pessoal", além da possibilidade de verificação judicial (atividade contenciosa) do comportamento interno da agremiação para efeito de afastar a perda do mandato por infidelidade partidária.
Contudo, por atuar na conseqüência - perda do mandato - embora permitida, a verificação existente da conduta democrática do partido não assegura, por si, o funcionamento democrático das agremiações, mas a atual realidade impõe essa verificação permanentemente, pois existem diversas etapas de atuação interna que podem comprometer indevidamente as possibilidades de escolha do eleitor.
Somam-se, também, as dificuldades para a fundação de partido político, como forma necessária de evitar as legendas de aluguel, mas impositivas de maior responsabilidade democrática dos partidos políticos existentes.
Portanto, fidelidade partidária sem garantia de funcionamento democrático dos partidos políticos pode significar, com o tempo, um tiro no pé das expectativas da sociedade no aprimoramento da democracia.
Fonte: JB Online
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