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segunda-feira, novembro 11, 2024

Vitórias têm donos, mas derrotas são órfãs, jogadas na pilha de roupas sujas

Publicado em 11 de novembro de 2024 por Tribuna da Internet

Eleições nos EUA 2024: 3 fatores que explicam derrota de Kamala Harris -  BBC News Brasil

O pior foram os erros cometidos pelos institutos de pesquisas

Dora Kramer
Folha

Vitórias quase sempre têm filiação disputada, mães e pais em quantidade que lhes reivindicam a guarda. Já as derrotas costumam ser filhas de ninguém, jogadas na pilha de roupas sujas a serem bem ou mal lavadas, a depender da maior ou menor disposição dos derrotados à autocrítica.

Estamos vendo isso desde que o PT teve desempenho ruim nas eleições municipais; vemos o mesmo agora no partido Democrata americano diante da votação expressiva que leva de volta Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos.

CULPA DE QUEM? – De celebrada por encarnar esperança e renovação, Kamala Harris passou a culpada pela estagnação do discurso em tempo já ultrapassado pelas demandas do eleitorado. Lá como cá certamente há mais carne por baixo desse angu, cuja receita não voltará ao ponto mediante a mera troca de acusações.

Nesse improdutivo jogo de empurra é que se engalfinha hoje a esquerda brasileira, olhando para o resultado das urnas de 2024 como se o problema tivesse nascido com elas. O ministro da Articulação Política, Alexandre Padilha (PT),

foi quem mais se aproximou do marco temporal ao localizar em 2016 o momento em que o partido entrou para a “zona do rebaixamento”.

SE RECOLHEU… – Levou pancada de todo lado e se recolheu. Percebeu que por aí, pela via da luz do sol, o debate estava interditado. Como, aliás, esteve para alguns poucos petistas que mesmo antes da crise do impeachment de Dilma Rousseff (PT) já haviam ensaiado, sem sucesso, apontar a necessidade de correção de rumos.

Vozes foram canceladas quando ainda não se usava o termo para condenar os dissonantes dos quais, nesse caso. Não nos lembramos direito dos nomes. Alguns saíram do partido, outros cansaram e calaram.

Em 2018, em comício da campanha de Fernando Haddad (PT) à Presidência, o rapper Mano Brown deu a letra. Apontou o afastamento do partido da “multidão que precisa ser conquistada” e levou uma tremenda vaia.

NO ABISMO… – “Vamos cair no abismo”, apontou o artista ligado na realidade ante uma plateia desconectada da “multidão” e conectada ao respectivo umbigo. De certo porque aos ouvidos daquele pessoal não possuísse suficiente “letramento” político para entender a situação. O abismo estava logo ali, mas o autoengano prevaleceu e cresceu quatro anos depois com a volta de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ao Planalto.

Pois com poder central e tudo, eis que o partido teve performance abaixo da crítica na eleição e, à exceção de um ou outro terraplanista eleitoral, no geral admitiu que foi mal. Isso embora ainda esteja atordoado sem entender direito de onde veio e qual o impacto da pancada.

O PT não tem prática no exercício da autocrítica. Sempre evitou transitar na seara do reconhecimento de equívocos, baseado na premissa de que isso equivaleria a baixar a guarda e abrir passagem para os adversários.

VOLTA POR CIMA – Claro que os oponentes se aproveitam dos espaços, mas na revisão, quando bem-feita, sempre se sai mais forte para enfrentá-los. Retificar condutas não significa capitular. Ao contrário. É, no dizer do samba de Paulo Vanzolini, reconhecer a queda, não desanimar, sacudir a poeira e preparar a volta por cima.

Isso, no entanto, requer muito mais. Por exemplo, o abandono das gotas de arrogância na reação às críticas. Quem sabe não ajuda deixar de considerar burro o “pobre de direita”? Ou reformular a busca às pressas do evangélico depois de tê-lo desqualificado como refém dos vendilhões do ópio do povo?

Ineficaz também é insistir em chamar quem discorda de fascista. Encomendar de modo artificial um figurino de centro tampouco parece ser boa solução. Fecho com exemplo de olho no retrovisor de autoria do deputado Ivan Valente, ex-petista atualmente no PSOL. Irritado com ponderações sobre os erros da esquerda, pontificou: “Isso é conversa de intelectual que nunca foi para porta de fábrica entregar panfleto”.

O conceito de “porta de fábrica” não existe mais e o panfleto agora é digital.

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