Publicado em 2 de dezembro de 2025 por Tribuna da Internet
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2024/G/g/IfiqcMSK6QRZykijJFDg/57620643-pa-porto-alegrers-brasil-040413-seminario-do-sistema-de-participacao-popular-e-cidada-nos-n.jpg)
Cientista político diz que“atalho cognitivo”foi aberto por Bolsonaro
Rafaela Gama
O Globo
O cientista político Leonardo Avritzer, professor da UFMG e coordenador da pesquisa “A Cara da Democracia”, afirma que foi aberto “um atalho cognitivo” pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, ao ser eleito em 2018, que passou a facilitar a autoidentificação de mais eleitores brasileiros com a direita.
Em seu novo livro, “O golpe bateu na trave” (Autêntica), que será lançado nesta terça-feira, o pesquisador analisa o impacto provocado pelo tempo de Bolsonaro na presidência e como a democracia sobreviveu em meio à tentativa de ruptura institucional após sua derrota em 2022.
O que explica o crescimento da autoidentificação ideológica no país?
Desde 2018, o que praticamente deixou de existir são pessoas que dizem “não sei” quando perguntadas sobre autoidentificação. Esse número era muito grande, e a maioria passou a se identificar com o campo da direita, como um dos grandes resultados do surgimento do bolsonarismo.
Ele criou um atalho cognitivo ao passar a dizer: “Se você é contra o aborto, contra adoção de crianças por casais gays, contra casamento de pessoas do mesmo sexo, você é de direita”. Isso aumentou o contingente de pessoas que se declaram dessa forma e que hoje têm grande representação, por exemplo, no Congresso Nacional.
Como ficam essas forças políticas após a condenação do ex-presidente?
O julgamento tira o Jair Bolsonaro da cena política. A gente já está assistindo isso neste último mês. Ele não aparece, não se expressa, e isso coloca para a direita brasileira a tarefa de se constituir num momento pós-Bolsonaro. Ainda assim, seria ingênuo achar que ele não vai ter influência na eleição. Pelo contrário, as nossas pesquisas mostram que ele é o principal eleitor no campo da direita.
E existe bolsonarismo sem Bolsonaro?
Essa é uma das grandes perguntas da conjuntura. Como eu mostro no livro, Jair Bolsonaro realizou um empreendimento bastante difícil, que a direita brasileira, ao longo dos últimos 60 anos, não conseguia fazer. A questão é: esse movimento vai continuar existindo? Certamente vai.
A dúvida é qual será o papel dele nesse movimento. A gente vê movimentações diferentes, inclusive o próprio governador do Rio, por exemplo, que reconhece sua atuação depois da megaoperação no Rio como um marco da independência em relação ao Bolsonaro. Esse parece ser também o objetivo de Tarcísio de Freitas, Romeu Zema e outras lideranças de direita.
O que esperar da disputa eleitoral do próximo ano?
No campo das forças democráticas, essa eleição vai ocorrer num ambiente político mais estabilizado. Acho que dificilmente, independentemente do resultado, teremos um momento como o de 2022, de mobilização contra o que foi decidido nas urnas. A democracia não é o governo da maioria, é o governo de todos. É importante existir forte aceitação dos resultados.