
Charge do Aroeira (Metrópoles)
Pedro do Coutto
A ascensão de Hugo Motta à Presidência da Câmara foi inicialmente recebida como a chegada de um articulador moderado, capaz de negociar com diferentes correntes e atenuar a escalada de polarização que marca o Legislativo desde antes de sua eleição.
Jovem, pragmático e com trânsito no Centrão, Motta tentou se projetar como uma figura de equilíbrio em um ambiente no qual a barganha política assume dimensão central e onde governabilidade depende, cada vez mais, de uma coreografia delicada entre interesses partidários, pressões regionais e expectativas do Executivo. No entanto, o que parecia ser uma estratégia de equilíbrio se transformou em um jogo de alto risco.
CRÍTICAS – Ao buscar uma posição equidistante entre campos ideológicos e lideranças poderosas, o deputado passou a enfrentar críticas da esquerda, que o acusa de leniência em pautas conservadoras, e da direita, que o vê como alguém incapaz de defender com firmeza agendas caras ao bloco oposicionista.
Essa sensação de isolamento político simbólico intensifica-se diante da evidente distância em relação ao seu antecessor, Arthur Lira, cuja habilidade em comandar o Centrão e influenciar votações com mão firme criou um modelo difícil de replicar.
O peso dessa comparação é inevitável em Brasília: enquanto Lira se consolidou como peça-chave de negociação durante o governo Bolsonaro e manteve protagonismo na transição para a nova gestão, Motta tenta provar que equilíbrio não é sinônimo de fraqueza, mas ainda não convenceu atores centrais do tabuleiro.
DILEMA – A crítica irônica publicada em O Globo traduz com precisão esse dilema: ao tentar não ser alvo de ataques diretos nem da esquerda nem da direita, Motta encontrou uma posição desconfortável, pois os dois espectros passaram a vê-lo como alguém sem assertividade suficiente.
Em um Congresso onde o diálogo é necessário, mas onde a ambiguidade costuma ser interpretada como ausência de liderança, o presidente da Câmara convive com uma crescente percepção de que tenta agradar a todos e, na prática, agrada a poucos.
A crise de representatividade dentro do próprio Centrão torna-se ainda mais evidente à medida que a base governista cobra avanços legislativos, a oposição denuncia supostos favorecimentos e a sociedade civil acompanha votações com crescente desconfiança sobre interesses por trás das articulações.
NEUTRALIDADE – O resultado é um cenário no qual Motta se torna protagonista não por dominar a cena, mas justamente por representar o risco de uma neutralidade que não encontra eco num país politicamente fragmentado.
O desafio que se coloca adiante é simples de formular e complexo de executar: ou o presidente da Câmara transforma sua busca por equilíbrio em liderança concreta, assumindo pautas com clareza e construindo alianças sólidas, ou continuará sendo percebido como um dirigente que tenta equilibrar-se numa corda bamba sem rede de proteção — e sem plateia disposta a aplaudir sua travessia.